A cada 7 minutos é registrada uma denúncia de violência contra mulheres no Brasil. O país é o quinto colocado no ranking de nações com maior número de casos de crimes contra mulheres, segundo relatórios da Organização das Nações Unidas (ONU). Muito embora hoje sejamos capazes de registrar e punir esses casos, estudos comprovam que a incidência desse tipo de violência é muito superior às situações levadas ao conhecimento da Justiça.
São comuns relatos de constrangimentos e abusos em estacionamentos de universidades e shoppings, bares e festas e no transporte público. O registro de ocorrências de situações em que mulheres são assediadas no ambiente de trabalho triplicaria esses índices.
A violência silenciosa poda trajetórias que poderiam influenciar diretamente no aumento de casos de sucesso político feminino. E a maioria das decisões que dizem respeito a questões de liberdades individuais, sendo tomadas pela maioria masculina no Parlamento, refletem muito sobre a agenda social do país, que pouco evoluiu nas questões de gênero nos últimos anos. Houve, inclusive, tentativas abertas de retração de direitos individuais, em especial de mulheres.
De acordo com dados da organização internacional União Interpalamentar, que produziu, em parceria com a ONU Mulheres, um ranking de países com participação feminina no parlamento, o Brasil ainda ocupa o 154º lugar entre 193 países, com apenas 55 cadeiras ocupadas por mulheres das 513 da Câmara e 12 das 81 do Senado. Não é de espantar que tenhamos importantes temas sendo votados em dissonância com o que esperamos de avanços.
Fazendo um recorte estratégico, temos no Distrito Federal o seguinte cenário; nenhuma governadora eleita, com exceção da atuação da vice-governadora Maria Abadia, que ocupou o governo na vacância de Joaquim Roriz; nenhuma senadora eleita desde 1989; seis deputadas federais – considerando oito cadeiras a cada legislatura. Em 2014, 351 mulheres disputaram eleições. Uma foi eleita para a Câmara Federal e cinco para a Câmara Legislativa.
Se compararmos com os dados populacionais, segundo números do PNAD – Pesquisa Nacional de Amostras por Domicílio –, o Brasil possui mais mulheres do que homens, sendo um total de 105 milhões de habitantes do sexo feminino. Mas por que não conseguimos eleger mais mulheres?
A viabilização de projetos políticos de mulheres passa pelo contexto social, bem como pela criação de condições reais de participação de mulheres no pleito.Quando não temos direito pleno às cidades, quando ocupamos uma grande parte do nosso tempo dedicado a cumprir a carga mental do dia-a-dia familiar, quando temos cinco milhões de crianças sem pai nas certidões de nascimento, como podemos esperar ocupar espaços que são tradicionalmente compostos pela elite masculina e branca do país?
O processo de violência mina a segurança e destrói projetos e concepções de mudança. Resistir e sobreviver acabam sendo as principais atividades das mulheres no país que mata oito por dia, em decorrência do feminicídio.
Em cumprimento da lei eleitoral de 1997, e a minirreforma eleitoral de 2009, que consolidaram a destinação de 30% de exigência de participação feminina nos cargos eletivos proporcionais, o Brasil conseguiu registrar 31,6% de participação feminina nas eleições municipais de 2016. Entretanto, este cenário não representa a realidade de mulheres eleitas. Segundo dados do Tribunal Superior Eleitoral, o país ainda tem uma média de 14% de presença feminina no Congresso Nacional e cerca de 10% nas assembleias estaduais.
A maioria dos partidos políticos não desenvolve um trabalho real de formação de lideranças femininas, saindo da representação tradicional do político/empresário de sucesso. A representação de mulheres na política, hoje, encontra-se afastada do processo institucionalizado; as mulheres fazem política comunitária, política de segmento, movimentos de proteção, movimentos de combate à violência, de empoderamento social, redes de apoio para mães solo, mas ainda não houve uma absorção real desse cenário pelas estruturas consolidadas de poder.
A exigência legal do percentual mínimo de participação de mulheres não garante a destinação de recursos dos fundos partidário-eleitorais para essas candidaturas. Logo, não se compara o poderio econômico e o espaço de inserções de rádio e TV frente apenas às narrativas pessoais/sociais.
O TSE, por meio de jurisprudência, já consegue identificar a existência de “candidaturas laranjas”, mas não conseguiu ainda criar mecanismos que diminuam as distâncias do desempenho pessoal versus o investimento dos partidos.
A luta por mais mulheres na política não é uma batalha contra os homens que historicamente ocupam estes lugares, mas diz muito sobre representação social. O mundo mudou e o Brasil também. Precisamos que a representação parlamentar entenda e veja com sensibilidade novos movimentos e demandas que surgem com as novas modalidades de papéis sociais.
Para citar apenas um exemplo, hoje temos 40% das famílias brasileiras chefiadas por mulheres. E estas “mães de família” ocupam o lugar que historicamente era do homem, no modelo patriarcal. As famílias mudaram, e não podem continuar sendo vistas apenas como o modelo de representação pai/mãe/filhos.
Quando sabemos do enorme número de crianças que não contam com a participação da figura paterna em sua criação, não podemos aceitar que o parlamento diga que estas novas consolidações não representam a família brasileira.
Somos representadas como minoria, quando, na verdade, somos mais da metade dos votos do país. Colocar mais mulheres na política diz muito mais sobre a colcha de retalhos que forma o povo de um país. Sobre termos homens, mulheres, trans, negros, jovens. Todos representados em situação de equidade.
O que não podemos mais aceitar é que apenas alguns segmentos estejam massivamente representados. A democracia precisa de neutralidade; o cabo de guerra nunca pode ser puxado apenas para um lado.
(*) Jornalista, secretária de Comunicação do PV-DF e pré-candidata a deputada distrital pelo partido