Se o jornalista Sérgio Porto – ou Stanislaw Ponte Preta, como assinava em pseudônimo – estivesse vivo, faria nova edição, versão século XXI, do Febeapá – Festival de Besteira que Assola o País, uma obra literária que descreveu o que foi a gestão dos generais nos sombrios e vertiginosos tempos da ditadura militar. Agora é um capitão que comanda um Febeapá sem precedentes no Brasil.
A última do governo de Jair Bolsonaro (sem partido) foi a nomeação do “oficial” da Marinha Carlos Decotelli ao cargo de Ministro da Educação. Ele sucederia a Abraham Weintraub, que fugiu do Brasil para os EUA com passaporte diplomático sem ser membro do governo, mas com apoio do capitão expulso do Exército, que atualmente ocupa o cargo mais alto da Nação.
Ao anunciar a escolha de Decotelli, Bolsonaro citou, nas redes sociais, os principais títulos acadêmicos do “novo” ministro, incluindo “um mestrado na Fundação Getúlio Vargas (FGV), um doutorado na Universidade de Rosário, da Argentina, e um pós-doutoramento na Universidade de Wuppertal, da Alemanha”.
A nomeação foi publicada no Diário Oficial da União de quinta-feira (25/6). Mas o indicado pelos generais que integram o governo foi desmascarado antes da posse por uma avalanche de denúncias contra sua formação acadêmica. Na terça-feira (30), ele entregou sua carta de demissão.
O ex-futuro ministro teve uma rápida passagem, de fevereiro a agosto de 2019, pelo Fundo Nacional de Desenvolvimento da Educação (FNDE), até o MEC anunciar a troca do comando do FNDE sem informar o motivo. Apesar de pouco expressiva, era a única informação verdadeira no currículo.
Daí em diante, só apareceram fraudes curriculares, suspeitas de falsos títulos acadêmicos, plágio etc. Na quarta-feira (1º), o DOU trazia a anulação formal da nomeação. Com isso, em menos de 2 anos, três ministros passaram pelo agora acéfalo MEC.
Currículo fake
Decotelli foi denunciado por plágio na dissertação de mestrado da FGV; por falso título de doutorado na universidade argentina; e pelo falso pós-doutoramento na Alemanha. O reitor da Universidade Nacional de Rosário foi à imprensa dizer que o novo ministro da Educação brasileiro não obteve o título de doutor naquela instituição.
“O senhor Decotelli cursou o doutoramento em Administração da Faculdade de Ciências Econômicas e Estatísticas da Universidade Nacional de Rosário, mas não o concluiu. Não completou todos os requisitos exigidos pela nossa regulamentação, que exige a aprovação de uma tese final para obter o título de doutor. Portanto, não é doutor pela Universidade Nacional de Rosário”, declarou o reitor Franco Bartolacci à Rede Globo.
Posteriormente, surgiu a suspeita de plágio em partes da dissertação de mestrado entregue por Decotelli à FGV, no Rio de Janeiro, situação que o postulante ao cargo de ministro negou, alegando “distrações”. Em comunicado, a FGV indicou que o orientador da dissertação foi procurado e que, caso seja confirmado um “procedimento inadequado”, serão tomadas medidas administrativas e judiciais contra Carlos Decotelli.
A Universidade de Wuppertal, na Alemanha, informou, na segunda-feira (29/6), que o novo ministro não possui nenhum título pela instituição, ao contrário do que constava no seu currículo, que mencionava um curso de pós-doutoramento. Para piorar, a FGV, uma das mais importantes instituições acadêmicas brasileiras, negou que ele fez parte de seu corpo de professores.
Em comunicado, a FGV frisou que Decotelli “atuou apenas nos cursos de educação continuada, nos programas de formação de executivos e não como professor de qualquer das escolas da fundação, da mesma forma, não foi pesquisador da FGV, tampouco teve pesquisa financiada pela instituição”.
Na manhã de quarta-feira (1º/7), as mídias sociais divulgavam imagem do currículo do oficial da Marinha, na página do CNPq, com a informação de que Decotelli foi Ministro da Educação do Brasil, sem ter sido.
Salve, Stanislaw Ponte Preta!
QUADRO
Confira o verdadeiro currículo de Carlos Alberto Decotelli da Silva
– Suspeita de licitação quando presidiu o FNDE
– Acusado de plágio em dissertação de mestrado
– Universidade argentina nega que ele tenha doutorado
– Universidade alemã informa que ele não tem pós-doutorado
– Muda currículo duas vezes após faculdades contestarem seus títulos
– Ficou nomeado durante 4 dias para o MEC mas não tomou posse
– Constará no currículo que foi Ministro sem nunca ter sido