Jorge Abreu
Articulações dos povos originários de diversos lugares do Brasil se reuniram em Brasília nesta segunda-feira (5) para acompanhar a retomada do julgamento do projeto do marco temporal para demarcações de terras indígenas, na quarta-feira (7), no Supremo Tribunal Federal. A discussão sobre o tema circula no Judiciário desde 2009.
No dia 30 de maio, a Câmara de Deputados se antecipou e aprovou com 283 votos o PL 490/2007, numa vitória da bancada ruralista e do Centrão, contra a política ambiental do governo Lula. Apenas 155 deputados votaram a favor do governo. A tese limita as demarcações dos territórios ocupados até a promulgação da Constituição de 1988. Assim, indígenas que não tiverem como provar que estavam nas terras até aquela data poderão deixá-las sem direito de reivindicação.
A tese passou para apreciação do Senado e recebeu o número PL 2903/2023 com a mesma proposta do 490/2017. O Supremo poderá derrubar o texto, que voltaria à Câmara para novas alterações. Existe, também, a possibilidade de algum ministro da Corte pedir vista, para ter mais tempo de análise do processo.
O julgamento trata especificamente do caso de reintegração de posse da Terra Indígena Ibirama La-Klãnõ. A ação foi movida pelo Instituto do Meio Ambiente de Santa Catarina contra a Funai e os povos xokleng, kaingang e guarani, que ocupam a área. Contudo, a decisão terá efeito do Recurso Extraordinário com Repercussão Geral. Ou seja, estende-se para todos os casos semelhantes que tramitam nas instâncias inferiores do Judiciário.
Ameaças
Para a Apib (Articulação dos Povos Indígenas do Brasil), a proposta do marco temporal defendida pela FPA (Frente Parlamentar da Agropecuária) gera mais ameaças, como a liberação de construção de rodovias, hidrelétricas e outras obras em terras indígenas sem consulta livre, prévia e informada às comunidades afetadas, violando, assim, tratados internacionais, como a Convenção nº 169 da OIT (Organização Internacional do Trabalho) sobre os Povos Indígenas e Tribais.
Outra preocupação da entidade é a possibilidade de questionamentos em relação a procedimentos demarcatórios em todas as fases do processo, inclusive entre os territórios já homologados. Também, a flexibilidade da política indigenista do não contato com as populações isoladas que fere a tradicionalidade da ocupação, o direito originário e o usufruto exclusivo.
O acampamento em Brasília concentra-se na Praça da Cidadania, na Esplanada dos Ministérios, a 2 quilômetros do STF. A expectativa da Apib é reunir 2 mil indígenas até a data da votação. Uma liderança indígena já presente na Capital é o cacique Raoni Metuktire, da etnia caiapó.
Repúdio
Numa entrevista coletiva nesta segunda (5), a coordenadora executiva da Apib, Val Eloy, da etnia terena do Mato Grosso do Sul, destacou que a mobilização é um ato de repúdio aos projetos de lei que não levam em consideração a história de massacre, expulsão e perseguição dos povos indígenas no Brasil, entre elas o atual marco temporal que está em tramitação.
“Estamos novamente nos mobilizando contra os retrocessos que estão tramitando no Congresso e nas Assembleias Legislativas. Nós temos o direito de ter os nossos territórios demarcados. Nossa história não começou em 1988. Somos os povos originários”, disse terena, ressaltando que estamos em plena Semana Mundial do Meio Ambiente, o que reforça a necessidade de respeito aos indígenas.