Uma decisão da juíza Thaíssa de Moura Guimarães, da 20ª Vara Cível de Brasília, pode pôr um fim ao tratamento desigual e misógino que as mulheres frequentadoras de uma igreja no Lago Sul vêm sofrendo desde a edição de uma resolução, em 2018, que as proíbe terminantemente de abrirem a boca para pregar ou falar no púlpito, direito que, a partir do documento, ficou restrito aos homens.
Na segunda-feira (22), a juíza tornou sem efeito as atas das reuniões que afastaram todo o Conselho da Igreja Presbiteriana do Lago Sul, juntamente com o pastor Marcelo de Oliveira Morais, por descumprirem a resolução que bania a mulher membro daquela denominação religiosa de subir ao púlpito e de pregar para os irmãos. O caso foi mostrado, com exclusividade, pelo Brasília Capital.
Reunião forjada
Para embasar sua decisão, a magistrada acatou os argumentos dos membros do Conselho afastados. Segundo eles, os líderes de uma outra corrente dentro da igreja forjaram uma reunião que teria decidido o destino deles na entidade. Ou seja, foram substituídos por um novo grupo.
Mas a reunião, segundo os autores da ação, nunca aconteceu. “Para ‘oficializar’ ou ‘legalizar a decisão’, o Presbítero Valcides José Rodrigues de Souza e a Comissão Executiva do PRBS fizeram uma ata, de número 410, como se fossem o Conselho da Igreja Presbiteriana do Lago Sul, e tentaram levar a ata para registro em cartório.
Cartório recusa ata
O cartório, porém, se recusou a lavrar a ata, argumentando que não havia previsão estatutária no sentido de que o Presbitério Brasília Sul poderia eleger ou destituir os membros administrativos da IPLS. Diante da negativa cartorial, uma nova ata, com a mesma numeração, foi literalmente fabricada para ser aceita no cartório.
“O novo documento fazia menção a uma reunião que nunca aconteceu, pois o reverendo Rudival Alexandre Souza não poderia presidir a reunião do Conselho, porque era o secretário-executivo do Presbitério Brasília Sul – PRBS na mesma data e horário. Some-se a isso o fato de o diácono Carlos Henrique Queiroga Amaral, que consta como presente na reunião, ter declarado nunca ter estado lá”, disse a defesa dos membros afastados.
Depois de aceita, a ata ganhou um novo número: 420. O registro ocorreu em 7 de janeiro deste ano e foi assinado pelos seguintes membros: vice-Presidente Rev. Weber Sérgio Costa da Silva; secretário-executivo, reverendo Rudival Alexandre Souza; primeiro-secretário, reverendo Antônio Marcos Medeiros Lima; segundo secretário, reverendo Rêiner Veloso de Godoy; e o tesoureiro Osvaldo Cipriano da Silva.
Fruto de fraude
Na decisão, a magistrada Thaíssa Guimarães ressaltou, ainda, que é incontroverso o fato de que foram lavradas duas atas de número 410. “Os autores pleiteiam a nulidade da ata de número 410, que nomeia novos membros para o Conselho da IPLS, ao argumento de que é fruto de fraude. Ante o exposto, concedo o pedido de tutela de urgência para suspender a eficácia das atas número 410 e 420 da IPLS”, decidiu Thaissa.
O advogado de defesa dos membros afastados, Ivan Leão, irá pedir o retorno dos seus clientes ao Conselho da IPLS e do pastor Marcelo de Oliveira Morais. “O próximo passo agora é restituir os presbíteros à condição de Conselho e o retorno do pastor Marcelo”, disse ele ao Brasília Capital.
Em junho, o jornal noticiou com exclusividade o caso do afastamento do pastor pela resolução que praticamente bane a mulher membro da igreja de ter voz ativa. Uma das reportagens mostrou que desde 2018, quando a igreja editou a resolução, a mulher membro daquela denominação religiosa está banida dos púlpitos e não pode pregar ou dirigir a Palavra em qualquer dependência dos domínios da IPLS.
Jezabel
Mas, desde que assumiu o controle da igreja, o pastor Marcelo de Oliveira Morais resolveu descumprir esse ato de misoginia e promover uma série de atividades de inserção delas no comando da congregação. Mas acabou punido com a destituição do cargo.
Para justificar seu afastamento no Tribunal Eclesiástico, o acusador Alberto Jaegher de Carvalho, que é diácono na igreja, citou a história bíblica de Jezabel, “dizendo que esta pessoa estava ensinando os homens daquela igreja a prestarem esse culto sexual a outros deuses”, narrou Marcelo, que é marido de uma irmã de IPLS.
A mulher do pastor, segundo ele, foi o alvo da comparação com a personagem bíblica do Antigo Testamento. Isso porque ela era bastante atuante, chegando a pregar passagens da Sagrada Escritura para alguns irmãos e discursar em reuniões da comunidade evangélica, o que é terminantemente proibido pela IPLS.
“Ela não estava atuando em nada na igreja. Ela prega ministério das mulheres. Agora, estou impedido de exercer meu ministério, recebendo um quarto do que eu recebia antes. Afetaram meu orçamento familiar”, reclama o religioso.
Agora é esperar o próximo capítulo. Quem sabe, com um final feliz para as mulheres.