Caroline Romeiro (*)
Raiane Oliveira de Araújo (*)
A primeira diretriz da Organização Mundial da Saúde (OMS) sobre o uso de medicamentos para obesidade marca uma mudança importante na forma como o tema é tratado globalmente.
Mais do que validar o avanço das chamadas “canetas injetáveis”, o documento esclarece quem realmente deve receber essas terapias e reforça que a indicação não é universal, tampouco imediata.
Em um mundo em que o excesso de peso já afeta mais de 1 bilhão de pessoas, segundo o relatório World Obesity Atlas 2024, a nova orientação busca alinhar evidências científicas e responsabilidade sanitária.
A OMS destaca que os medicamentos não são indicados para pessoas que buscam perda de peso estética, tampouco para indivíduos que se encontram dentro da faixa de peso saudável.
A recomendação está voltada, prioritariamente, para adultos com obesidade grau I, II ou III, especialmente aqueles que apresentam doenças associadas, como diabetes tipo 2, hipertensão ou apneia do sono, e que não obtiveram resposta adequada apenas com mudanças no estilo de vida.
A diretriz também reforça que o uso pode ser considerado em casos de sobrepeso quando há risco cardiometabólico elevado, sempre com avaliação clínica criteriosa.
COMPLEMENTO – Entre os grupos que podem se beneficiar, a OMS cita populações historicamente negligenciadas no acesso à saúde: pessoas com menor renda, mulheres em idade reprodutiva com síndrome dos ovários policísticos, indivíduos com mobilidade reduzida e adultos que enfrentam barreiras estruturais para seguir tratamentos tradicionais.
Em cada um desses contextos, o uso de medicamentos é apontado como potencial complemento e não substituto de ações educativas, acompanhamento nutricional e mudanças comportamentais.
O documento também dedica atenção especial aos públicos que não devem utilizar essas terapias. O uso é contraindicado para gestantes, lactantes, crianças e adolescentes, salvo em casos específicos já regulamentados por autoridades locais.
A OMS lembra que, para boa parte desses grupos, ainda faltam estudos que comprovem segurança a longo prazo. Além disso, alerta que indivíduos com histórico de pancreatite, distúrbios gastrointestinais graves ou certas doenças endócrinas precisam de uma avaliação ainda mais cuidadosa.
Saiba +
A OMS reforça um ponto central: a obesidade é uma condição de saúde complexa, influenciada por fatores biológicos, ambientais e sociais, e não deve ser tratada como responsabilidade individual. Assim, medicamentos são apenas uma parte do caminho. A diretriz defende políticas públicas que ampliem o acesso a tratamentos seguros, combatam a desinformação e garantam suporte multiprofissional, especialmente em países de média renda como o Brasil, onde mais de 60% dos adultos vivem com excesso de peso. Ao estabelecer parâmetros claros sobre quem deve ou não receber terapias farmacológicas, a OMS busca reduzir desigualdades e evitar o uso inadequado dessas substâncias. A retomada do debate ajuda a recolocar a obesidade no lugar que lhe cabe: o de um desafio global que exige cuidado contínuo, ética e equidade.