Anna Ribeiro (*)
Serão seis dias, cinco noites e uma vida inteira a ser remontada. O que levar na mala – e o mais importante: o que deixar para trás? Foi a primeira vez que fiz a mala assim. Pensando no que eu deixaria. O que era desnecessário, pesado, obsoleto, passado. As mágoas, as expectativas frustradas, as projeções de felicidade. Tudo isso pode ficar para trás.
Não há mala, avião, nave espacial que comporte algo tão pesado. É preciso deixar. Descarregar o peso morto. Morto, passado, sem vida, já vivido, ultrapassado. Deixo ir. Na bagagem só o que for leve, só o que me leve adiante. Leve.
Serão seis dias, cinco noites e uma vida inteira a ser remontada. No itinerário está implícito resgatar afagos e afetos. Pés descalços, cara limpa, cabelos soltos. Leve! É tempo de ser e sentir de verdade. É tempo de perdão, o único possível, o autoperdão, e tantas outras coisas que só mesmo uma viagem pode fazer.
Uma vida inteira a ser revivida em seis dias, cinco noites, incontáveis risos, abraços e acolhimento das diferenças. Parece pouco, mas não é. No itinerário está implícito revisitar a infância, com direito a doces e sorrisos, comida afetiva, café com açúcar e cicatrização de feridas.
Revisito a adolescência, testo os limites. Agora, de um jeito novo, limite entre uma onda e outra. É tempo de resgatar afagos e afetos. Perdão e tantas outras coisas que só mesmo uma viagem interna é capaz de fazer. Uma vida inteira a ser revivida em seis dias, cinco noites.
O tempo, implacável como sempre, agora me parece amigável, justo e até bondoso. Serão seis dias, cinco noites que se repetirão incontáveis vezes dentro de mim.
(*) Escritora