Chico Sant’Anna (*)
Numa rara demonstração de zelo pelo meio ambiente e contra a expansão urbanística selvagem no Distrito Federal, entidades do ramo imobiliário publicaram na imprensa local uma nota contra a lei que reduz em um terço a Floresta Nacional de Brasília (Flona). Eles pedem o veto presidencial ao projeto 2.776/2020, aprovado no Congresso Nacional.
A proposta de redução da Flona nasceu em 2020 no Senado e na Câmara dos Deputados. O senador Izalci Lucas (PSDB) apresentou o PL 4.379/2020 aprovado com parecer da senadora Leila do Vôlei (PDT). Mas tinha como coirmão texto com o mesmo propósito, apresentado na Câmara, pela deputada Flávia Arruda (PL).
A proposta que está para sanção é o de Flávia que, ao chegar ao Senado, teve Izalci como relator. O outro projeto ainda tramita na Câmara. Pela similitude, analistas entendem que os dois parlamentares foram o instrumento de um lobby para legalizar a área grilada. A senadora Leila do Vôlei alega que a versão que construiu no relatório do PL 4.739 foi construída com o aval do ICMBio e estabelece uma contrapartida ambiental, conforme determina o Código Florestal.
Pesos pesados – A senadora estava de licença médica e assim não votou o texto de Flávia, quando ele passou no Senado. Já Izalci não comentou a nota dos pesos pesados do PIB candango, assinada pelo Sindicato da Indústria da Construção Civil (Sinduscon), pela Associação de Empresas do Mercado Imobiliário (Ademi) e pelo Conselho de Desenvolvimento Econômico, Sustentável e Estratégico (Codese).
Para as três entidades “além de sacramentar um crime ambiental – validando a invasão e a perda de 3.600 hectares de floresta – serve de estímulo à indústria de ocupação ilegal de terras”.
Mananciais ameaçados
As entidades ressaltam que a área a ser extirpada da Flona protege mananciais que abastecem a barragem do Descoberto, responsável pelo abastecimento d’água de 60% da população do DF e que chegam a se espantar com a forma de legalização das ocupações da Colônia Agrícola 26 de Setembro e Maranata.
Para o professor de arquitetura e urbanismo da UnB, Frederico Flósculo, “finalmente parece ter ficado claro que o DF se aproxima perigosamente de um ‘ponto de não retorno’, quanto à capacidade de preservarmos nossas águas, flora, fauna e nosso solo”.
Segundo ele, “é o fim de nosso futuro em termos de sustentabilidade”. Flósculo pede que os empresários do setor imobiliário adotem postura idêntica quando da apreciação do novo Plano Diretor do Ordenamento Territorial (PDOT).
Saiba+
A Flona é constituída por quatro manchas territoriais.
Pelo que foi aprovado, a área 2, de 996,47 ha, e a área 3, de 3.071 ha, deixam de existir. Juntas, elas representam 44% da unidade de conservação. São áreas onde a grilagem e a expansão urbana selvagem tomaram conta. A área 2 é próxima à Estrutural e a outra à Barragem do rio São Bartolomeu, onde está a Colônia 26 de Setembro. A ação de grileiros é constante. Em 2020, a Polícia Civil desarticulou duas organizações criminosas voltadas para o parcelamento irregular de terras na 26 de Setembro. Se a presidência da República desejar vetar o projeto, há embasamento jurídico para isto.
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