As articulações durante o andamento do impeachment sacudiram o Congresso Nacional, o Palácio do Planalto, o Supremo Tribunal Federal (SFT) e, sobretudo, as ruas da capital. Durante os últimos meses, o brasiliense testemunhou a formação da comissão parlamentar que analisou a denúncia, a votação da matéria, a edificação de um muro na Esplanada dos Ministérios, as manifestações favoráveis e contrárias ao afastamento da presidente Dilma Rousseff e as manobras para romper ou acelerar o processo. O cotidiano da cidade é drasticamente pautado pela crise na República. Engarrafamentos, interdição de avenidas, alterações no transporte público, protestos, entre outras modificações, criam gargalos diários para o cidadão. Chegar ao trabalho fica mais complicado e os atrasos são inevitáveis.
A rotina começou a ser alterada ontem. Pelas ruas, é possível ver faixas pró e contra o impedimento nas vias S1 e N1. Era grande o volume de carros com bandeiras do Brasil e pessoas vestidas com camisetas de partidos políticos e nas cores verde e amarela. Grupos governistas e oposicionistas organizaram atos. Um homem estava lendo a Constituição Federal nas proximidades do Palácio Itamaraty. Um pequeno grupo de sindicalistas se reuniram entre os ministérios da Agricultura e do Planejamento. Enquanto isso, a grade no meio da avenida era finalizada.
A secretária Patrícia Viana, 34 anos, mudou a agenda desde ontem. Entre as prioridades, acordar 45 minutos antes do horário habitual para chegar pontualmente às 8h ao trabalho. A mulher sai de Ceilândia, distante 35km do Plano Piloto, para prestar serviço na Quadra 1 do Setor de Autarquias. “O dia inteiro fica mais complicado. Sair e chegar em casa é mais difícil. Se tem confronto é ainda pior”, reclama. O motorista de ônibus Douglas Silva, 28 anos, faz o trajeto que liga Ceilândia à Rodoviária do Plano Piloto e leva, em média, 40 minutos. Ele estima que hoje o percurso ficará mais longo. “Com certeza, vai demorar mais. E os passageiros, reclamando”, brinca.
A aglomeração na Esplanada, prevista para começar por volta das 14h, é oportunidade de lucro para vendedores ambulantes. Guilherme Araújo, 21, vende cerca de 30 sanduíches por dia. Ele estima que hoje o montante chegue a 100. “Fico com receio dos confrontos. As pessoas estão bastante nervosas”, conclui o morador de Sobradinho.
Movimentos
O grupo oposicionista Resistência Popular está acampado há pelo menos 50 dias no Parque da Cidade. Cerca de 15 pessoas de pelo menos três unidades da Federação estão no local. Dileta Corrêa Silva, 44, gerente do acampamento, garante que a manifestação de hoje será pacífica. O grupo não divulgou expectativa de público. “A maioria das pessoas se encontrará no local da manifestação para facilitar. Após a votação, vamos continuar acompanhado a situação. Não temos data para desmanchar o acampamento”, explica a líder.
A Central Única dos Trabalhadores (CUT) informou, em nota, que hoje e amanhã estará montado o Acampamento em Defesa de Democracia, no estacionamento do Ginásio Nilson Nelson. As delegações começaram a chegar na noite de ontem de, pelo menos, oito estados. “Reafirmamos a convocatória a todos aqueles que defendem a democracia, pois é nas ruas que impediremos o golpe”, ressalta o texto. Na manhã de ontem, cerca de 600 integrantes do Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem Terra (MST) bloquearam as BRs 020, 060 e 070. Na noite de ontem, por volta de 200 pessoas contra o impeachment e 70 pró estiveram em frente ao Palácio do Planalto para se manifestar.
Nas proximidades do Memorial dos Povos Indígenas, cerca de 350 índios de tribos de 11 estados estão acampados no local. Há faixas com frases de apoio à presidente Dilma e contra o impedimento da chefe de Estado. “Luta pelos direitos indígenas e por um Brasil mais justo”, diz uma delas.