Fátima Sousa quer governar Brasília “para enfrentar todos os problemas que ela tem”. A candidata do PSol ao Buriti lembra Euclides da Cunha em Os Sertões – “o sertanejo é antes de tudo um forte” – ao se apresentar como mulher, enfermeira, paraibana, nordestina e gestora pública. Promete gerir a cidade a partir da criação de conselhos temáticos para ouvir as demandas da população, inclusive com o Orçamento Participativo. Quando estava no PT, participou da campanha de Luiza Erundina para prefeita de São Paulo e administrou o maior orçamento do Ministério da Saúde no governo Lula. Na gestão de Cristovam Buarque liderou, com a então secretária Maria José Maninha, o Programa Saúde em Casa no DF, que promete retomar. Nesta entrevista ao Brasília Capital ela conta que saiu do PT “por princípios e por valores”. Mas, “em defesa da democracia”, se alinha ao movimento Lula Livre.
A senhora tem um vasto currículo na área da Saúde. Como usaria sua experiência para melhorar a Saúde de Brasília? – Sou pré-candidata a governadora para administrar o DF e todos os problemas que ele tem. Referente à saúde, de fato, nós temos percorrido todas as regiões administrativas e é o que mais grita nas demandas da população. Vamos trazer de volta um projeto que a cidade já viveu e gostou, que é Programa Saúde em Casa. Esse é um programa eficaz.
Que foi coordenado pela sua correligionária Maninha, pré-candidata a deputada federal… – Ela divide comigo a responsabilidade de trazer de volta o Saúde em Casa.
Não seria muito caro reativar esse programa? – Não é questão de caro ou barato. Dinheiro não é problema no DF no que se refere à saúde. Temos que colocar o SUS para funcionar. Infelizmente, até hoje, entra governo e sai governo, e o SUS constitucional não funciona.
A senhora reveria o contrato do Instituto Hospital de Base? – Com certeza. Nesse caso, entregaram a responsabilidade do governo, garantida pela Constituição. Estou há 40 anos militando na área da Saúde, e o artigo mais difícil que colocamos na Constituição foi o 196, que garante ao cidadão a saúde aonde quer que ele more. É daí que vem a ideia do Saúde Em Casa. Nesse programa, o hospital e os postos de saúde são retaguardas. É o contrário do que vários governos vêm fazendo em Brasília. Eles colocam os hospitais como centro das atenções. Eu fui à UPA do Núcleo Bandeirante e não tinha nenhum médico por lá. Ou seja, isto contraria a natureza da Unidade é o Pronto Atendimento. Com o Saúde Em Casa, vamos massificar os agentes de saúde. Feito isso, vamos organizar a rede básica de saúde. O que nada mais é que os centros de saúde. Isso resolve. Isso funciona.
A ideia é descongestionar os hospitais… – Não só diminuir as filas dos hospitais, mas dar resolução. Por exemplo, um pico de hipertensão seria resolvido em casa pelos agentes de saúde. Isso é protocolar. Todos dizem que o Hospital Sarah Kubitschek é o melhor, e é verdade. Mas ele tem uma especialidade única e o faz bem. É isso o que vamos fazer com todos hospitais da cidade.
Cada unidade teria uma especialidade? – Claro. Há um perfil para cada hospital. Nós vamos definir conversando com cada diretor. Esse é o grande erro dos governos atuais: eles não discutiram com os profissionais da saúde. O HBB tem que voltar para o Estado. O Hospital do Paranoá seria referência em ortopedia. Mas hoje lá não tem gaze, não tem soro fisiológico. Se eu disser que o Hospital de Ceilândia vai ser especializado em Cardiologia, eu tenho que equipar para responder às demandas referentes à Cardiologia. Hoje, o Samu fica igual pingue-pongue, levando pacientes de hospital em hospital para saber onde tem atendimento. São vários exemplos de pessoas que morrem dentro do Samu por ele não saber para onde levá-las.
