As poucas instalações médicas que ainda funcionam no norte de Gaza estão sob uma pressão inimaginável. Muitos profissionais de saúde foram forçados a fugir para o sul, pois os ataques israelenses são implacáveis. A equipe restante tem que lidar com acesso restrito à eletricidade e à água. Guillemette Thomas, coordenadora-médica de Médicos Sem Fronteiras (MSF) para a Palestina, baseada em Jerusalém, atualizou, na quinta-feira (19), a situação nos hospitais de Gaza:
“Desde a ordem de evacuação emitida pelas autoridades israelenses, que forçou mais de um milhão de habitantes a se deslocarem para o sul da Faixa de Gaza, as pessoas foram obrigadas a decidir entre ficar e sair. Para os profissionais de saúde, isso significou a escolha entre deixar para trás seus pacientes em uma morte quase certa ou ficar e arriscar suas próprias vidas. Alguns ficaram e continuaram a trabalhar, apesar dos riscos.
“Hoje, a equipe médica enfrenta a mesma realidade do resto dos habitantes, constantemente bombardeada. Nossos colegas dizem que muitos médicos e outros profissionais de saúde morreram desde o início da ofensiva israelense. Relatam que entre 800 e 1.000 pessoas são feridas todos os dias na Faixa de Gaza, incluindo apenas aquelas que conseguem chegar a um hospital.
“Como o acesso às instalações de saúde é extremamente perigoso e complicado, pela falta de combustível, somente os pacientes mais graves procuram atendimento hospitalar. Desde o início do conflito, mais de 10 mil pessoas ficaram feridas e pessoas correm sério risco de morrer nas próximas horas, porque está se tornando impossível conseguir atendimento médico.
“Já estamos testemunhando o colapso do atendimento aos pacientes. A equipe médica não consegue mais tratar as pessoas ou admitir novos pacientes adequadamente. Tudo está sendo feito em condições extremamente precárias, com falta de pessoal, medicamentos e equipamentos médicos. Há um fluxo constante de pessoas gravemente feridas, com ferimentos traumáticos complexos, queimaduras, fraturas e membros esmagados.
“O Hospital Al-Shifa, o principal hospital de Gaza, abriga milhares de pessoas que foram para lá em busca de proteção contra os bombardeios. Gaza está na escuridão e Al-Shifa é um dos poucos lugares que ainda têm eletricidade, embora o combustível só dure mais 24 horas, no máximo. E sem eletricidade muitos pacientes morrerão, especialmente aqueles em tratamento intensivo, neonatologia e em aparelhos de suporte respiratório. Pacientes com doenças crônicas, como diabetes e câncer, e mulheres grávidas também correm risco, por causa da escassez geral de medicamentos.
“Estima-se que 60% da população de Gaza, mais de 1 milhão de pessoas, vivem ao relento, sem acesso à água e à saúde. Não há atendimento médico básico disponível porque as clínicas estão fechadas, e as condições de higiene são muito ruins. Além das pessoas com ferimentos graves, corremos o risco de ver uma onda de doenças associadas às más condições de vida, como diarreia, infecções respiratórias e de pele e desidratação. Metade da população de Gaza tem menos de 18 anos de idade e não há sistema de saúde para cuidar deles.
“É fundamental fazer com que os hospitais voltem a funcionar. Para isso, é preciso garantir cessar-fogo regulares, para que medicamentos e combustível sejam trazidos em grande escala. Se ficarmos sem medicamentos anestésicos, os cirurgiões serão obrigados a interromper as operações. É necessário apoio humanitário imediato para um milhão de pessoas deslocadas. Elas precisam de acesso a água e saneamento, assim como a cuidados médicos básicos, antes que sua saúde se deteriore drasticamente”.