Pré-candidata do PT diz que ataque do governador projetou seu nome na corrida sucessória ao Buriti. Como diretora do Sinpro, aponta problemas vividos pela categoria
Orlando Pontes
Ao comentar sobre a assembleia de terça-feira (22), o governador tentou politizar o movimento, ao dizer que você queria palanque para sua pré-candidatura ao GDF.
Eu lamento. Como sindicalista, me senti desrespeitada. Isso mostra a ignorância do governador com relação à história do Sinpro e da categoria. Mas a categoria percebeu qual era a intenção.
Isso te prejudicou de alguma forma?
Por incrível que pareça, eu acho, inclusive, que ele acabou me prestando um bom serviço. Primeiro, ele divulgou a pré-candidatura e chamou a atenção da categoria para qual é a posição dele, qual será o tratamento que ele dará a isso e, principalmente, chamou a atenção da sociedade para o debate da educação. Ainda que algumas pessoas tenham prestado atenção a isso, criticando o sindicato por chamar uma assembleia com uma semana de aula depois de tanto tempo com os alunos em casa, nos deu a oportunidade de contar para a sociedade de que escola estamos falando, como nesta entrevista.
O tiro saiu pela culatra?
Ele tentou tirar o foco do problema, porque o nosso papel é mostrar para a sociedade o que está faltando dentro das nossas escolas. E ele acabou nos ajudando com essa tentativa de criminalizar a política.
Então, porque eu sou sindicalista não posso me colocar na política partidária? Ele misturou as coisas, dizendo que a assembleia foi oportunismo. Basta puxar pelo histórico do sindicato para ver que é que tradição fazermos assembleia no início de ano letivo. Portanto, eu acho que o governador antecipou uma disputa que talvez nós faremos.
Será que a intenção dele é criar no DF a mesma polarização que existe nacionalmente?
Não sei. Pode ser. E ficou muito ruim para ele. Primeiro que ele antecipou o debate de greve. A única pessoa que falou em greve foi o governador. Nenhum sindicalista ou professor que fez intervenção, nenhum material nosso fala em greve.
Então, qual era a pauta?
O que nós queremos é diálogo, que o governo se sente conosco. Juntos, vamos buscar alternativas. É preciso olhar para a gestão do GDF como um todo, os movimentos que são feitos e as prioridades que o governo está adotando.
O Sinpro foi criticado por convocar uma assembleia uma semana depois da volta às aulas presenciais. Era necessário promover esse evento no momento?
É importante destacar que fazer assembleia é uma tradição, uma necessidade e obrigação de qualquer entidade classista. É assim que se mobiliza trabalhadores e trabalhadoras. É importante reunir e, de forma democrática, tomar as decisões. Quando você faz assembleia é porque tem a necessidade de um debate com a categoria.
Qual a necessidade que está tendo hoje?
Nós passamos dois anos sem assembleias presenciais. Isso, por si só, já justificaria uma assembleia. Com a volta 100% das aulas presenciais, nós também precisávamos retomar nossa rotina, que são as nossas assembleias.
E como foi essa retomada de rotina?
Enquanto estávamos no ensino remoto, muita coisa passava despercebida com as escolas fechadas. Com o retorno presencial, foi ficando muito evidente o caos nas escolas.
Qual a realidade encontrada?
Tivemos um processo seletivo de contratos temporários muito complicado, sem transparência. Desorganização total. Muita gente com larga tradição em contratos temporários foi eliminada e ficou fora. A contratação temporária precisa ocorrer. Inclusive, nós deixamos de ter alguns direitos garantidos por não termos contratos temporários suficientes. A Secretaria de Educação adotou a política de não fazer concurso e não nomear os efetivos, professores definitivos para a rede. Fechamos o ano de 2021 com 60% dos professores em sala de aula temporários.
Isto é normal?
Nunca imaginei que eu fosse viver uma situação dessa na capital do País. Há regionais que já não têm mais professores para serem contratados. Então, tudo indica que voltaremos a viver uma realidade de estudantes sem aula. Temos também a educação inclusiva, a educação integral, onde é preciso ter monitores nas escolas como auxiliares dos professores para atender os alunos que precisam de atendimento especial, os ANEE (alunos com necessidades educacionais especiais). Tem monitores concursados e a Secretaria coloca para ocupar esse espaço os educadores sociais voluntários, pessoa desempregadas que ganham R$ 30 por dia. E mesmo esses voluntários a Secretaria cortou pela metade.
Pela sua descrição, está um caos… E não falamos dos sete anos de salários congelados.
Você acha que o governo priorizou uma categoria, que são os policiais civis?
Sem dúvida, não há nenhuma justificativa para isso. Eu acho que é preciso ter um equilíbrio, e quando o governo tem esse descuido com seus servidores, na verdade está se descuidando com a população, porque nós prestamos serviço. Fica parecendo que ele está preterindo, que alguém é mais importante para a gestão pública. No caso, a polícia. E aí, nenhum problema com os trabalhadores da polícia, mas tem que ter isonomia.
Mas vem eleição em outubro. Aí o discurso dos políticos será de que educação é prioridade…
Exatamente!
Com uma candidata professora e sindicalista será que ficará no discurso e na promessa de campanha?
Não. Com certeza. E eu acho que não é só uma questão de salário, mas também de ter educação. Todos os países que evoluíram fizeram forte investimento na educação. Isso é inteligente.
Foi oportuna essa assembleia na segunda semana de aulas presenciais após dois anos de aulas remotas?
Posso garantir a todos os pais, responsáveis, mães e estudantes que o que está acontecendo dentro das escolas diariamente é um prejuízo infinitamente maior do que um dia sem aula para uma assembleia. E é importante registrar que nós sempre fizemos a reposição do dia de trabalho em que não houve aula para realizar assembleia. Tudo que estou te trazendo tanto tem prejuízos trabalhistas, nos direitos dos servidores e tem os prejuízos que vão diretamente para o aluno, na qualidade do ensino que ele está recebendo.
Na assembleia também foi falado sobre a superlotação das salas de aula…
É outra triste realidade. Não foram construídas novas escolas e tivemos 26 mil novas matrículas na rede oficial, segundo informação da própria Secretaria. Só o Guará está com cerca de 450 alunos sem escola. O quê que a Secretaria fez para solucionar, sem discutir com o sindicato?
E o que o sindicato pode fazer?
Nós temos regras para funcionamento das escolas. Historicamente, isso é discutido conosco. Não significa que a gente concorde com tudo ao final, mas tem a oportunidade de debate. Mas a Secretaria, unilateralmente, publicou a estratégia de matrícula, documento que determina se tem estudantes com deficiência, que tipo de deficiência, as turmas regulares, a educação infantil, as séries finais, iniciais, ensino médio etc. Pois bem, a Secretaria alterou tudo isso, aumentando muito o número de estudantes em cada sala em plena pandemia. Como fica o distanciamento? O que a Secretaria fez foi juntar todo mundo. Isso significa que o professor não tem as condições de trabalho e os alunos estão sendo prejudicados porque os professores vão adoecer também rapidamente.