Concursado do Banco do Brasil, Ricardo José Ribeiro Berzoini, 61 anos, foi presidente do Sindicato dos Bancários de São Paulo e quatro vezes deputado federal pelo estado. Presidiu o PT nacional em 2005 e foi ministro da Previdência e do Trabalho de Lula. Em 2006 coordenou a campanha de reeleição do ex-presidente e chegou a ser ministro das Comunicações de Dilma em 2014. Em 2017 transferiu o domicílio eleitoral para Brasília, por onde pretende se candidatar a deputado federal em 2022. Conciliador, nesta entrevista ao Brasília Capital ele admite uma aliança com o PSB para lançar a candidatura da senadora Leila Barros ao Buriti.
Como o senhor vê, hoje, as condições do PT para as eleições de 2022? – O partido sofreu muito com os ataques por parte do Ministério Público, do Judiciário e da mídia, nos quais, por um período parte do povo acreditou. O presidente Lula ficou preso 580 dias. Várias lideranças nossas importantes sofreram perseguições. Eu acho que essa fase não está concluída e em grande parte administrada. Lula teve os seus direitos políticos e eleitorais restituídos e está dialogando com a população por meio de entrevistas e atividades na Internet, e com lideranças de vários segmentos. Então, temos uma boa expectativa de recuperação.
Essa recuperação se sustenta até a eleição ou sofrerá desgaste com os ataques que passará a sofrer? – Ataques certamente haverá. Temos que estar preparados para isso. É da política. Nós vivemos uma luta política que precisa agora ser equacionada do ponto de vista pedagógico, mostrar para o povo que Lula, o PT e seus aliados têm condição de retomar o caminho do desenvolvimento, da luta pela Saúde, pela Educação, pela Cultura. Enfim, a luta para que o Brasil possa se afirmar como um país civilizado e democrático.
Quais os principais retrocessos foram perpetrados pelos governos Temer e Bolsonaro após o impeachment de Dilma? – Tivemos as reformas trabalhista e previdenciária, e a Emenda Constitucional do teto de gastos, que engessa o orçamento e provocou desemprego, fome, exclusão social, miséria, redução dos orçamentos de Saúde e Educação. O Brasil perdeu qualquer perspectiva de ter política de ciência e tecnologia. Portanto, o conjunto de retrocessos é enorme. Mas, é fundamental destacar o desemprego, o aumento da miséria e o retorno da fome ao nosso país, que provocou um grave retrocesso social para o nosso povo.
E ainda tivemos o agravante da pandemia… – É. A CPI do Senado vai demonstrar os erros cometidos pelo governo. O Brasil caminha para as 500 mil mortes, muitas delas evitáveis. Pessoas morreram por falta de oxigênio, por tratamentos criminosos como a Cloroquina, pela falta de vacina em tempo hábil, e pelo estímulo que Bolsonaro fez às aglomerações, criticando o uso de máscara. Ou seja, o governo cometeu crimes contra a saúde da população e agora está sendo investigado pela CPI, que, eu acredito, chegará a um bom relatório, de maneira criteriosa e democrática.
Para Lula viabilizar a candidatura a presidente, o PT terá de abrir mão de concorrer em alguns estados. Como o senhor vê as composições estaduais, particularmente em Brasília? – Eu acho que o PT melhorou sua situação, mas ainda vai enfrentar grandes dificuldades. Não podemos ser otimistas somente pela recuperação dos direitos políticos do Lula. É preciso ampliar o nosso diálogo com a população, inclusive para combater essa impressão de uma parte dela que acredita naquilo que foi veiculado com base da Lava-Jato. Além disso, a estrutura partidária sofreu muito nesse período. Então, independentemente da situação específica do PT, é necessário diálogo amplo, com base num programa político. Aqui no DF, o PT tem que dialogar com toda a esquerda e conversar com pessoas que tenham compromisso com a Saúde, com a Educação, com transparência e principalmente com um projeto para requalificar a questão urbanística de Brasília. Nós acreditamos que é possível conversar amplamente, sabendo que tanto da parte dos potenciais aliados, quanto da nossa parte, há opiniões que serão cotejadas para produzir uma aliança possível.
O senhor foi quatro vezes deputado por São Paulo, mas é mineiro e tem um traço de mineirice que é o de ser conciliador. Algumas pessoas o comparam ao ex-deputado Sigmaringa Seixas. Como vê isso? – É um orgulho que alguém me compare ao grande amigo Sigmaringa. Ele foi uma pessoa capaz de renunciar a seus projetos pessoais para ajudar na articulação política e o Lula. Meu perfil é um pouco diferente do ponto de vista das trajetórias. Sig foi um grande advogado. Eu fui sindicalista e parlamentar, além de ministro. De qualquer maneira, nós achamos que é preciso, nessas eleições, construir referências importantes de disputas de espaços junto à classe média e à população mais carente do DF. Por isso, estou consultando companheiros para uma eventual candidatura. Mas ainda é uma conversa inicial. Espero poder evoluir, porque não tenho nenhuma pretensão pessoal. Minha única pretensão é ajudar o País e o partido a se expressar de maneira correta nas urnas.
