Os ministros do Supremo Tribunal Federal (STF) Edson Fachin e Luís Roberto Barroso declararam, nesta quinta-feira, que a criminalização do porte de maconha para uso pessoal é inconstitucional. Eles foram votaram após a retomada do julgamento, suspenso desde 20 de agosto, quando Fachin pediu vista do processo. No dia, o relator do caso, Gilmar Mendes, proferiu voto a favor da descriminalização do porte para consumo de todas as drogas. O recurso em questão trata da constitucionalidade do artigo 28 da Lei de Drogas – que considera criminosa a pessoa que e “adquirir, guardar, tiver em depósito, transportar ou trouxer consigo, para consumo pessoal, drogas sem autorização ou em desacordo com determinação legal”. No entanto, Fachin e Barroso decidiram se ater apenas ao porte de maconha em seus votos. O julgamento foi novamente suspenso no fim da tarde, depois de o ministro Teori Zavascki pedir vista.
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Fachin iniciou a sua argumentação adiantando que não há “resposta perfeita” para a questão e disse que estabeleceu diálogo com autoridades do Executivo e Legislativo, além do médico Drauzio Varella e do jurista Luís Greco, para elaborar o seu voto. O ministro defendeu que o Congresso deve votar lei que permita distinguir usuários de traficantes, definindo parâmetros para cada droga. Enquanto o Legislativo não tratar do tema, porém, o Judiciário deve preencher esse vazio, argumentou.
Em seu voto, o ministro fez ressalvas em relação aos efeitos das drogas, afirmando que “a dependência é o calabouço da liberdade mantida em cárcere privado pelo traficante”.
– É preciso deixar nítido que o consumo de drogas pode acarretar danos físicos e psíquicos, e eventualmente até a morte de quem consome – disse, acrescentando que outra consequência “é o cometimento de delitos para manter o vício”.
Embora a legislação atual não preveja pena de prisão, uma pessoa sem antecedentes condenada por posse para uso perde a condição de réu primário. No recurso que está em votação, a Defensoria Pública do Estado de São Paulo alega que o porte de substâncias ilícitas para consumo próprio é protegida pelo direito constitucional à intimidade.
Depois da argumentação de Fachin, Gilmar Mendes, pediu a palavra para falar sobre divergências entre seu voto – que tratou das drogas em geral, e não apenas da maconha – e o do ministro. O relator fez também uma correção ao seu próprio voto, afastando a sanção de prestação de serviços à comunidade como punição para usuários.
Ao proferir o seu voto, no mês passado, Mendes sustentou que a criminalização da posse de drogas para consumo pessoal afeta “o direito ao livre desenvolvimento da personalidade” e restringe a garantia da intimidade e da vida privada. O relator defendeu, então, que as consequêncas penais do porte para uso devem ser substituídas por medidas de natureza civil e administrativa.
Terceiro a votar, Barroso citou a superlotação do sistema carcerário e a discriminação de usuários pobres em sua argumentação. Segundo o ministro, os custos de criminalizar drogas são mais altos que os benefícios dessa política de guerra às substâncias ilícitas:
– Quem defende a criminalização evoca como valor a saúde pública, que, de longe, virou elemento secundário na política de criminalização, porque ela é preterida pela política de segurança pública e de aplicação da lei penal. É uma política de repressão que consome cada vez mais recursos que não vão para tratamento e educação preventiva – disse, citando em experiências estrangeiras, com a ressalva de que o país precisa olhar a questão por uma \”perspectiva brasileira\”.
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O respeito à intimidade e vida privada e à privacidade foi um dos argumentos jurídicos usados pelo ministro. Barroso defendeu que a Corte tem o dever de estabelecer critérios objetivos para diferenciar usuários e traficantes, propondo que o limite de 25 gramas para usuários e seis plantas fêmeas, no caso de cultivadores. Segundo ele, isso evitaria que jovens pobres e vulneráveis sejam sempre enquadrados como traficantes enquanto o Congresso não trata do assunto.
RECURSO PARTIU DE CASO DE PRESIDIÁRIO
A discussão sobre a criminalização do porte de drogas para uso pessoal chegou ao tribunal a partir do recurso de um presidiário flagrado na cela com três gramas de maconha em julho de 2009. Ele foi condenado a prestar serviço comunitário por dois meses. A Defensoria Pública, que assumiu a causa, contesta a constitucionalidade da Lei de Drogas. A decisão do STF será aplicada em processos semelhantes. Existem hoje ao menos 248 ações desse tipo paralisadas em todo o país, aguardando a posição do Supremo.
Para a Defensoria Pública, o porte para uso de entorpecentes não produz nenhuma lesão à sociedade ou à saúde pública, apenas à saúde pessoal do usuário. O Ministério Público insiste na condenação do presidiário. Argumenta que quem traz droga consigo contribui para a propagação no vício no meio social. O julgamento começou com a sustentação oral do procurador-geral da República, Rodrigo Janot, da Defensoria Pública e de onze “amici curiae” – ou seja, entidades interessadas na causa que se inscreveram formalmente no processo.
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