Acordei hoje com o coração acelerado. Chegou o dia do ato preparado com tanto cuidado. Ato em homenagem aos profissionais de saúde que faleceram pela covid-19, de pedir pelas nossas vidas, de dizer à população: “Estamos aqui” e “nos ajude”. Nossas mensagens eram claras nesse sentido.
Mas os apoiadores de Bolsonaro entenderam que era contra ele. Colocaram suas faixas entre nós e nos xingaram. Muito! De canalhas, medíocres, covardes, hipócritas, palhaços, bandidos, genocidas, esquerdopatas e muitas outras coisas. Gritaram e cuspiram na nossa cara.
E nós? Deu revolta, vontade de responder. Mas eles entenderiam? Parariam? Nosso ato ali era mais importante do que discutir com essa gente. Permanecemos em silêncio, olhar para a frente, posição mantida.
Até que dois deles foram para cima da enfermeira ao meu lado. Não dava para permanecer passiva. Coloquei-me na frente dela, em silêncio. Queria deixar claro que ela não estava só.
Aí foi pancada na cabeça, empurrão, ameaça e, claro, mais cuspe. Fiquei calma, apesar de entender a gravidade do que estava acontecendo. Os colegas fizeram a proteção. Depois tivemos apoio da Polícia Militar.
Fui para casa. Precisava lavar o rosto rapidamente. Fui atingida pela saliva deles várias vezes. Aí a ficha caiu. A tristeza veio com força. Não consegui mais conter o choro.
A vida já não está sendo fácil nesse período. E acontece isso? Como pode? Num momento em que seria para estarmos unidos contra a pandemia… virou jogo de torcida.
Que loucura é essa? O mundo aplaude os profissionais da Saúde. No Brasil a gente apanha? As coisas perderam o sentido. A força para continuar esmoreceu.
Mas começaram a chegar as mensagens de apoio. Isso está me ajudando muito. Fortalecendo de novo. Então, de acelerado meu coração foi para dilacerado, mas aos poucos. As mensagens vão me ajudando. Como é bom sentir esse carinho!
Então é isso. Vamos voltar para a nossa luta. Contra a pandemia, contra o ódio, a favor das pessoas. De cabeça erguida. E tendo fé em dias melhores!
(*) Enfermeira