O general Paulo Chagas (PRP), 71 anos, foi o quarto colocado na corrida ao Buriti em 2018. Nesta entrevista exclusiva ao Brasília Capital, diz que não pretende concorrer a cargo eletivo em 2022 e se recusaria a apoiar o governador Ibaneis Rocha (MDB) ou a deputada Flávia Arruda (PL) – esta, segundo ele, pelo vínculo com o ex-governador José Roberto Arruda. No plano nacional, avalia que Bolsonaro não cumpre o que prometeu na campanha e se deixa conduzir pelos interesses dos filhos. “Ele tinha condições de ser bem assessorado pelas pessoas mais próximas. Mas preferiu continuar escutando os filhos”, critica.
Por que o senhor mudou de posição em relação a Bolsonaro? – Eu não mudei de posição. Quem mudou foi o presidente. Eu fiz, digamos, uma aposta de que se ele não fosse capaz de dominar o próprio temperamento, ele tinha condições de ser bem assessorado pelas pessoas mais próximas a ele. Mas Bolsonaro preferiu continuar escutando os filhos. Quer dizer, tem uma postura diferente do que deveria ser a postura de um presidente da República.
Como seria essa postura? – Uma coisa é ser deputado, vereador. Outra coisa é ser presidente da República. Deputado representa um nicho, um determinado grupo de pessoas. Mas o presidente tem que se comportar como presidente de todos e buscar cumprir suas promessas de campanha.
Bolsonaro não tem cumprido? – O calcanhar de Aquiles do governo é o próprio presidente, que tem atitudes aquém do posto que ocupa.
Ele ainda não desceu do palanque? – Com certeza. Agora há pouco eu estava revendo algumas mensagens que eu troquei com o Gustavo Bebianno logo depois da eleição. Sou testemunha do quanto Bebianno ajudou Bolsonaro. Era um pitbull guardando a pessoa do presidente.
Bebianno foi traído pela família Bolsonaro? – Sem dúvida! O que aconteceu é que o Bebianno passou a ocupar uma posição face ao presidente que criou, particularmente no vereador Carlos Bolsonaro, um ciúme muito grande. Eu diria, em função do que Bebianno me falou, que Carlos exigiu a saída do Bebianno. E isso ficou muito ruim.
Manter-se no palanque e incentivar a radicalização é uma estratégia? – Antes da campanha, Bolsonaro dizia que era contra a reeleição, que faria um governo de quatro anos para cumprir aquilo que tinha prometido. Mas, quando foi eleito, ele mudou de posição. Passou a admitir a reeleição e a se comportar no sentido de permanecer no cargo.
A impressão é de que ele só trabalha em função disso… – Isso foi num crescente. No início, era apenas um indício de que ele havia mudado de atitude, talvez emprenhado pelo ouvido, pelas ambições dos mais jovens da família. Admitiu que queria a reeleição e o governo e as atitudes dele passaram a ser nesse sentido, comprometendo as promessas que havia feito.
E no meio do caminho apareceu a pandemia e o presidente adotou um discurso contrário à ciência. Seria uma jogada política ou realmente ele acredita no que fala? – Nem um nem outro. Eu diria que foi um erro gravíssimo da parte dele, porque logicamente que foi informado e tinha consciência de que a pandemia atingiria a economia, e ele priorizou a economia. Tinha que ter equilíbrio. Ele se negou a fazer o planejamento, a assumir a responsabilidade pelo combate à pandemia. Numa primeira fase, tinha que dar prioridade para a saúde, e depois começar a migrar a prioridade para a economia. Mas o presidente se colocava como oposição ao próprio Ministério dele. Oposição ao próprio ministro.
E já foram quatro ministros em 14 meses… – E todos saem depois de um desgaste. O Mandetta podia até não ter a competência necessária, mas estava na direção correta de ver de que maneira poderia priorizar a saúde. E se perdeu muito tempo.
O general Pazuello cumpriu bem a missão? – Primeiro, precisamos separar: a missão dele nunca foi do Exército; sempre foi do Bolsonaro, ele foi convidado a ocupar uma função no governo, como qualquer um poderia ter sido. Por acaso, ele era um oficial da ativa do Exército. E não é médico. Ele foi para lá para ajudar na parte logística.
