Au, au, au. Hi-ho hi-ho.
Miau, miau, miau. Cocorocó.
O animal é tão bacana
Mas também não é nenhum banana.
Au, au, au. Hi-ho hi-ho.
Miau, miau, miau. Cocorocó.
Quando a porca torce o rabo
Pode ser o diabo
E ora vejam só.
Au, au, au. Cocorocó.
Era uma vez
(E é ainda)
certo país
(E é ainda)
Onde os animais
Eram tratados como bestas
(São ainda, são ainda)
Trecho da música Bicharada, de Chico Buarque, no musical Saltimbancos
Imagine um país, onde 475 milhões de habitantes morrem todos os anos por atropelamento (1,3 milhão de mortes por dia). Esse país tem nome: Brasil Animal. E essas estatísticas se referem apenas a animais silvestres vertebrados. Não computam invertebrados – abelhas, borboletas, aranhas…
A capital do Brasil Animal não foge à regra. De 2010 a 2015, 5,3 mil animais silvestres foram atropelados em Brasília. Paradoxalmente, os animais viram vítimas das áreas contíguas às unidades de conservação, onde deveriam estar mais seguros.
É nas rodovias que circundam essas áreas que acontece o maior número de atropelamentos, aponta Tathiana Bagatini, em sua dissertação de Mestrado em Ecologia, na UnB, de 2006.
Porém, dezessete anos depois, a realidade não mudou. Prova disso são as antas que se beneficiam do corredor ecológico proporcionado pela proximidade entre a Reserva Biológica da Contagem, o Parque Nacional e a Granja do Torto. Ali, o risco é a rodovia DF-001, a Estrada Parque Contorno (EPCT).
As antas, cuja condição de sobrevivência no Cerrado é de “ameaçada”, categoria mais grave, não dispõem de passagens seguras e recursos que façam motoristas reduzirem a velocidade.
“Quatorze antas foram atropeladas nos últimos quatro anos naquele trecho, sendo duas delas fêmeas gravidas”, conta Claudia Rocha Campos, bióloga e analista ambiental do Instituto Chico Mendes (ICMBio).
Segundo ela, aquele seria um local muito importante para instalação de redutores de velocidade, sinalização de “patadestre”, roçagem das laterais das vias, melhoria na iluminação, conscientização dos motoristas de que é uma área de constante travessia de animais.
Capital Moto Week
Para jogar luz sobre essa realidade e alertar os milhares de motociclistas participantes do Capital Moto Week, servidores, brigadistas do ICMBio, moradores e membros da ONG Patrulha Ecológica pintaram faixas de patadestre na via de acesso à Granja do Torto, onde acontece o evento.
No lugar das tradicionais barras brancas paralelas, o asfalto ficou demarcado com desenhos de patas de mamíferos na via onde já foram registrados diversos atropelamentos de antas.
Criativo, o protesto também é um puxão de orelha no DNIT, no DER-DF, no Detran e nas administrações regionais, no sentido de que se faz necessário instalar passagens de fauna (manilhas subterrâneas por onde os animais maiores podem transitar, ou pontes aéreas de corda, para animais menores, como macacos e gambás), lombadas, pardais eletrônicos, redução da velocidade máxima na DF-001. “Há muito tempo demandamos isso ao DER, mas sem retorno”, salienta Cláudia.
Resposta – O DER contesta e diz que investe na implantação de medidas de proteção à fauna nas rodovias próximas a Unidades de Conservação e que transpõem corredores ecológicos.
“São passagens de mamíferos e répteis, sinalização indicativa da proximidade com áreas de preservação ambiental e presença de animais; além de controladores de velocidade, ondulações e sonorizadores”.
A autarquia assegura, ainda, que implantou 96 placas indicativas de travessia animal e passagens subterrâneas e aéreas na DF-001 e em outras seis rodovias distritais, e que há a previsão de pelo menos cinco novas passagens na DF-001 e outra na DF-290.
Via dupla, risco dobrado
As vias duplas, como as Estradas Parques e as BRs que cruzam o DF são os grandes tormentos dos animais. É nas imediações delas que os acidentes são mais comuns. “Percebemos que os atropelamentos ocorrem com mais frequência em locais onde há maior tráfego e onde o espaço para o animal percorrer é maior”, explicou à Agência Brasília, Rodrigo Santos, biólogo e analista de Atividades de Meio Ambiente, do Instituto Brasília Ambiental.
Rodrigo se debruçou nos dados do Projeto Rodofauna, do Ibram, para sua tese de Doutorado. Infelizmente, o Rodofauna foi descontinuado pelo GDF e hoje não há dados precisos sobre a morte de animais silvestres no DF.
Nesses locais, a simples colocação de placas de advertência não tem surtido efeito, pois os veículos continuam trafegando em velocidade maior do que a permitida e muitas placas passam boa parte do tempo encobertas pela vegetação”, constatou Tathiana Bagatini, que estimou em 992 o número de animais silvestres anualmente atropelados nas imediações da Estação Ecológica Águas Emendadas, na saída Norte do DF.
Ali, as principais vítimas foram os canídeos, como o lobo-guará, listado como “vulnerável à extinção”, e a raposa-do-campo, espécies que têm apresentado queda na densidade populacional no DF.
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