Como dissemos no artigo anterior, nas eleições de 2022 o povo brasileiro elegeu o presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT), mas, por falta de consciência política e da dinâmica da democracia, elegeu também um parlamento majoritariamente de oposição ao governo.
O Centrão, composto por parlamentares vinculados a partidos fisiológicos, hoje comandados pelo presidente da Câmara dos Deputados Arthur Lira (PP/AL), que se movem tão somente por interesses pessoais ou dos grupos econômicos que representam, saiu fortalecido na eleição.
Neste contexto, para garantir a governabilidade Lula está tendo que negociar com o Centrão, que se articula para dominar o que mais os interessa: o orçamento público. E para a indicar apadrinhados para cargos na estrutura do Executivo. Em síntese: o toma-lá-dá-cá vai continuar e Lula corre sério risco de se tornar refém do Centrão, como ocorreu com o seu antecessor.
No final do ano passado, o STF prestou um grande benefício ao País, ao considerar inconstitucional as emendas de relator-geral do Projeto de Lei Orçamentária Anual, indicadas pela sigla RP-9, escândalo sem precedentes denominado pela mídia de “orçamento secreto”, com previsão de R$ 19,4 bilhões na LOA 2023.
Ainda que este fato indicasse a diminuição do poder do Centrão sobre o orçamento, em especial de Arthur Lira e seus cúmplices, todos sabíamos que eles iriam articular meios para tornar inócua a decisão do Supremo.
Com efeito, logo após a decisão do STF, o Congresso e o governo redistribuíram os R$ 19,4 bilhões alocados no orçamento secreto, destinando R$ 9,55 bi para serem acrescidos às emendas individuais. Os restantes R$ 9,85 bi foram devolvidos aos orçamentos dos ministérios e destinados a investimentos, alterando-se a identificação de RP-9 para RP-2.
Com isso, o montante destinado a emendas individuais passou de R$ 11,7 bilhões para R$ 21,2 bi. Na LOA, cada deputado ficou com a prerrogativa de emendar cerca de R$ 32 milhões e cada senador R$ 59 milhões. Isso é um escândalo para um país com tanta pobreza e desigualdades sociais e econômicas.
Esses valores vão ser transferidos para os prefeitos dos redutos eleitorais dos parlamentares e pulverizados em obras e serviços selecionados por critérios políticos e, mediante licitações fraudulentas, parte deles vão para os bolsos dos próprios parlamentares beneficiados.
Conforme noticiado pelo Estadão, o governo, já prevendo dificuldades para aprovação das reformas que pretende fazer, especialmente a tributária, e o presidente da Câmara estão em negociação avançada para conceder uma espécie de emenda individual extra para cada um dos 259 deputados novatos, que não têm direito a emendas no primeiro ano do mandato.
Para isto seriam destinados R$ 3 bilhões daqueles R$ 9,85 bilhões do orçamento secreto transferidos para os ministérios. Cada deputado novato poderia indicar cerca de R$ 13 milhões para os prefeitos dos seus redutos.
Repete-se o esquema usado pelo governo anterior, em conjunto com a Câmara, para aprovação da reforma da previdência, quando os parlamentares novatos foram agraciados com R$ 40 milhões, a serem disponibilizados em quatro parcelas anuais de R$ 10 milhões, sendo a primeira já no primeiro ano do mandato.
Portanto, o toma-lá-dá-cá vai continuar correndo solto Brasil adentro, o que comprova o que temos defendido: somente um povo social e politicamente consciente, mobilizado e organizado, poderá diminuir o poder do Centrão, por meio da eleição de parlamentares comprometidos com os reais interesses do País.