J. B. Pontes (*)
As empresas multinacionais, em conluio com brasileiros entreguistas, aproveitam-se da presença de um gestor de plantão que odeia os indígenas e de um Congresso Nacional comprometido com os interesses do grande capital, para aumentarem a pressão pela liberação da mineração nas terras dos povos originários.
Com a guerra Rússia-Ucrânia, todos estão mais eufóricos, pois encontraram a desculpa que precisavam para avançar sobre os territórios dos indígenas, onde os empresários exploradores e o governo esperam obter grandes lucros, pouco importando os prejuízos que causarão a esses povos.
Para que querem liberar a mineração? A resposta é simples: para o mesmo que fizeram e fazem com os minérios da Amazônia e do Brasil, ou seja, levá-los in natura para os seus países de origem, para lá manterem as indústrias, gerar renda e empregos.
Quais os benefícios que isso trará para os indígenas? Analisemos um caso concreto: a Mina do Pitinga, no Amazonas, uma extraordinária reserva de cassiterita (minério de estanho), explorada há 40 anos, que, quando descoberta, situava-se no coração da reserva indígena Waimiri-Atroari, que tem, ainda, nióbio, tântalo, zirconita, criolita e xenotina.
As controvérsias começaram no início da lavra e envolveram corrupção no então DNPM – Departamento Nacional da Produção Mineral, sonegação de contribuições, pagamento de propina para garantir a manutenção do monopólio da produção de estanho no Brasil etc.
Descoberta pela então estatal CPRM – Companhia de Pesquisa de Recursos Minerais, logo o regime militar concedeu gentilmente cinco alvarás de pesquisa sobre a área à empresa Mineração Taboca Ltda, do grupo Paranapanema, posteriormente vendido à peruana Minsur, em 2008. Esclareça: quando da demarcação da reserva Waimiri-Atroari, a área dessa mina ficou fora. Mas a reserva sofre com a degradação ambiental dos seus rios e igarapés causada pelo vazamento dos rejeitos da mina.
De 2008 a 2011, foi destinado à mitigação desses danos ambientais o equivalente a 0,4% do faturamento na região. Na realidade, o que fica para o povo local são estradas esburacadas, ameaçadoras barragens de rejeitos e áreas devastadas. E a morte. É o que sentiu na pele o povo Waimiri-Atroari.
Desde o descobrimento, os indígenas foram vítimas de constantes ataques e esbulhos de suas terras. Por isso, a Constituição de 1988 garantiu (artigos 231 e 232) a propriedade originária sobre as terras por eles ocupadas, atribuindo à União o dever de demarcá-las, proteger e fazer respeitar todos os seus bens.
Além disso, organizações internacionais das quais o Brasil faz parte, a exemplo da OIT e da ONU, afirmam o direito à autodeterminação dos povos indígenas e o dever dos estados nacionais realizarem consulta prévia, livre e informada, em caso de medidas legislativas ou administrativas que os afetem.
Defendemos, por isso, que o Congresso Nacional não tem legitimidade para legislar sobre assuntos de interesse dos indígenas. No caso da mineração, cabe aos próprios coletivos representativos dos povos indígenas decidir e formular as normas que deverão nortear o seu aproveitamento.
Ao Parlamento compete tão somente referendá-las. No caso de emendas, as normas devem voltar à apreciação dos indígenas.
Ao Poder Executivo compete tão somente deflagrar o processo de consulta e dar suporte financeiro ao trabalho dos coletivos indígenas.
Quem sabe assim a mineração sirva para melhorar a vida dos povos indígenas.
(*) Geólogo, advogado e escritor