O segundo tema que domina o eleitorado é a Segurança Pública. O que a senhora faria para reduzir a violência no DF? – Nós formamos um grupo de trabalho com o que tem melhor em Brasília, inclusive com pessoas da UnB, para discutir isso. A coordenadora da nossa campanha é a professora Beatriz Vargas, que vem historicamente trabalhando nessa questão. Ela é pesquisadora da área de prevenção da violência. Nosso programa conta com três pontos que não vamos abrir mão: 1) Cuidar de quem cuida da segurança pública. Tratam servidores da Segurança Pública com muito descaso. Discutem apenas o salário, que é muito importante, mas não discutem a carreira profissional; 2) Vou investir pesado na prevenção. Os policiais vão fazer parte dos conselhos de segurança pública. Vamos usar e abusar das tecnologias para identificar em tempo real onde está acontecendo a violência. Vamos utilizar o dinheiro do Fundo Constitucional para equipar essas corporações; 3) Fazer a integração das políticas públicas. A segurança começa na creche, na educação. Quando você forma um cidadão resiliente, pacífico, aí começa prevenção. Nós vamos nos antecipar, com a prevenção.
Esse discurso de campanha é sempre muito simpático, mas na prática é pouco produtivo. O Sinpol só está preocupado com a paridade com a Polícia Federal. A senhora pagaria essa paridade? – Eu sou professora e trabalho com fatos. Com dados reais. Tenho afirmado que nós vamos sentar à mesa e saber o que temos de recurso disponível e abrir a caixa para usar esse recurso. Todo mundo vai saber o que tem e o que não tem no caixa do governo, inclusive do Fundo Constitucional. Vamos criar grupos de trabalho para as pessoas saberem os problemas e juntos resolvermos. Vamos montar uma câmara permanente para resolução de problemas com todos os servidores do GDF. Vamos criar um Conselho do Bem-Viver para atender os servidores, onde discutiremos defasagem salarial, questão de carga horária, carreira…
Como enfermeira, a senhora considera justo a jornada de 18 horas semanais de seus colegas na rede pública? – Essas diferenças e disparidades, quando colocadas à mesa, tenho certeza de que serão solucionadas. A administração pública não se segura com essas diferenças tão díspares.
O líder das pesquisas, Jofran Frejat, saiu da disputa. O que isso altera no cenário da campanha? – Minha candidatura não abala em nada. Eu não pertenço ao grupo do Frejat. Minha história de vida sempre foi em um partido de esquerda, e nunca saí. Aos 12 anos decidi meu lado e nunca mudei. No campo da Saúde, ter o Frejat na disputa significaria ter um debate. Nós iríamos cobrar o que o grupo dele não fez quando estava no governo. A ausência dele me dá uma responsabilidade maior porque eu vou ter que discutir todos os problemas da Saúde. Inclusive de governos dos quais ele participou. Para o cenário político, acho que ele fica devendo aos brasilienses quem são os demônios que o atormentaram. De que natureza foram essas pressões? Que diabos são esses que tumultuaram a política local? É lamentável para Brasília este segredo não ser revelado. Eu espero que ele o faça. Ainda tem tempo.
É muito difícil um partido pequeno, com pouco tempo de televisão, ganhar uma eleição majoritária. O PSol vai sair sozinho? – Não, o PCB fechou um acordo nacional e estará conosco.
É o suficiente para levar a mensagem de vocês? – Eu não vou levar só mensagem! Eu vou ganhar essa cidade. Nossa campanha é de outra natureza. Não viemos só para marcar posição. É muito legal você ir na casa das pessoas, olha no olho. Elas dizem a verdade, o que estão sentindo de fato. Nós não vamos comprar cabo eleitoral, não vamos fazer bandeirinha. Isso é coisa do outro lado.
O PT fazia esse discurso da honestidade e acabou envolvido no Mensalão e no Petrolão. Como assegurar que o PSol não vai fazer a mesma coisa? – Nós não vamos causar a mesma decepção. Se fôssemos, estaríamos todos no PT. Mas saímos por princípios e por valores. Ou seja, nós não vamos responder pelos erros do PT. O próprio PT deverá responder pelos seus erros. Se eles se perderam, irão pagar o preço por terem se perdido. Nós estamos na estrada certa.
Mas o seu partido levanta a bandeira do Lula Livre. – O que o (Guilherme) Boulos (candidato à presidência da) fez e muitos de nós fazemos é porque estão judicializando a política. Isso é muito ruim para democracia. Nunca vi um processo tão rápido e tão célere na Justiça brasileira quanto o de Lula. Não estou julgando os erros de governo do Lula, nem toda a aliança que ele fez. O que eu quero dizer é que judicializar a política é errado. Não tem de se politizar, se não ele senta na cadeira dos políticos. Então, a bandeira Lula Livre é mais do que um nome. É a bandeira da democracia. Se hoje é Lula, amanhã pode ser eu ou pode ser qualquer um. A gente não pode admitir isso na Justiça.