Rasguei a minha fantasia
O meu palhaço
Cheio de laço e balão
Rasguei a minha fantasia
Guardei os guizos no meu coração
Lamartine Babo, 1932
Gutemberg Fialho
Virou meme nas redes a declaração do secretário do DF Legal sobre o uso de fantasias de carnaval em bares e outros estabelecimentos do Distrito Federal. Segundo ele, “é difícil conter um público fantasiado depois de ingerir bebida alcoólica. Certamente, irão para as ruas ou para pistas de dança, gerando uma série de aglomerações”.
A restrição às fantasias se refere ao Decreto 42.898/21, de 6 de janeiro, que proibiu eventos carnavalescos – medida acertada diante do estágio da pandemia que enfrentamos, com vistas a não criar circunstâncias para aumento da disseminação do coronavírus. Depois da declaração sobre a periculosidade dos indivíduos fantasiados, o GDF teve que fazer remendo sobre o que é o carnaval na interpretação do governo.
A declaração do secretário seria um prato cheio para o Pacotão – que há dois anos sem sair, nos deixa saudosos. O fato, no entanto, é que o comando do DF Legal se perde em discussões esdrúxulas, em vez de simplesmente enfatizar que as pessoas devem evitar aglomerações e que devem manter os cuidados sanitários em toda e qualquer circunstância, pois a pandemia não acabou. Simples assim.
A proibição de fantasias, no entanto, merece maior discussão. É uma medida mais acertada para outra área do governo: a Comunicação, na qual o marketing extrapola os limites da divulgação de ações e descamba quase no surrealismo.
As inaugurações de prédios de Unidades de Pronto Atendimento e de Unidades Básicas de Saúde (sem profissionais, equipamentos e insumos) e entregas de reformas de escolas (sem cadeiras), são como os carros alegóricos dos desfiles de carnaval: uma fachada espetacular, brilhante, pirotécnica até, mas oca e, mesmo quando motorizada com um carrinho elétrico do VEM DF, dependente de um pequeno grupo de pessoas – a “ala da força” –, que empurra ou, no mínimo, direciona o carro alegórico para ele não tombar na avenida.
As explicações do GDF também são outro tópico que merecem atenção. Nossos foliões interiores, esses que vão deixar a fantasia e a purpurina no armário por mais um tempo, podem tocar a vida sem a explicação do que nossos dignatários entendem por evento carnavalesco. Mas gostaríamos muito que fossem explicadas e resolvidas de uma vez por todas as denúncias e suspeitas de corrupção e desvio na área da Saúde.
Enfim, a fantasia a ser proibida não é a do cidadão, que almeja esperançoso pelo fim da pandemia e vai fazer o sacrifício de se conter mais este ano. Camuflar com purpurina e lantejoulas a realidade do descaso e dos desmandos nos serviços públicos oferecidos à população, em especial o de Saúde, é que tem de ser proibido.