A terça-feira gorda foi de vigília e apreensão para moradores da Quadra 26 do Park Way. De uma hora para outra, uma área verde de 20 mil metros quadrados foi invadida por um bloco que não era de carnaval. Pelo menos quinze famílias começaram a levantar barracas com lona plástica e se instalaram por trás da densa vegetação, evitando serem observadas por quem passasse na rua.
A mobilização dos moradores fez com que em pleno carnaval a Polícia Militar entrasse na “avenida” (na mata). Numa primeira apuração, descobriu-se que muitos dos invasores eram figurinhas carimbadas em outras ações de ocupação irregular do solo. Os que já eram fichados foram levados à delegacia de polícia, mas as tendas e barracos ficaram de pé, preocupando moradores, que temiam uma volta dos oportunistas.
Segundo um policial, a técnica é ocupar uma área nobre com pessoas ditas carentes, e depois, com base em interesse social, regularizar o espaço e revendê-lo a preço de ouro.
Madrugada a dentro, os invasores continuaram a erguer acampamento. Sons de marteladas emanavam do interior da mata. Um morador da quadra, que é policial, tentou dialogar com o grupo e foi espancado. A agressão fez com que a PM comparecesse ao local, levando mais quatro pessoas presas, sendo um menor.
Esse é um local que repetidamente vem sendo ofertado à venda por grileiros. Dessa vez, os invasores apresentaram uma certidão passada em cartório de Goiás, pela qual a área de 20.000 m², que é pública e não configura lote formal, fora vendida por R$ 200 mil. Um lote desse tamanho custa pelo menos de R$ 7 milhões a R$ 8 milhões. Segundo relato dos invasores, o suposto comprador havia autorizado a instalação de 40 barracos.
Somente após o sol nascer, com a presença de mais policiais e de representantes da Administração Regional, o grupo pôde ser retirado. Passava das 10h quando um homem que não se identificou compareceu ao local, acompanhado de advogado, alegando ser o dono da área pública. A PM não se intimidou e manteve a retirada. O processo agora correrá na 11ª DP.
Multa inócua
– Embora a Vara do Meio Ambiente tenha determinado, em setembro do ano passado, multar corretores de imóveis (formais ou não) em R$ 300 mil e os cartórios e outros entes públicos, em R$ 3 milhões, a cada transação tida como ilícita no Park Way a ameaça parece não ter surtido efeito. As vendas e parcelamentos irregulares no bairro continuam a todo vapor.
Na Quarta-feira de Cinzas, ao mesmo tempo em que a PM desocupava a invasão da Quadra 26, outra ocupação irregular começava na Quadra 15. Uma zona de transição da vida silvestre, nas imediações do córrego do Mato Seco, teve a vegetação original retirada e área foi cercada.
Em janeiro, a Promotoria de Defesa do Meio-Ambiente foi notificada sobre outra invasão, localizada a menos de dois quilômetros da que ocorreu na terça-feira de carnaval. À Prodema informou-se endereço, nome do potencial responsável e fotos da ocupação e posterior comercialização dos lotes. Segundo a representação ao MPDFT, o responsável seria um integrante do Corpo de Bombeiros do DF. Mais de um mês já se passou e nada aconteceu.
Lavagem oficial de terras públicas
O mais impressionante é que se de um lado não há ações coibindo o avanço da grilagem por órgãos do GDF, por outro, o mesmo GDF dá andamento a processos que visam dar legalidade a loteamentos irregulares. Uma espécie de lavagem oficial de terras públicas.
É o que acontece na Quadra 16, conjunto 2, lote 4. Detalhe: o lote 4 não existe formalmente. É uma área de proteção ambiental nas imediações do córrego do Cedro. Mesmo assim, a Empresa de Assistência Técnica e Extensão Rural do Distrito Federal (Emater-DF) analisa processo de regularização da área. Mas não é para nenhum projeto agrícola, ou experimento rural. No local, já há previsão de se implantar um condomínio residencial com 8 lotes, medindo cada um, 2,2 mil metros².
Nas redes sociais do bairro, o desalento é um só; como foi expressado por um morador: “O Park Way está largado mesmo… Cadê a polícia, cadê o Ibram, cadê o DF Legal, cadê o administrador?
E assim, a banda passa, o carnaval também e o bloco dos grileiros e invasores vai fazendo o povo sambar.