Um livreto publicado pela Prefeitura de Moscou para os trabalhadores migrantes tinha por objetivo aumentar a compreensão entre esse grupo e os moscovitas, mas a medida provocou polêmica e inúmeras críticas nas redes sociais.“Ele contém regras de conduta e leis que devem ser conhecidas e seguidas!”, diz uma menina vestindo um adorno tradicional russo e de trança grossa. No material destinado aos migrantes que chegam à capital russa, Vassilisa Premudraia, heroína de antigos contos populares do país, é um dos personagens do livro de 100 páginas com subtítulo “Sobre as regras de conduta de migrantes em Moscou”.
O livro instrutivo vem na forma de quadrinhos. Nele, personagens de conto de fadas falam com heróis abstratos simbolizando os migrantes.
“Os cidadãos estrangeiros vêm a Moscou, e acreditamos que eles também são heróis fantásticos e são recepcionados por heróis fantásticos da Rússia”, explica Aleksandr Kalinin, diretor da ONG responsável pelo material.
No livreto, os heróis dos contos de fadas trabalham em estreita colaboração com os migrantes. Eles explicam que não se pode falar alto nas ruas de Moscou, testam o conhecimento da língua russa, explicam regras para preencher documentos e mostram-lhes locais famosos.
Há também um vilão chamado Koschei, o Imortal, um velho horrível de rosto cinza que tenta persuadir os recém-chegados a trabalharem na região metropolitana de Moscou, embora sua permissão lhes permita trabalhar apenas na capital. Os migrantes não devem fazer isso, adverte o material.
“Inadequado e caro”
Apesar do objetivo declarado, a iniciativa causou uma onda de comentários negativos nas rede sociais. A principal crítica é o fato de Moscou ser apresentada como um reino de russos étnicos, onde migrantes não russos chegam para trabalhar.
“O que o gabinete do prefeito está tentando obter – estimular o nacionalismo?”, escreveu Serguei Tsvetkov em sua página no Facebook, acrescentando que entre os migrantes há também muitos russos étnicos de ex-repúblicas soviéticas.
“Fica claro que a resistência dos heróis russos às hordas invasoras está sendo reavivada”, criticou Evgueni Varshaver, diretor do Centro de Estudos sobre Migração e Etnicidade, durante uma entrevista à transmissão russa da rede BBC.
Para Varshaver, o conteúdo da obra é bastante ambígua. “Por exemplo, diz que não se pode comer nas ruas em Moscou. Para mim, isso é notícia nova, e eu sou de uma terceira geração de moscovitas”, disse. O preço, de quase US$ 123 mil, também foi alvo de críticas na internet.
Apesar das observações, Varshaver acredita que “qualquer livreto é melhor do que nenhum”. A mesma opinião é compartilhada por Viatcheslav Postavnin, presidente da Fundação Migração: Século 21.
“Os migrantes estão chegando a uma sociedade completamente nova – com regras diferentes, uma cultura diferente e até éticas diferentes”, diz Postavnin. “Normalmente, seu ponto de referência são os seus compatriotas, sua diáspora, que é fechada e basicamente reproduz as regras de conduta utilizadas em seus países. Essa brochura pode ajudar os migrantes a se adaptarem à realidade russa”, acrescenta.
Postavnin acredita que as falhas apontadas são resultado do desejo imprudente dos autores de ter o trabalho apreciado não só por migrantes, mas também pela sociedade e autoridades russas. “Por isso, vemos policiais retratados como cavaleiros”, diz.
“Nossa sociedade é bastante condescendente com os migrantes. E isso foi refletido no livreto”, conclui Postavnin.
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