Quando faltava um mês para o início da Copa do Mundo, a revista alemã “Der Spiegel” publicou uma edição que trazia na capa uma Brazuca pegando fogo e cruzando o céu da Baía de Guanabara. Era um alerta explícito sobre os riscos que rondavam o Mundial. Dali em diante, muitas outras publicações — nacionais e internacionais — adotaram a mesma linha pessimista, apontando falhas em estádios, aeroportos e esquemas de segurança.
- Advertisement -
Agora, duas semanas após o início da competição, o tom mudou. Do pequeno “El Nuevo Día”, jornal que circula na província venezuelana de Falcón, ao gigante “The New York Times”, todos parecem convencidos do sucesso da Copa no Brasil. As matérias sobre problemas deram espaço à cobertura de uma verdadeira festa, exibindo provas de que o país do futebol está realmente sendo capaz de sediar o maior evento esportivo do mundo.
Nas 12 cidades-sede, o clima é de comemoração. Tanto os jornalistas quanto os turistas que nelas estão dão depoimentos nesse sentido, nos textos que seguem abaixo.
A convite do GLOBO, cientistas políticos e sociólogos analisaram o momento. Felipe Borba, professor da Universidade do Rio (UniRio) e pesquisador do Instituto de Estudos Sociais e Políticos da Universidade do Estado do Rio de Janeiro (Iesp/Uerj), confirma a sensação de que os medos e as dificuldades alardeados ficaram para trás.
— Não tivemos caos nos aeroportos, os estádios ficaram prontos, os turistas vieram e estão demonstrando satisfação com os serviços. Sequer as manifestações se repetiram — destaca ele. — Os problemas que existem, como falta de comida nos estádios e filas, são culpa da Fifa, que administra esses lugares e é responsável por esses serviços.
Borba ressalta que “é claro” que a mobilidade urbana poderia ser melhor, que o vaivém dos estádios “nem sempre é ideal”, mas não sente que isso tenha comprometido a organização da Copa do Mundo.
Cláudio Couto, professor da Fundação Getúlio Vargas de São Paulo, diz que o que o país presencia, agora, é a sensação de que o pessimismo em torno do evento foi “exagerado”:
— Ele não se realizou, e essa percepção gerou alívio, sentimento que resulta nesse clima mais relaxado e festivo que se vê agora.
Para Couto, já circula até mesmo um “sentimento de gratificação pelo que foi feito”:
- Advertisement -
— Sempre há problemas em eventos dessa magnitude, mas parece que a Copa terá um saldo positivo para o país.
BELO HORIZONTE
‘É uma gente amável, hospitaleira e alegre’
Jornalistas e torcedores estrangeiros estão satisfeitos com Belo Horizonte. Apresentador da CN23, em Buenos Aires, Pablo Alonso se diz admirado com a receptividade do brasileiro.
— É uma gente muito amável, hospitaleira e alegre — afirmou Alonso, que só não aprovou os preços cobrados no Mineirão. — Paguei R$ 600 pelo ingresso. Lá , a cerveja custa R$ 10 e o refrigerante, R$ 8. A festa da Fifa é para quem tem dinheiro.
Os torcedores belgas Marc e Stephan Peerans ficaram três dias na capital mineira.
— Antes de vir pra cá, recebemos vários alertas para tomar cuidado com assaltos e violência. Mas até agora está tudo maravilhoso. As pessoas são muito atenciosas e educadas — disse Marc.
Já para Álvaro Ceciliano, da Costa Rica, o maior destaque da cidade foi a organização:
— Consegui me locomover sem problema.
BRASÍLIA
‘O ambiente é maravilhoso, o país para na hora dos jogos’
A capital cujo traçado não privilegia pedestres ganhou um “calçadão” na Copa. Na rota do estádio Mané Garrincha, um shopping center e a praça de alimentação da Torre de TV, atração turística da cidade, viraram ponto de encontro antes e depois dos jogos.
Foi assim anteontem, quando a seleção brasileira goleou a de Camarões. O estudante de engenharia colombiano Mario Rojas recorreu à “arquibancada” dentro do shopping para ver o jogo:
— O ambiente daqui é maravilhoso, porque o país inteiro para na hora dos jogos.
