Realiza dezenas de blitz todo mês, numa verdadeira operação de guerra contra os contribuintes, e não promove educação.
Foto: Tony Winston/Agência Brasília
De
1º de janeiro a 29 de agosto deste ano, o Departamento de Trânsito do Distrito
Federal (Detran-DF) aplicou 1.568.536 multas, a maioria por excesso de
velocidade. Apenas nos oito primeiros meses do ano a autarquia arrecadou R$ R$
88.624.255,85 com penalizações a condutores que infringiram as normas do
trânsito. A infração mais comum é por
excesso de velocidade. A segunda multa mais aplicada é por estacionamento em
vagas irregulares.
Nos
Balanços de Receitas e Despesas divulgados no seu site, o Detran mostra que
arrecada, anualmente, só de multas, mas de R$ 100 milhões. Somando-se a outras
taxas cobradas por serviços, como licenciamento, emplacamento, emissões de
boletos e declarações, a receita da autarquia chega a quase meio bilhão ao ano.
Nos
últimos três anos, a fiscalização do Detran aplicou 7,3 milhões de multas.
Foram 2.967.968, em 2017; 2.838.893, em 2018; e 1.568.536 neste ano. Isso gerou
uma arrecadação de R$ de R$ 130.900.822,28, em 2017, e de R$ 116.696.567,48, em
2018. Este ano, de janeiro a agosto, o Detran já embolsou R$ 88.624.255,85 em
multas.
O balanço financeiro do Departamento mostra que, em 2018, o órgão arrecadou com serviços, multas e valor ordinário não vinculado quase meio bilhão. Com os serviços faturou R$ 301.682.847,05; com as multas de trânsito, R$ 116.696.567,48; e com o valor ordinário não vinculado R$ 78.497.453,04. Total da receita: R$ 496.876.867,57.
Desse
valor, o Detran gastou R$ 408.904.536,71 com suas despesas. Portanto, sobraram
R$ 87.972.330,86, que não aparecem em lugar nenhum das planilhas publicadas em
seu site. “O valor ordinário não vinculado é um valor de multa que tem de ser
desvinculado da receita, conforme a lei federal da Desvinculação de Receita da
União (DRU). Existe a DRU, no âmbito federal, e a lei estadual denominada
Desvinculação das Receitas dos Estados e Municípios (Drem). Esse valor fica
reservado para que o GDF o utilize da forma que ele quiser. Caso não utilize, o
Detran usa”, explicou a Assessoria de Comunicação da autarquia.
Contribuinte não tem retorno
O problema da falta de estacionamento no Setor Comercial Sul se arrasta há anos.
Foto: Rafaela Felicciano/Metrópoles
\”Uma
fábrica de multas, cujo valor recolhido não se reverte em favor da cidade e do
contribuinte\”. A avaliação é da vendedora Marinalva Barbosa, que trabalha
no Setor Comercial Sul de Brasília. \”Todo dia tenho de deixar o carro em
qualquer canto para ir trabalhar e quase toda semana sou premiada com uma multa
por estacionamento irregular”, protesta ela.
Segundo
a comerciária, “tem dia que o Detran resolve fazer uma espécie de maratona para
coletar o máximo de multas possível entre as pessoas que trabalham no SCS e
precisam deixar o carro estacionado. A fiscalização traz um grande aparato,
inclusive com guinchos, para rebocar os carros cujos proprietários não estejam
por perto”.
O
administrador Júlio Correia, que começou a trabalhar no Plano Piloto em abril
deste ano, já recebeu seis multas neste período, cinco das quais por
estacionamento proibido. “O governo não oferece solução para o problema da
mobilidade do local e se aproveita disso para multar as pessoas que precisam
estar por lá o dia todo. Quando as viaturas do Detran aparecem, todos se sentem
achacados e extorquidos pelo poder público\”, desabafa.
Diária
de depósito – Mas não são apenas as multas que enchem os cofres do Detran. Além
delas, autarquia cobra várias outras
taxas. Entre elas, uma espécie de diária para retirada de veículos recolhidos
ao depósito durante as operações. Essa despesa nunca fica abaixo dos R$ 1 mil.
“Muitas
vezes a gente não tem o dinheiro e mesmo assim tem de pagar o mais rápido
possível porque a dívida aumenta todo dia”, reclama Marinalva. “O pior é que a
gente não vê resultado para a cidade dessa coleta exorbitante” emenda.
Júlio
Correia lembra que todos os serviços oferecidos pelo Detran são taxados. “Nem
parece um órgão público e sim uma empresa privada de fazer dinheiro fácil. Por
isso que as pessoas comparam o Detran a uma indústria de multas\”,
completa.
Asfalto e sinalização precários
Em
2017, o órgão arrecadou R$ 474.300.209,19 e, a despesa, R$ 411.048.142,60. Só
de serviços cobrados foram R$ 343.399.386,91. As multas naquele ano resultaram
num total de R$ 130.900.822,28. Este ano, 2019, já arrecadou, em serviços (até
16 de agosto), R$ 226.632.033,94. E a Drem já acumula R$ 13 milhões. Do total
da receita, foram gastos, até agora, R$ 231.792.941,57.
“O
problema é que a gente não vê o resultado desses valores revertido em benefício
do contribuinte. O asfalto em vários lugares do DF é completamente deteriorado,
causando avarias nos veículos e provocando acidentes; a sinalização nas vias é
precária; e não se vê campanhas permanentes de educação no trânsito. O que a
gente vê é um monte de viaturas e agentes arrogantes multando todo mundo de
forma exorbitante e aleatória”, disse o funcionário público, José Macedo.
Morador
de Vicente Pires, ele diz que “o GDF e o Detran deveriam ter vergonha de entrar
em Vicente Pires para multar veículos. A cidade, em termos de infraestrutura de
trânsito, é uma negação e chega a ser um pesadelo para os moradores”.
Ibaneis quer Zona Verde
O
governador Ibaneis Rocha (MDB) pretende implementar o programa Zona Verde, com
estacionamentos rotativos nas áreas centrais de Brasília. A promessa é a de que
o novo sistema desafogue o trânsito. “A Zona Verde pode melhorar. Mas, não
entendo por que existem tantas vagas para táxis em locais de estacionamento
precário”, exemplifica Marinalva. Ela diz que os taxistas aguardam seus
clientes dentro do carro ou perto deles. Então, para quê vaga reservada para os
táxis?”, questiona.
O
diretor do Detran Alírio Neto se comprometeu, quando assumiu o cargo, em maio
deste ano, a acabar com a chamada “indústria da multa”. Uma das propostas de
Alírio é bonificar os bons motoristas, deixando de cobrar por autuações leves e
médias, punindo apenas com advertências educativas aqueles que não foram
multados no período de um ano.
DER e PM também multam
Além
do Detran, os condutores do DF são fiscalizados pela Polícia Militar (PM) e
pelo Departamento de Estradas e Rodagens (DER). Juntos, os três órgãos de
controle de trânsito aplicaram mais de 1,25 milhão de multas no primeiro
semestre de 2019. Esse número corresponde, praticamente, a sete mil multas
diárias. A maior incidência é dirigir acima da velocidade.