O Tribunal de Justiça do Distrito Federal concedeu liminar na qual garante aos estudantes que vivem nas ruas o pleno acesso ao passe livre estudantil. A decisão acata um pedido da Defensoria Pública do DF, que entrou com ação civil pública contra as exigências impostas pelo Transporte Urbano do DF (DFTrans).
Segundo o defensor público Fábio Levino, coordenador do Núcleo de Defesa dos Direitos Humanos da Defensoria Pública do DF, a principal dificuldade dos estudantes para acessar o cadastro do passe livre estava na impossibilidade de comprovação de endereço fixo, uma das exigências da legislação local para conceder o benefício. Outro empecilho é a forma de cadastro, que atualmente é totalmente online. Estudantes com este perfil não têm acesso a computadores com facilidade.
O período de inscrição também é apontado como uma barreira para esses alunos, pois se restringe aos prazos regulares de matrícula no início do semestre. Os estudantes que vivem nas ruas não se enquadram nesse perfil; eles se vinculam às escolas em qualquer período do ano. Pela liminar, as pessoas que vivem nas ruas poderão ter acesso ao cadastro em qualquer tempo e preencher o formulário por escrito.
“O tratamento diferenciado e flexível é pela condição vulnerável dessas pessoas. Não queremos conceder um benefício a mais para o estudante que vive na rua, apenas garantir a aplicação do princípio de igualdade a um direito já existente. Não dar acesso à educação a uma pessoa que não tem casa é puni-la duas vezes”, afirmou Levino.
Uma das unidades que serão beneficiadas com a decisão judicial é a Escola Meninos e Meninas do Parque, considerada referência no país por atender exclusivamente moradores de rua. A escola tem atualmente cerca de 180 alunos matriculados, mas nem todos frequentam as aulas com regularidade devido às dificulades de acesso ao transporte público.
Segundo a diretora Amélia Cristina, os alunos vão a pé para a escola ou simplesmente abandonam os estudos. Fábio Levino também ouviu relatos de professores que pagavam transporte do próprio bolso para garantir a permanência dos alunos na escola, mas a iniciativa esbarrou em alguns impedimentos e não foi adiante.
De acordo com a Defensoria Pública, a defasagem entre alunos matriculados e frequentadores chega a 80%. Em todo o país, até 3% da população que vive na rua frequenta alguma escola. Para Fábio Levino, o índice de frequentadores poderia ser maior e ter impacto na redução da população de rua se houvesse mais políticas públicas que considerassem as especificidades desses alunos.
“O transporte público é uma das formas de fomento e incentivo para que essas pessoas saiam da rua. Elas já estão em extrema vulnerabilidade e não são vistas pela sociedade com bons olhos. Há, por trás, uma violência social muito grande, elas se sentem julgadas como se estivessem ali pelo insucesso delas. E a educação é um modo de mudar essa realidade.Se pelo menos parte dos que vivem nas ruas frequentarem a escola e mudarem o rumo de suas vidas, isso já agregaria e seria uma grande vitória”, afirmou Levino.
A exemplo do cadastro no Sistema Único de Saúde, em que o Ministério da Saúde editou portaria flexibilizando as exigências para garantir o acesso ao SUS de pessoas que vivem nas ruas, a Defensoria Pública entende que a liminar estimulará a edição de algum instrumento normativo regulamentando a questão no Distrito Federal, e até em nível nacional.
O DFTrans disse que não vai se manifestar sobre o assunto, pois ainda não foi comunicado oficialmente da decisão da Justiça.
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