É sabido que uma nova onda de consequências da pandemia do novo coronavírus virá no campo econômico. Isso é fato. Mas não se pode contrapor a salvação da economia à proteção da saúde e da renda dos cidadãos, como diversas propostas que partem do Executivo e do Legislativo o fazem.
Exemplos de propostas dessa natureza são a redução de salários de servidores públicos rejeitada pela Câmara dos Deputados na Proposta de Emenda à Constituição (PEC) 10/2020; a permissão para redução de salários e de jornada de trabalho em até 70% prevista na Medida Provisória (MP) 936, que tramita no Senado Federal; e a Proposta de Lei Complementar (PLP) 83/2020, do deputado Vitor Lippi (PSDB-SP), que prevê cortes de 10% a 20% nos salários dos servidores.
Às grandes empresas e ao mercado financeiro nem se cogitou sobretaxação para ajudar no esforço contra a pandemia. Ao contrário, foram ajustados aportes de recursos e incentivos de naturezas diversas.
Mas o que vai acontecer depois? O mercado não vai se equilibrar caso o trabalhador seja privado da capacidade de consumo. Não são poucos os economistas ao redor do mundo que têm apontado que medidas de austeridade, como os cortes salariais, aumento do desemprego e supressão de garantias sociais, podem agravar a crise e aprofundar uma depressão já prevista.
Um dos estudos conduzidos na área compara os efeitos na economia da atual pandemia aos da Gripe Espanhola, que assolou o mundo há 100 anos. Elaborado por integrantes das equipes do Federal Reserve Board (o sistema de bancos federais dos EUA), do Federal Reserve Bank of New York e do Instituto de Tecnologia de Massachusetts (MIT), o estudo Pandemias provocam depressão econômica, intervenções de saúde pública não (tradução livre) mostra, entre outros aspectos, que as medidas de contenção social adotadas mais cedo permitiram uma recuperação econômica mais rápida.
Nessa esteira da avaliação da proteção das pessoas e da renda das famílias como forma de garantir uma recuperação mais rápida da economia, o Correio Braziliense publicou matéria na qual a economista Monica Bolle, do Peterson Istitute for International Economics, de Washington, afirma que se a MP 936 passar, o desemprego vai aumentar, os preços vão cair e o Brasil entrará em uma depressão maior do que a prevista.
Em suma, o fato é que o mercado não vai se salvar com o sacrifício do trabalhador e nem vai se recuperar com a queda do poder de consumo das famílias. É necessário socorrer as empresas, mas é fundamental o gasto do Estado com o trabalhador, tanto do setor público quanto do privado, não só mantendo, mas aumentando sua renda, para que esse dinheiro faça fluir a economia.