O projeto habitacional Alto Mangueiral, localizado próximo a São Sebastião, foi parar nas barras dos tribunais. A vara do Meio Ambiente, Desenvolvimento Urbano e Fundiário do Distrito Federal analisa uma ação civil pública, impetrada pela deputada distrital Julia Lucy (Novo), que pede a interrupção do projeto sob responsabilidade da Companhia de Desenvolvimento Habitacional do Distrito Federal (Codhab/DF). O principal questionamento em relação ao novo bairro é a sua proximidade com o Complexo da Papuda e da Penitenciária Federal do DF, onde estão presos Marcos Camacho, mais conhecido como Marcola, e outros líderes de uma das principais organizações do crime organizado brasileiro, o Primeiro Comando da Capital – PCC.
Entretanto, apesar da Codhab já ter lançado edital de cadastramento de potenciais moradores, o projeto ainda não foi aprovado, segundo informam técnicos das secretarias de Meio-Ambiente e de Desenvolvimento Urbano e Habitação, ao crivo dos Conselhos de Política Ambiental do Distrito Federal – Conam e ao de Planejamento Territorial e Urbano do Distrito Federal – Conplan.
A área de aproximadamente 400 hectares, onde segundo a parlamentar o GDF pretende edificar prédios de até seis andares, foi anteriormente destinada a criação do Parque Ecológico do Mangueiral. Ela fica exatamente entre o atual bairro e o complexo prisional. Projeto-de-lei, nesse sentido, de autoria do deputado João Cardoso (Avante) – que profissionalmente é auditor fiscal do Instituto Brasília Ambiental (Ibram) -, chegou a ser aprovado pela Câmara Distrital do DF, mas em maio passado foi vetado pelo governador Ibaneis Rocha (MDB).
Jardim Mangueiral
Iniciado no governo de José Roberto Arruda, por meio de uma Parceria Público Privada – PPP, com um consórcio liderado pela construtora Odebrecht, o Jardim Mangueiral deslanchou mesmo foi no governo de Agnelo Queiroz, quando a maioria das suas oito mil residências foi entregues.
Ele se vale de uma área da antiga estatal Pró-Flora, extinta no governo de Cristovam Buarque, que usou a área para reflorestamento com mangueiras, cujas frutas eram exportadas para a Europa. Do grande bosque de mangueiras, surgiu a denominação do bairro. Estima-se hoje uma população de cerca de 30 mil moradores, em área de aproximadamente 200 hectares. São pequenos prédios de quatro andares, sem piloti, e casas unifamiliares de dois andares.
Ação civil
Pelas informações contidas na ação civil, as novas edificações na expansão do bairro, denominada Alto Mangueiral, passariam a ser de seis andares e, considerando a área, 400 hectares, pode se supor que o novo bairro comportaria moradias para 90 mil pessoas. População superior a do Sudoeste ou mesmo de toda a Asa Sul, por exemplo. Essa alta densidade demográfica preocupa técnicos da secretaria de Meio-Ambiente – Sema, pois a área foi classificada pela Lei de Zoneamento Ecológico e Econômico – ZEE na categoria “zona sensível”. Sua ocupação poderia trazer riscos ecológicos, notadamente na recarga de aquíferos e risco alto de contaminação do subsolo, sem mencionar o impacto da retirada da vegetação natural de cerrado na fauna e na flora locais. “Um projeto dessa magnitude demandaria uma rede de esgotamento sanitário por parte da Caesb, o uso de fossas não atenderia às necessidades, já que a densidade populacional não será baixa” – explica um técnico do GDF que preferiu não se identificar.
Apesar de ainda não ter cumprido todas as exigências legais para a sua existência, os imóveis já estão sendo ofertado por cooperativas e entidades corporativas. No portal do Sindicato dos Policiais Civis do DF – Sinpol, em 15 de junho de 2021, os imóveis do Alto Mangueiral são ofertados em três modalidades:
- Apartamentos de dois dormitórios com suíte, área de 56m², vaga de garagem em prédio de seis andares com elevador. Valor: R$ 240 mil;
- Apartamentos de três dormitórios com suíte, 68m², vaga de garagem em prédio de seis andares com elevador. Valor: R$ 260 mil; e
- Casas de três dormitórios, não germinadas em lotes de 128m². Valor: R$ 280 mil.
O padrão de seis andares assusta as autoridades penitenciárias federais e do DF. “Outro ponto importante é a distância entre o Bairro e o Presídio Federal, a qual compreende aproximadamente 1km, o que segundo especialistas, é um risco a segurança tanto dos moradores, quanto para os servidores que trabalham no complexo penitenciário, e ainda a todos custodiados. […] Em 16 de abril deste ano, um despacho da secretaria de Administração Penitenciária do Distrito Federal apontou fragilidades do projeto “Expansão do Mangueiral” com um possível impacto ao Sistema Penitenciário do Distrito Federal (SPDF)” – afirma a parlamentar na petição. E complementa, ao salientar que, por meio do ofício nº 161/2021 do Ministério da Justiça e Segurança Pública, o Departamento Penitenciário Nacional e a Diretoria do Sistema Penitenciário Federal se manifestam contrariamente ao projeto de expansão habitacional.