O senhor seria candidato a deputado federal pelo DF? – Provavelmente. Vai depender dos apoiadores. Não tenho ainda nenhuma conversa estruturada. Conversei com alguns companheiros que manifestaram simpatia por eu ser candidato a federal. A companheira Erika Kokay sairia candidata ao Senado e o PT lutaria para manter a representação na Câmara. Não apenas com minha candidatura. Temos que buscar 8, 10, 12 candidatos que tenham capacidade de juntar votos para conquistar uma ou duas vagas na Câmara Federal.
Entre as conversas do Lula, haveria acordos para o PT não concorrer aos governos de Pernambuco e do DF, apoiando nomes do PSB. Aqui, seria a senadora Leila Barros? – Eu dirigi a negociação de composições de alianças em 2006 e ajudei em 2010. É um jogo complexo. Em Pernambuco, temos uma candidata favorita, que é a Marilia Arraes. Ela está na frente nas pesquisas e já foi sacrificada em 2018 pela mesma composição. Mas tem que ser construído. Aqui no DF, é importante conversar com a senadora Leila e com o PSB, com o PCdoB, com o PDT, com o PSol e com outros partidos que queiram dialogar. Ainda está muito longe do momento decisório, mas não temos nenhum tipo de obstáculo para uma conversa. Achamos que é importante fazer a conversa com o PSB nacional e local.
O deputado Professor Israel, que se reuniu com Lula sem autorização do PV, estaria migrando para o Solidariedade. O partido do Paulinho da Força, que integra o Centrão, pode se aliar ao PT? – Pode ser. Não é fácil porque também o Solidariedade tem muitas diferenças internas. Mas nós temos a obrigação de conversar. O Israel é um parlamentar jovem de grande futuro e pode ser também um aliado. É preciso ter paciência, respeito, entender as razões dos outros e tentar construir. O PT está apenas começando esse processo. O próprio presidente Lula sabe que as alianças são fechadas nos últimos dias. Eu costumava usar uma frase quando era presidente do PT: “Quem tiver muita ansiedade sai da mesa”. A conversa é longa e nem tudo dá certo. Algumas coisas são mais fáceis de construir. Outras mais difíceis.
Qual seria a sua plataforma como deputado federal por Brasília? – Mudei meu domicílio eleitoral para DF em 2017. A tarefa do deputado federal, além de defender os interesses do eleitorado que ele representa do ponto de vista territorial, é defender as grandes teses nacionais. No caso do DF, precisamos investir pesadamente no transporte, investimento que não se faz só com o orçamento do DF. É preciso ter negociação com o governo federal para requalificar todo o processo de mobilidade urbana. Inclusive, eu defendo uma tese bastante polêmica, que é construir o financiamento do transporte com tributos, e não com tarifa, porque isso reforça a desigualdade: quanto mais longe a pessoa mora, mais paga. E quem mora mais longe quase sempre são os mais pobres. Defendo também que o DF tem que ter uma rede de metrô à altura da importância da capital. Então, precisamos de financiamento do BNDES, do Ministério da infraestrutura. Além disso, acreditamos que o próprio Fundo Constitucional precisa ser rediscutido. É preciso pensar no seu crescimento para o futuro, porque uma capital suporta muitas obrigações que não são típicas de um estado ou de uma cidade comum. Então, é preciso trabalhar também esse debate no Congresso Nacional. É fundamental disputar no bolo orçamentário nacional um atendimento melhor para capital do país.
Nós falamos das possibilidades de coligações à esquerda. Mas a direita local também já se articula. A deputada Flávia Arruda foi recebida esta semana pelo governador Ibaneis. Os dois podem unir as forças bolsonaristas? – Primeiro, quero deixar claro que o PT não toma nenhuma decisão sobre aliança. Quem vai decidir é a militância do PT, obviamente o sob o comando da direção nacional, que faz a execução da política de alianças nas 27 unidades da Federação. O PT pode ter aliança com PSB e com outros partidos, mas também pode ter candidatura própria ao GDF. Dependerá da decisão dos militantes do PT. Segundo, sobre a questão da aliança do outro lado, que está se constituindo, eu vejo duas candidaturas se desenhando: uma do senador Izalci Lucas, que tenta articular um bloco de oposição, e outra do Ibaneis.
O governador seria o nome mais forte no momento? – Ibaneis não sobrevive a um debate político sobre o que ele prometeu na campanha e sobre o que está fazendo no governo. O DF tem uma população parecida, em termos numéricos, com a do Piauí. Só que a taxa de mortalidade no Piauí pela pandemia é 40% menor. Enquanto o orçamento do DF é superior a R$ 40 bilhões, o do Piauí é de R$ 16 bilhões. Como ele vai explicar isso? E como explicar que os professores que ele prometeu que iriam ganhar igual a juiz, estão sem reajuste e ainda tiveram aumento da contribuição previdenciária, que diminuiu o salário líquido deles. Como é que explica a questão da Saúde, que tem a proposta de CPI da Pandemia na Câmara Legislativa e a base aliada retirou quórum para não enfrentar essa questão. Então, eu acho que é um cenário ainda em desenho. O Ibaneis vai tentar puxar o máximo de apoio usando a condição de situação. O Izalci vai tentar construir o seu bloco e a esquerda tem todas as possibilidades de construir um bloco com bastante identidade programática e força política.