O shopping tornou-se destino até de quem não planejou fazer uma parada técnica lá antes de ir para o Mané Garrincha. Um grupo de paulistas aceitou carona de um brasiliense que ia para o shopping.
— Hospitalidade nota mil dos brasilienses. Se não fosse ele, estaríamos agora debaixo do sol na porta do estádio — afirmou a paulista Maria Inês Moane.
CURITIBA
‘Mundial do Brasil está melhor do que a última Eurocopa’
Há alguns dias, o jornalista venezuelano Oscar Gonzales enviou ao pequeno “El Nuevo Día” uma reportagem em que se mostrava surpreso com a organização da Copa do Brasil.
— Só se falava em violência, em atrasos nas obras, em problemas e protestos. O que vi em São Paulo, Porto Alegre e aqui em Curitiba é uma festa muito alegre e bem organizada.
Vestido de toureiro, o espanhol Pablo Hernandes curte o campeonato ao lado dos amigos Juan Hochorán e Miguel Ibañez, e os três afirmam que o Mundial está “melhor do que a última Eurocopa”, realizada em 2012 por Polônia e Ucrânia.
— Não há estádios inacabados, ruas de terra em volta dos estádios, como na Polônia. Está muito diferente do que ouvíamos na Espanha —– diz Hernandes.
— Fui à Copa de 2006, na Alemanha. É claro que o transporte lá é melhor. Mas a organização do Mundial está excelente. Há um cuidado muito grande com o torcedor — completou Ibañez.
SALVADOR E CUIABÁ
‘Extraordinárias, as pessoas ajudam muito os visitantes’
O Brasil não deve nada aos outros países que serviram como sede da competição. É o que afirma Simon Hart, que acompanha os jogos em Salvador para o jornal inglês “The Independent”.
— Aqui, a experiência tem sido bastante agradável. Tudo me parece organizado, funcionando bem. E a Fonte Nova é linda.
O jornalista colombiano Jorge Ceballos, que escreve de Cuiabá para um site esportivo de Cartagena, concorda:
— Está tudo absolutamente perfeito. A organização é maravilhosa, as pessoas são extraordinárias e ajudam muito os visitantes.
Mais crítico, o fotógrafo Watara Sekita, do jornal “Asahi Shimbun\”, de Tóquio, disse que a organização na Copa do Japão e Coreia foi melhor.
— Furtaram a câmera de um colega meu no ônibus da imprensa, em Natal.
MANAUS
‘A organização aqui foi muito boa. As pessoas são cordiais’
Antes de chegar à capital amazonense para cobrir os quatro jogos que ocorreriam na cidade, a jornalista alemã Ulrike Weinrich, da agência de notícias Sports-Information Dienst, estava em Paris, enviando notícias sobre o elegante Aberto de Tênis de Roland Garros, na França. Em 2002, ela foi à Copa da Coreia do Sul e Japão. Diz-se experiente em eventos da Fifa. Agora, sem pestanejar muito, afirma:
— A organização aqui foi muito boa. Aqui no Brasil, as pessoas são cordiais. Não há muitos que falem inglês. Muito menos alemão, mas os brasileiros são cordiais. Tentam ajudar e realmente conseguem, porque põem o coração em tudo que fazem.
Vinda de uma nação em que o futebol também é tido como paixão nacional, Ulrike se impressionou com a forma como o esporte é encarado por aqui.
— No Brasil, futebol é uma religião — resume a jornalista.
SÃO PAULO
‘Nas manifestações, tem outros aproveitando a situação’
Jornalistas estrangeiros que estão no Brasil elogiam a simpatia do povo e a beleza natural do país, mas reclamam da sensação de insegurança, de preços altos e da “esperteza” de alguns brasileiros.
— Acho que não tem muita segurança, e há muita burocracia e preços altos — diz Reza Balapoor, da TV Irã, que passou por São Paulo, Rio, Curitiba, Belo Horizonte e Salvador.
O português Miguel Henriques, do SAPO Desporto, não se preocupou com os protestos:
— Vejo que nas manifestações tem muita gente com razão, mas outros aproveitando a situação.
Mas reclamou de problemas com o carro:
— A locadora me cobrou indevidamente um valor na fatura final, que não constava do contrato. Em Salvador, cheguei ao meu carro e tinha uma pessoa lá dentro, sentada no banco do passageiro. Não roubou nada, talvez porque eu tenha chegado a tempo.