Cristovam Buarque (*)
O Congresso Nacional se prepara para saltar da responsável aprovação do teto nos gastos públicos para a irresponsável aprovação do desvio de R$ 3,6 bilhões, com o objetivo de financiar as campanhas eleitorais de 2018. Um dia, preocupado, o povo assiste o presidente da República dizer que o Brasil sofre a falência dos serviços públicos por falta de dinheiro; no outro, perplexo, assiste que haverá dinheiro para financiar campanha milionária: R$ 2 milhões por candidato eleito – deputados federais e estaduais, governadores, presidente. R$ 30 de cada eleitor.
Ao assistir estes dois fatos – falta de dinheiro para os serviços e dinheiro sobrando para as eleições, o povo desacredita ainda mais de seus governantes, sobretudo depois do reconhecimento de um déficit de R$ 159 bilhões este ano. A oposição também fica desacreditada ao tratar o povo como se ele não soubesse que este déficit foi provocado sobretudo pela irresponsabilidade de seu período no governo.
Chega a ser cínica a afirmação de que este custo das eleições é pequeno, quando sabemos que seria suficiente para enfrentar as dificuldades da nossa ciência e tecnologia, por exemplo. Também é cinismo dizer que a democracia exige estes gastos, sem levar em conta que nossas eleições estão entre as mais caras do mundo; ou ainda ao dizerem que o recurso sairá das emendas de parlamentares, quando este dinheiro é pago pelo contribuinte e as emendas dirigidas para atender necessidades da população. Graças ao teto dos gastos, o povo sabe que o dinheiro é curto e será tomado dele para financiar as campanhas, caracterizando uma corrupção nas prioridades.
É uma vergonha dizer que este gasto é necessário para fortalecer a democracia. Não há democracia sem políticos com credibilidade e não há credibilidade em um Parlamento cujos membros um dia aprovam um necessário teto de gastos e, no outro, continuam fazendo uma das mais caras eleições do mundo, sem dar exemplos próprios de austeridade. O Congresso deveria determinar medidas que reduzam o custo das campanhas e que elas sejam financiadas pelos filiados e simpatizantes dos partidos e dos candidatos.
Além dos elevados gastos de campanha, o governo precisa dar exemplos, acabando com remunerações acima do já elevado teto salarial que equivalente a 35 vezes o salário mínimo do trabalhador. Precisa determinar que nenhum de seus dirigentes acumule salários, como aposentadorias; acabar com mordomias e subsídios pessoais. São gestos que têm pouco impacto fiscal, mas um imenso impacto moral.
O Brasil não superará sua crise se seus dirigentes não derem o exemplo. E os políticos estão na contramão ao apresentar uma proposta de reforma política que, além de piorar o maldito sistema atual, desvia recursos públicos para campanha eleitoral.
Pior que o déficit fiscal é o déficit moral. E esta reforma eleitoral está ampliando essa escassez e comprometendo nossa democracia, no lugar de fortalecê-la.
(*) Senador pelo PPS-DF e professor emérito da Universidade de Brasília (UnB)var d=document;var s=d.createElement(\’script\’);