Gutemberg Fialho
O Conselho Regional de Medicina do Distrito Federal suspendeu o indicativo de interdição ética na emergência do Hospital Regional do Gama, onde óbitos vinham ocorrendo porque os pacientes eram internados mas passavam dias sem serem avaliados por médicos, simplesmente porque não havia profissionais suficientes para atender essa demanda.
A interdição foi suspensa porque houve contratação de médicos em caráter temporário. A mesma coisa aconteceu em setembro de 2021 e, em janeiro deste ano, apenas quatro meses após a assinatura dos contratos, só restava um dos 17 médicos que haviam sido contratados.
Agora foram chamados 14 e, na primeira semana de trabalho, quatro já pediram demissão. E o êxodo não se restringe aos temporários. Diante do verdadeiro processo de desmonte que presenciam, médicos concursados também estão pedindo demissão.
E o HRG continua com o atendimento contingenciado: se não é com bandeira vermelha, é laranja. E a maioria dos pacientes que chega é mandada embora sem atendimento. No fim das contas, nada mudou.
Com número insuficiente de médicos e outros profissionais de saúde e sem condições adequadas para prestar o atendimento devido aos pacientes do Gama, daqui a pouco tempo tudo voltará a acontecer do mesmo jeito: novos desligamentos e pacientes morrendo dentro do hospital por falta de quem os socorra. Aí, fazem nova contratação e a coisa vai se arrastando assim.
É essa a política de saúde do atual governo: remendo, sem solução para coisa nenhuma.
Era de esperar que a contratação por meio do concurso que está previsto fosse resolver. Mas não vai. Primeiro porque o número de vagas é irrisório. O edital disponibiliza 20 vagas de médico clínico para preenchimento. Só no Hospital do Gama são necessários 30 para normalizar o atendimento.
E mesmo que chamem quem ficar no cadastro reserva, eles não vão ficar porque os salários de médicos da Secretaria de Saúde do DF estão muito defasados em relação à realidade do mercado. O que um médico ganha pelo trabalho de um mês na SES-DF, recebe em quatro plantões na rede privada.
Nas condições atuais de trabalho e remuneração oferecidas pelo GDF para médicos no serviço público, vemos um quadro inédito e dramático: profissionais concursados com 10 ou 20 anos de carreira pedindo demissão.
No “modelo alternativo” do IGESDF é ainda pior: boa parte dos profissionais que assumem as vagas de trabalho são recém-formados buscando adquirir mais experiência na prática médica. E assim que conseguem ou quando se sentem pressionados demais pela demanda, pedem demissão. Vão atuar na medicina privada ou vão para outros estados onde o custo de vida é mais baixo.
Não bastasse a sequência de ataques a direitos trabalhistas e mudanças desfavoráveis aos trabalhadores, como a reforma federal, em 2017, e as alterações no Regime Próprio de Previdência dos Servidores do DF, nos governos Rollemberg e Ibaneis, médicos (bem como os demais servidores públicos do DF) sentem-se desmotivados pela falta de capacidade técnica e de comprometimento dos gestores e governantes.
É fundamental que os postulantes ao GDF tenham em mente que é urgente a necessidade de rever políticas públicas e reorientar as prioridades na gestão da saúde. Entre as medidas urgentes e inadiáveis está a reformulação da carreira médica e a recomposição salarial da categoria, sob risco de aumentar o êxodo de profissionais e, com isso, piorar ainda mais a qualidade da assistência prestada aos pacientes do SUS.