Mas tomou decisões como se médico fosse. Cumpriu ordens do presidente desconsiderando a ciência… – Eu não justifico por esse lado. O chefe não precisa saber tudo. Nós temos vários ministros da Saúde que não eram médicos e desempenharam bem a função. Souberam se assessorar. Esse é o fundamento da chefia e da liderança: saber ser assessorado, escolher bem os auxiliares. O chefe não precisa saber. Ele tem ter competência para usar a competência de quem sabe.
O senhor foi candidato a governador, teve 110 mil votos. Disputará novamente o GDF ou outro cargo? – Hoje, minha posição é não concorrer a coisa nenhuma. Quero dar minha contribuição como cidadão. Fiz essa incursão na política e não gostei. Mas esses 110 mil votos me deram um certo protagonismo.
Achou bom perder? – Me empenhei ao máximo para ganhar. É lógico que com as condições que eu tinha era muito difícil.
O seu partido investiu mais na campanha da deputada Bia Kicis do que na chapa majoritária. O senhor foi abandonado pelo PRP? – Não é que eu tenha sido abandonado. O PRP foi pragmático. Ele podia ter todos os governadores do Brasil, mas se não elegesse um número X de deputados, deixaria de existir, como de fato deixou de existir. Então, era mais importante eleger deputados do que governador. Como os recursos eram limitados, investiram mais na Bia do que no governador.
Hoje o senhor concorda com a atuação dela na Câmara? – A Bia ela é uma mulher determinada, culta, sabe o que quer. Eu só faço crítica ao fato de ela ser submissa às atitudes do presidente. Eu acho que ela teria condições de ajudar o presidente sendo crítica a ele, não publicamente, mas no privado, se utilizando do prestígio que ela tem para ajudá-lo. Porque quem faz mais mal ao presidente é ele próprio. O grande inimigo do Bolsonaro é o temperamento dele, são as atitudes dele.
O senhor disse que não pretende ser candidato. Quem herdaria os 110 mil votos que o senhor teve em 2018: Flávia Arruda ou Ibaneis Rocha? – Eu não daria apoio a nenhum dos dois. Eu teria que ver quem são os candidatos, mas esses dois não contam com a minha confiança. Mas, se o vice-governador Paco Britto fosse candidato, ele seria alguém que mereceria meu apoio. Quanto à deputada Flávia, considerando o vínculo que ela tem com o ex-governador Arruda, eu também não confiaria nela para ser governadora do nosso quadradinho.
O Paco Britto nos concedeu uma entrevista semana passada dizendo que é candidato a vice com o Ibaneis. O senhor votaria no Ibaneis pelo vice? – Não, não votaria. Eu votaria no Paco Britto se o Ibaneis fosse vice dele.
No plano nacional, apoiaria a reeleição de Bolsonaro? – Nós temos que ver o quanto estamos perdendo tempo. Estamos andando atrás de ideologia para a esquerda e para a direita. Estamos vendo, por exemplo, os candidatos já praticamente definidos – Bolsonaro e o ex-presidente Lula. São dois extremos que se preocupam muito mais em estar no extremo do que em andar para a frente.
Enquanto isso, as pessoas ficam desassistidas, sem vacina, sem oxigênio, sem respiradores. Para o presidente, um desgaste político. Para a população, a morte… – Você está certo! Quando me candidatei a governador, tinha em mente colocar como prioridade a Segurança Pública. Porém, após visitar os hospitais da Asa Norte (HRAN) e do Gama (HRG), mudei completamente a minha diretriz. E disse: nós vamos focar na Saúde, até que a Saúde do DF seja modelo para o Brasil. O nosso quadradinho tem todas as condições de ser o exemplo da aplicação do SUS, que é um modelo perfeito, mas não está funcionando no Brasil. Tem uma teoria que nunca foi posta em prática. Eu pensava exatamente nas Unidades de Terapia Intensiva, na falta de UTI. Quando começou a pandemia, eu me lembrei disso e imaginava: se numa situação de normalidade não tínhamos UTI, como será agora?
Gustavo Bebianno (foto) foi ministro da Secretaria-Geral da Presidência. Era pré-candidato à Prefeitura do Rio de Janeiro pelo PSDB, a convite do governador de São Paulo, João Dória, quando faleceu, em 2020, aos 56 anos. Na campanha de 2018, se aproximou de Jair Bolsonaro e foi um dos responsáveis pela filiação dele ao PSL. Bebianno controlava o dinheiro dos fundos partidário e eleitoral e tornou-se pivô da primeira crise política do governo. Acabou demitido um mês e 18 dias após assumir. Acusava Carlos Bolsonaro, mas dizia que sentia “amor e afeto”pelo presidente. |