João Baptista Herkenhoff (*)
Se a Justiça foi parcial, ou julgou com imparcialidade o ex-presidente, somente a História dirá. Perante a opinião pública, é estranho que o juiz que condenou Lula tenha sido elevado ao cargo de ministro da Justiça. Um salto monumental.
O ex-tesoureiro do PT
João Vaccari Neto, condenado em primeira instância, foi absolvido na instância
superior porque as provas contra ele foram consideradas insuficientes. A
Justiça julga os cidadãos, mas os cidadãos também julgam a Justiça.
O povo tem consciência
desse direito – exalta o juiz probo, imparcial. Condena o juiz parcial, partidário, que protege este e persegue
aquele.
O pensamento do povo
sobre os juízes, especialmente o juízo condenatório, é discreto porque o
cidadão pode sofrer represália, se aponta o dedo condenatório em direção ao
magistrado que mancha a toga. Os juízes devem julgar com base nos autos. O
julgamento do povo é intuitivo, mas muito profundo.
Lula, quando exercia a presidência
da República, criticou com veemência o Poder Judiciário, numa entrevista
divulgada amplamente no País e no exterior. Se esse entrevero com Lula deixou
marcas, ou foi sepultado, é uma incógnita.
No caso de ter deixado
rancor, os julgamentos do ex-presidente podem não ter sido imparciais até agora
e podem ser manchados pela parcialidade os julgamentos futuros. O espírito de
corpo é muito forte na magistratura. O posicionamento de Lula foi rechaçado com
veemência pela cúpula do Judiciário.
Por ocasião do
pronunciamento de Lula, escrevi em A Gazeta, de Vitória, um artigo, do
qual extraio pequeno trecho a seguir: “Não me parecem inoportunas e impróprias
as críticas feitas pelo presidente Lula. Nem vejo nada de estranho em sua
manifestação favorável ao controle externo da magistratura.
“Lula foi eleito
diretamente pelo povo. Carrega as esperanças do eleitorado que lhe conferiu o
mandato. O povo tem reservas gravíssimas ao Poder Judiciário. Lula não fez
senão expressar os sentimentos da população. Observe-se que a crítica foi
feita como instituição, como engrenagem. Lula não se referiu a pessoas de
magistrados, nem em conjunto, nem individualmente”.
Não é novo o desapontamento do povo relativamente à Justiça. Nova é a prática diuturna da democracia. A partir da queda da ditadura, o povo assumiu seu direito à palavra e à expressão de suas insatisfações. As declarações de Lula, naquela oportunidade, constituíram, a meu ver, um serviço à cidadania, e não um desserviço, como afirmaram presidentes de tribunais.
(*) Juiz de Direto aposentado (ES) e escritor