Tenho uma amiga que é pura energia. A vida é mais viva nela. Sabe essas pessoas que parecem ter mais potência? A risada é mais gostosa, o abraço é mais intenso. Tem gente que tem mais vida dentro de si. Gente de verdade. Pois bem, essa é a Cris. E eis que ela se machucou e acabou ficando de cama. Ela, que não veio nessa vida para ser coadjuvante, me disse: “Foi Deus! Eu precisava parar. Estar fora de cena”.
Eu, que tinha acabado de fazer uma cirurgia dentária não podia falar. Brinquei com ela: “E eu preciso calar minha boca!”. Precisava mais do que imaginava. Comecei a observar o quanto o calar é importante para se perceber. Quanto de nós se oculta na fala desgovernada?
Fui ao trabalho e avisei, por mensagem de texto, que não falaria com ninguém. Participei de reuniões, em silêncio, ouvinte, observadora. Acho que foi a primeira vez que, de fato, enxerguei as pessoas. Calar é dar ao outro a oportunidade de se revelar. Calada e privada de tantos afazeres, acabei por passar mais tempo comigo. Estou lendo mais, escrevendo mais. Comprei flores.
Pausa. Silenciar-se é ato de coragem. Não foi o meu caso, a princípio, mas depois andei cogitando instituir o meu dia do silêncio na semana. Acho que os outros sentidos ficaram mais aguçados. Vejo coisas que eu não via há tanto tempo. Descobri que não me falta tempo; me sobram afazeres. A maioria dispensável. Tudo é questão de escolha. Eu me ouço mais e melhor. O que eu queria mais que tudo? Ter essa voz e este espaço tão meus.
Eu também precisava sair de cena, minha amiga. Depois fazemos juntas uma reestreia com nossas auto versões revistas e atualizadas.
(*) Escritora