O fuzilamento do criminoso Lázaro Barbosa de Sousa, na madrugada de segunda-feira (28 de junho), encerrou uma caçada de 20 dias e criou dúvidas e mistérios que levarão muitos meses (ou anos) para serem esclarecidos pelas Polícias Civis de Goiás, do Distrito Federal e da Bahia.
Lázaro foi alvo de 125 tiros disparados por policiais militares goianos e atingido por 39 projéteis. Mesmo assim, seu corpo foi jogado numa viatura da PM e depois transferido para uma ambulância do Corpo de Bombeiros até chegar ao hospital, onde sua morte foi constatada oficialmente.
O maníaco espalhou medo e ódio entre a população e as forças de segurança pelos crimes bárbaros que cometeu ao longo de vários anos no perímetro de Ceilândia, no DF, e Águas Lindas e Cocalzinho, em Goiás. Num deles, matou pai, mãe e dois filhos da mesma família.
Mas, o que seria o fim de uma agonia, encerrando a missão de um batalhão de 270 policiais que se mobilizaram para as buscas ao serial killer, abre um leque de vários mistérios. Entre outros: por que Lázaro foi morto com 39 tiros quando já estava cercado e apresentava debilidade física, magreza e cansaço, e dificilmente escaparia ao um cerco de um contingente de guerra? Como a polícia vai desnovelar a dúvida dos chefes da megaoperação se o maníaco agia por conta própria ou a mando de alguém?
Rede de interesses
Em meio a gritos de euforia e carreata de viaturas oficiais para festejar o que a polícia goiana classificou como “operação bem-sucedida”, o serviço de inteligência da Secretaria de Segurança Pública de Goiás continuava o trabalho para referendar a hipótese de uma rede de interesses que investia em Lázaro para que fizesse o “serviço sujo”, ou enterrar de vez tal possibilidade.
Em nota enviada ao Brasília Capital, a Secretaria confirmou que uma das linhas de investigação após a morte de Lázaro é a de que ele pode ter agido barbaramente a mando de alguém. A assessoria da Pasta admite que existe a suspeita de haver uma rede de interesses em torno das terras da região desde Cocalzinho até Ceilândia.
A suspeita da polícia de participação de mandantes para os crimes cometidos pelo serial killer passa pela morte da família Vidal. Cláudio Vidal de Oliveira, 48; Carlos Eduardo Marques Vidal; 21, e Gustavo Marques Vidal, 15, foram encontrados sem vida dentro de casa e com marcas de tiros e facadas, na fazenda onde moram outros membros da família. O crime ocorreu numa quarta-feira (9/6).
O corpo da esposa de Cláudio e mãe de Carlos e Gustavo, Cleonice Marques, 43, só foi encontrado três dias depois num córrego no Sol Nascente, que fica em Ceilândia. Ela estava nua e apresentava marcas de violência sexual. Mais tarde a polícia descobriria que Lázaro era o autor.
Imensidão de terras
O casal Cláudio e Cleonice era dono de uma imensidão de terras, onde funcionam até hoje as empresas Viveiro Vidal e Agricultura, no Incra 9, à margem da BR-070. É a partir desse crime que a polícia começou a suspeitar de que Lázaro estivesse a mando de alguém. O autor da chacina teria cometido o crime para que os herdeiros resolvessem vender a terra.
Apesar de surgirem rumores na mídia de que os parentes do casal estariam interessados em se desfazer da propriedade, um dos familiares, que se identificou apenas como Geraldo, garantiu à reportagem do Brasília Capital que não pretende vender a propriedade.
Para ele, Lázaro era um psicopata que matava por prazer. “Eles foram mortos por um psicopata. Foi um assassinato e nada mais. Não estamos vendendo nada. Não acredito que ele agia a mando de alguém interessado em comprar nossas propriedades”, disse Geraldo.
O criminoso vivia no mato, mas foi encontrado com uma importância significativa de dinheiro (R$ 4,4 mil), parecia se alimentar de comida pronta e não somente de animais exóticos, como rãs. Quatro dias antes do cerco, a polícia chegou a um fazendeiro e seu caseiro, após constatar que os dois davam cobertura e suporte a Lázaro.
Fazendeiro dava cobertura
O fazendeiro Elmi Caetano Evangelista, 74 anos, e o caseiro dele, Alain Reis de Santana, 33, foram presos, mas só o primeiro continua detido. De acordo com o depoimento do caseiro, o patrão alimentava Lázaro e dava guarida ao criminoso, que se escondia em sua fazenda, em Cocalzinho.
O caseiro disse que recebeu ordens de não deixar a polícia entrar no terreno desde o dia 18 de junho. Às vésperas de exterminar Lázaro, na madrugada dia 23 de junho, uma equipe do Comando de Operação de Divisas da PM (COD) foi proibida de entrar na fazenda pelo proprietário.
O Ministério Público de Goiás (MPGO) apresentou denúncia à Justiça contra Elmi Caetano Evangelista por suspeita de auxiliar na fuga de Lázaro Barbos. No documento, a promotora de Justiça de Cocalzinho, Gabriela Starling Jorge Vieira de Mello, também pede que o filho do acusado, identificado como Gabriel, seja investigado. Ela acredita que existam indicativos da participação dele no crime de favorecimento pessoal praticado pelo pai.
Dúvidas vão para o túmulo
Lázaro levou para o túmulo as explicações que teria para cometer tanto derramamento de sangue. Sua mancha criminal começa na Bahia, onde matou duas pessoas em Barra dos Mendes, em 2007. Onze anos depois, foi preso em Águas Lindas de Goiás, em cumprimento a três mandados de prisão por homicídio qualificado, porte ilegal de arma de fogo, roubo e estupro.
No dia 8 de abril de 2020, invadiu uma chácara em Santo Antônio do Descoberto e golpeou um idoso com um machado. No dia 26 do mesmo mês, mas em 2021, Lázaro invadiu uma casa no Sol Nascente (DF), quando trancou pai e filho no quarto e levou a mulher para um matagal e a estuprou.
No dia 9 de junho deste ano, o assassino em série invadiu uma chácara no Incra 9, em Ceilândia (DF), onde matou a tiros e a facadas um casal e dois filhos. Mesmo sob forte vigilância policial, não parou mais. No dia 12, atirou em quatro pessoas, invadiu fazendas e colocou fogo em uma casa ao fugir da polícia. Três dias depois, baleou dois policiais militares de Goiás durante buscas a ele.
Agora morto, quem poderá revelar as motivações de Lázaro ou mesmo desvendar os mistérios de sua mente doentia?
Caçada custou R$ 24 milhões
Sua caçada gerou um custo milionário aos cofres públicos. Foram empregados, ou investidos, como queiram chamar as autoridades, mais de R$ 24 milhões em horas extras para policiais, emprego de viaturas, aeronaves, munição, armas.
“A perda de qualquer vida, seja de criminosos, de cidadãos comuns ou de policiais, implica em prejuízos emocionais e materiais. O emocional, afeta direta ou indiretamente a família das vítimas e do próprio criminoso. Uma morte aciona todo um sistema público e, às vezes, implica em custos para o sistema de saúde, para a seguridade social e para o sistema econômico, já que a perda pode representar um indivíduos ou mais, economicamente ativos, que terão deixado de ser contributivos para o desenvolvimento social”, sintetiza o professor e pesquisador em segurança pública da Universidade Católica de Brasília (UCB), Nélson Gonçalves.
(*) Especial para o Brasília Capital