Proibida pelo Supremo, a farra da contratação de parentes continua a todo vapor na Câmara. São pelo menos 10 casos.
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Nem todos os parlamentares veem problemas em nomear parentes. O deputado Aníbal Gomes (PMDB-CE), por exemplo disse estar “de consciência tranquila”, mesmo mantendo dois primos no próprio gabinete. Leandro Ferreira Gomes e Mara Ribeiro Ferreira Gomes, segundo o deputado, ajudam com o trabalho político no estado. “Eles são meus primos, mas fazem o trabalho deles corretamente, me ajudam a manter contato com o eleitor nos municípios”, declarou Aníbal Gomes.
“O dinheirinho que a gente ganha é para isso, para pôr o povo para trabalhar”, justificou o deputado, que é também investigado na Operação Lava-Jato, da PF. Em abril, a Câmara tinha pelo menos 10 pessoas com o tradicional sobrenome cearense “Ferreira Gomes” em cargos comissionados, inclusive em gabinetes de aliados dos irmãos Cid e Ciro Gomes, de quem Aníbal é primo.
O deputado Pompeo de Mattos (PDT-RS), por sua vez, resolveu lotar o sobrinho justamente no órgão que analisaria uma eventual quebra de decoro por nepotismo. Em 16 de abril, o Diário Oficial publicou a nomeação de Lucas Eduardo Pompeo de Mattos para o Conselho de Ética e Decoro Parlamentar, com salário líquido de R$ 7,7 mil. Lucas, segundo o chefe de gabinete do trabalhista gaúcho, já trabalhava “há muito tempo” na Câmara. É verdade: Pompeo de Mattos já empregou Lucas e também o próprio filho, Tales Knechtel, em seu gabinete, antes da Súmula 13. “Nós fizemos uma consulta à Mesa para saber se haveria problema em ele continuar, depois da eleição do deputado, e não havia”, disse o chefe de gabinete. A tal consulta, porém, não foi enviada à reportagem.
No total, a reportagem encontrou 106 correspondências de nomes entre parlamentares e detentores de cargos comissionados na Câmara, tomando por base o mês de março. Em muitos desses casos, a única forma de checagem é perguntar aos próprios parlamentares. Assim, o líder ruralista Luiz Carlos Heinze (PP-RS) negou conhecer a assessora Doloria Heinze, do gabinete de Sérgio Moraes (PTB-RS); Rogério Simonetti Marinho (PSDB-RN) não conhece Luciana Dantas Simonetti (assessora de Walter Alves, PMDB-RN) e Nilton Balbino (PTB-RO), mais conhecido como Nilton Capixaba, disse não ter nenhuma relação com Thays Balbino Rosa, assessora de Marcos Rogério (PDT-RO).
Mas nem toda negativa é dada de boa-fé. No primeiro contato com a reportagem, a deputada Iracema Portella (PP-PI), casada com o presidente do PP, senador Ciro Nogueira Lima (PI), negou ter parentesco com Ryan Nogueira Lima, empregado do gabinete dela até 4 de março deste ano. “Não é meu parente não… no Piauí tem muito Nogueira, o que não significa que sejam parentes”, disse Iracema ao Correio, por telefone. Confrontada com a informação de que Ryan é, na realidade, primo de Ciro Nogueira, a equipe de Iracema mudou de tom. “Como é primo, a súmula (do STF) não proíbe. Ele fez um ‘serviço técnico’ no estado, e já foi até exonerado”, disse a assessoria de imprensa.
A indicação cruzada de familiares também pode ser uma forma “esconder” as nomeações de parentes. Ronaldo Benedet (PMDB-SC) mantém em sua equipe, desde 2011, a assessora Marilu Maldaner. Já Celso Maldaner, também do PMDB de Santa Catarina, conta com a ajuda de Raquely Benedet Cella desde 2008. Ao Correio, Raquely disse ser responsável pelo gabinete de Celso em Chapecó (SC). A justificativa dada para a contratação: o parentesco com os deputados é distante. Segundo a assessoria de Benedet, Marilu seria “prima distante” do senador Casildo Maldaner (PMDB-SC). Raquely também disse que sua indicação não foi feita por Ronaldo Benedet. “O meu pai era primo dele (Ronaldo), mas não sei dizer em qual grau. A gente tem conhecimento, mas não foi ele quem indicou”, disse ela.
Mas, então, quantos são afinal os parentes de parlamentares trabalhando na Câmara? “Em tese, nenhum”, responde um servidor lotado no órgão responsável pela nomeação dos comissionados. “Todos eles têm de assinar um termo declarando não serem parentes dos parlamentares. Sem isso, não tomam posse”, disse o servidor. “Quando a gente vê algum nome parecido, a gente até liga no gabinete, procura informar o parlamentar. Mas esse documento (a declaração) é dotado de fé pública”, conta o servidor.