Não sei porque ando triste. As palavras fogem e o vazio é incapaz de expressar essa realidade na qual estamos metidos. Agarro-me à poesia, inspiração que vem das alturas, metaforicamente hábil em exprimir o sentimento mais profundo.
Tento enxergar a face de Deus, aquela benevolente e acolhedora. Preciso da força da música, da arte; da criação que transforma nosso íntimo fraturado em beleza, porque é preciso dar algum significado maior à vida.
Não sei porque ando triste, a chorar por dentro. Por fora, falta-me a lágrima, pois os olhos estão secos. Não cai um pingo d’água há cem dias. Por aqui, a umidade atinge picos de 20 a 8 por cento, a imitar a secura das almas dos homens.
A fumaça dos incêndios nubla os céus e os passarinhos de meu quintal estão agitados como se reivindicassem, desde já, os lugares deles por direito: os galhos, as folhas das árvores novamente verdes e flores suculentas.
Não sei porque ando triste. Há tanta brutalidade e morte por aí. Não é só o assassinato físico e frio de centenas de pessoas, de 13 mulheres abatidas por dia, como bichos.
O amor acabou? Não é só a agressão à natureza, aos animais, aos índios, aos pobres. Cadê a fraternidade? Não é só o fim da linha para estudantes e pesquisadores que perdem bolsas de estudos. O bom-senso sumiu?
Não é só a onda miliciana e justiceira que invade o país. Não é só e somente a barbárie que recrudesce o mundo. Não é só a mentira que vira verdade. É a cultura que desaba?
Não sei porque ando triste. Existe, sim, uma nova ética, que não é ética, agora tendência, um sopro escuro que vem das profundezas e entranha no ar que respiramos, sufocante!
E outra lógica, que não é lógica, pois sorri diante da tortura de seres. O respeito perdeu-se?
A corrupção também já não é mais corrupção. O que seria? São muitos os acontecimentos impostos, amigos, que não consigo escolher quais deles me deixa mais triste, embora eu não queira nunca perder o sorriso.