Organizações da sociedade civil entregam nesta terça-feira ao Congresso Nacional 2,029 milhões de assinaturas de apoio ao pacote de medidas anticorrupção idealizado pelo Ministério Público Federal, na esteira da Operação Lava-Jato. As chamadas “10 medidas”, criadas pela Procuradoria-Geral da República (PGR), contêm 20 propostas legislativas divididas em dez temas, e foram enviadas ao Congresso em maio do ano passado. A maioria têm origem na Convenção das Nações Unidas contra a Corrupção, assinada em Mérida, no México, em 2003, e ratificada pelo Brasil. No entanto, elas ganharam força com o impacto da Lava-Jato, cuja força-tarefa no Paraná rabiscou as primeiras ideias ainda em 2014.
A partir das 14h, numa cerimônia pública na PGR, em Brasília, o Ministério Público vai fazer a “devolução simbólica” das fichas de apoio às propostas à sociedade brasileira. De lá, ativistas de combate à corrupção, movimentos sociais e até celebridades devem fazer uma caminhada ao Congresso, quando os documentos serão entregues à Frente Parlamentar de Combate à Corrupção.
De acordo com o coordenador da Câmara de Combate à Corrupção do Ministério Público Federal, o subprocurador Nicolao Dino, a ação é importante, e os protagonistas devem ser os integrantes da comunidade. Os 20 projetos estão no Congresso e foram abertos na Câmara e no Senado, por iniciativa de parlamentares que receberam os anteprojetos da Procuradoria no ano passado. “É uma manifestação da expectativa da sociedade em relação à melhoria e ao aperfeiçoamento do sistema, da legislação anticorrupção”, ressaltou Dino ao Correio.
O foro privilegiado — que faz presidentes, parlamentares e ministros só serem julgados no Supremo Tribunal Federal, por exemplo — não está entre as 10 medidas, e o MPF não se pronuncia oficialmente sobre ele. No entanto, Dino e outro líder do grupo, o procurador Deltan Dallagnol, defendem a redução no número de autoridades beneficiadas pelo privilégio.
Segundo a assessoria do movimento “Mude – Chega de Corrupção”, que foi criado para apoiar as 10 medidas e amplificar a coleta de assinaturas, o evento na PGR e a caminhada até o Congresso devem incluir esportistas e artistas, como o lutador de MMA Rodrigo Minotauro, a atleta Maurren Maggi, o ator Thiago Lacerda e o comediante e apresentador de TV Danilo Gentile. “Em um momento tão tenso e delicado no cenário político brasileiro, a população clama pelo fim da corrupção, por ações mais cristalinas e por políticos que coloquem os interesses do povo acima dos próprios, e não o contrário, como vemos acontecer cotidianamente no país”, afirma nota do Mude. Segundo o movimento, engrossam o coro de entidades organizações a exemplo de associações comerciais e de indústrias, igrejas, escoteiros, Sesc, Senac e Associação Mulheres da Inconfidência.
A Frente Parlamentar de Combate à Corrupção vai receber os documentos no Auditório Nereu Ramos, na Câmara, às 16h. A assessoria do presidente da frente, deputado Mendes Thame (PV-SP), disse que os projetos e assinaturas vão ser protocolados na Presidência da Câmara ou na Secretaria-Geral da Mesa da Casa ainda hoje.
Três perguntas para Nicolao Dino, coordenador da Câmara de Combate à Corrupção da PGR Se as medidas já estão no Congresso, por que é importante entregar as assinaturas?
É uma manifestação da expectativa da sociedade em relação à melhoria e ao aperfeiçoamento do sistema, da legislação anticorrupção. Eu não diria como pressão, mas como expectativa, como esperança. Falarmos em expectativa social tem um sinal positivo muito forte, inclusive de confiança nas instituições brasileiras.
Por que o foro privilegiado não está entre as 10 medidas?
Já há projetos de emenda à Constituição tramitando sobre esse tema. Quem fala pelo Ministério Público não sou eu; pela instituição, fala o procurador-geral. O foro considera que há autoridades que vão receber um tratamento diferenciado. Teria que ser reduzido de forma bem sensível. Não faz sentido um prefeito ser detentor de foro privilegiado, um secretário de estado. Isso revela a necessidade de uma revisão urgente do foro. A pauta do Supremo Tribunal Federal hoje é preponderantemente penal. Isso também evidencia uma disfuncionalidade na atuação do STF. Em vez de focar na sua função precípua, acaba por atuar como um tribunal penal.
Por que é importante mudar a prescrição criminal?
A prescrição retroativa é equivalente à jabuticaba. Ela potencializa a impunidade, porque os processos de maior complexidade tendem a demorar mais. Quando demoram mais, ao final com sentença, quantidade de pena, pela lei brasileira, aquela pena é projetada para o passado. E se conta para o trás o prazo de prescrição. Isso é injusto para com a sociedade. Isso só existe no Brasil e precisa ser urgentemente modificado.