Gutemberg Fialho (*)
Nasci numa pequena cidade do interior da Paraíba, onde todos frequentávamos escola pública. Depois, estudei numa universidade pública. Em uma comunidade pequena como a nossa, as diferenças entre as pessoas eram assimiladas de forma mais tranquila do que nas discussões identitárias que vemos hoje num Brasil mais urbano e cheio de divisões.
Me formei médico e ingressei na Fundação Hospital do Distrito Federal, que foi extinta e incorporada pela Secretaria de Saúde. Minha experiência no Sistema Único de Saúde também foi, como diriam hoje, inclusiva. O SUS foi elaborado de forma a atender todos os que estavam excluídos da possibilidade de ter assistência pública em saúde, sem questionamentos sobre a que grupo qualquer cidadão pertença.
Sabemos que não houve os investimentos necessários, desde sua criação, para que o SUS chegasse efetivamente a todos os cantos do País, e mesmo na grandes cidades, a oferta e até o modelo de prestação de assistência tem que ser revisto, dando-se maior ênfase à atenção primária à saúde, sem descuidar da atenção secundária e terciária. Mas está lá na gênese dele o universalismo, o humanismo, o acolhimento indistinto de todo cidadão.
Hoje, a sociedade parece cada vez mais segmentada e em atrito. Programas de inclusão são criados, mas mesmo os grupos identitários têm suas estratificações: uns mais e outros menos favorecidos. E os menos favorecidos são sempre os que encontram maiores dificuldades. Por isso, acreditamos que as políticas públicas de inclusão devem ter como foco o cidadão em vulnerabilidade, independentemente do grupo identitário do qual faz parte.
No caso da oferta de educação superior, por exemplo, permanece um gargalo: e depois da faculdade? Tenho visto muita gente com diploma de curso superior ocupando postos de trabalho que exigem bem menos qualificação, porque simplesmente não encontra colocação para atuar na sua área de formação.
Isso ocorre tanto pela questão de crises econômicas quanto pelas desigualdades regionais. Tanto as vagas de emprego quanto as vagas nos cursos superiores estão concentradas em bolsões de maior prosperidade. Mas a oferta de vagas e os diplomas adquiridos superam a oferta de postos de trabalho nas áreas de formação.
Nesse cenário, fica claro que, além de promover a capacitação do cidadão por meio da educação, é necessário dar incentivos ao setor produtivo para que haja maior geração de empregos e, urgentemente, criar políticas fortes e continuadas de desenvolvimento regional, com maior distribuição da riqueza do Brasil ao longo de seu território.
O filósofo Immanuel Kant definiu que o homem é aquilo que a educação faz dele. Mas o que dizer ao homem educado que não tem acesso a um trabalho no qual aplique aquilo que a educação lhe proporcionou? Nesse aspecto, a promoção do desenvolvimento econômico do País, o incentivo ao setor produtivo com foco na geração de postos de trabalho qualificados, mais do que uma política econômica, constitui uma política social necessária e urgente.
Um processo inclusivo, para ser completo, não pode se limitar a tirar o cidadão de sua situação original de fome, falta de acesso à educação ou à saúde. É preciso dar a esse contingente os meios para que aquele passado não seja uma sombra sempre presente e ameaçadora. O caminho é incentivar o setor produtivo a gerar mais empregos, para que cada cidadão tenha a possibilidade de galgar o padrão de vida que almeja.
(*) Presidente do SindMédico-DF