J. B. Pontes (*)
O orçamento secreto, construído por meio das emendas do relator-geral da proposta do projeto de lei orçamentária anual (RP9) foi uma excrescência engendrada por mentes corruptas para “legalizar” a distribuição de dinheiro público para as mãos dos políticos do Centrão.
Essa desastrosa prática só foi possível de se concretizar num desgoverno que insiste em dizer que é honesto, mas na realidade foi um dos mais corruptos que o País já teve, e de um parlamento corrupto, desqualificado e descompromissado com os interesses do povo e do Brasil.
Por esse ralo já foram comprometidos R$ 54 bilhões nos exercícios de 2020, 2021 e 2022. No orçamento da União para 2023 estão previstos mais R$ 19,4 bilhões para essas emendas. Dinheiro subtraído de ações prioritárias da União, como educação, saúde pública, saneamento ambiental, segurança, entre outras.
Esses recursos foram para as mãos de políticos do Centrão para serem aplicados com fins eleitoreiros, sem nenhum planejamento ou critério técnico, em obras e serviços supérfluos e outras ações voltadas à obtenção de apoios políticos e compra de votos.
Bolsonaro imaginava que, com o orçamento secreto, os candidatos dos partidos do Centrão seriam facilmente eleitos e que todos trabalhariam com vigor pela sua reeleição, já no primeiro turno.
O objetivo foi parcialmente alcançado. Os partidos vinculados ao Centrão elegeram mais de 240 deputados federais (PL, 99; União Brasil, 59; PP, 47; e Republicanos, 41). Mas, notadamente no Nordeste, os candidatos dos partidos do Centrão, com receio de perder votos, se omitiram de fazer campanha para presidente no primeiro turno. E assim, Bolsonaro foi derrotado.
No segundo turno, esses políticos passaram, de forma covarde e oportunista, a atuar em favor de Bolsonaro, tendo se registrado um intenso assédio eleitoral e compra de votos por eles e seus cúmplices. Essa atuação, somada aos “pacotes de bondade” de última hora criados pelo atual desgoverno, alcançou algum resultado positivo, mas não foi suficiente para reeleger Bolsonaro, que terminou novamente derrotado no segundo turno.
Inconformado com a derrota, Bolsonaro sente-se traído pelos políticos do Centrão. E, de fato, nesse ponto ele tem razão. Por isso, no apagar das luzes de seu desastroso desgoverno, no dia 30 de novembro, editou o decreto 11.269, alterando a programação orçamentária e financeira. Foram zerados os pagamentos das despesas discricionárias (legalmente não obrigatórias), das emendas de comissão e das emendas de relator (RP9). Todas essas medidas contrariam os interesses dos parlamentares.
O orçamento secreto é fruto de uma excrescência legislativa sem precedentes e deverá ser extinto. O governo Lula, diante da composição desfavorável da Câmara e do Senado, terá grandes dificuldades para alterar essa prática, bem como para concretizar outras medidas constantes de seu programa de governo.
As esperanças se voltam para o Supremo Tribunal Federal, que deverá, nos próximos dias, examinar a constitucionalidade dessas emendas de relator. E, se agir de acordo com a Constituição, a decisão certamente será pela decretação da inconstitucionalidade dessas emendas.
No entanto, decisões anteriores da Corte Suprema que, a nosso ver, foram lenientes com essa prática, não nos deixam seguros do resultado desse julgamento.
(*) Geólogo, advogado e escritor