Os poderosos escrevem a história que a eles interessa e reagem a todos os avanços que possam nos levar a uma sociedade mais justa, mais igualitária, mais solidária. Eles sempre conseguem manter os seus privilégios. No Brasil, a classe política sempre teve privilégios e benefícios inimagináveis para um País com tantos pobres. E nenhuma reforma política/eleitoral que retire essas “conquistas”, ou pelo menos as diminua, consegue passar.
Vejamos o caso dos parlamentares: remuneração mensal de R$ 33.763; verba de gabinete de R$ 120 mil/mês para contratar diretamente de 5 a 25 assessores (essa verba é fonte permanente de corrupção, no fenômeno denominado de “rachadinhas”). Além disso, é um absurdo, uma vez que tanto o Senado quanto a Câmara dos Deputados possuem um quadro de servidores efetivos e comissionados mais do que suficiente para atender as demandas dos parlamentares.
Esses servidores, na maioria dos casos, ficam ociosos, porque os parlamentares não gostam de trabalhar com eles, por terem receio de que os trambiques que fazem sejam vazados para a imprensa. E não podem demiti-los, por serem estáveis, quando eles se recusarem a fazer algo que contrarie a lei.
Existe, ainda, a cota para o exercício parlamentar, que varia de R$ 30 mil a R$ 45 mil, dependendo do estado que representam. Para o Ceará, por exemplo, é de R$ 42.451. Essa verba cobre despesas com aluguel de escritório de apoio em suas bases eleitorais, passagens aéreas, alimentação, aluguel de carros, combustível etc; e o auxílio moradia de R$ 4.253/mês, caso não usem apartamentos funcionais em Brasília.
Outras mordomias são as despesas médicas – reembolso integral dos gastos individuais e dos dependentes, além de poderem usar os serviços médicos mantidos pelas Casas do Congresso; e a cota gráfica para a impressão de material de papelaria (cartões, pastas, papel e envelopes timbrados), impressão de documentos e publicações. Em geral são feitos nas gráficas mantidas pelas Casas.
Deputados e senadores recebem ajuda de custo, no valor de uma remuneração mensal (R$ 33 mil), no início e no fim do mandato; e aposentadoria proporcional ao tempo de mandato, durante o qual usam carro oficial em Brasília, com combustível, motorista e manutenção custeados pelo Congresso.
Cada um deles pode apresentar emenda individual no orçamento federal de R$ 16,6 milhões, que serão destinadas a até 25 obras (a serem realizadas por suas próprias empresas, é claro), além de emenda de bancada, que no orçamento federal para 2020 alcançou o montante de R$ 6,67 bilhões. Se o parlamentar exercer algum cargo, a exemplo de líder de partido/coligação ou de bancada, esses valores são turbinados, além de terem direito a outras despesas.
É preciso ter em conta, ainda, os valores do Fundo Partidário (cerca de R$ 1 bilhão) e do Fundo Eleitoral (mais de R$ 2 bilhões) para o corrente ano de 2020, os quais também podem ser usados pelos parlamentares.
Tudo isso tem motivado a participação política de pessoas de caráter duvidoso – corruptos, oportunistas, aproveitadores, milicianos e outras espécies de canalhas -, que hoje dominam essa área e, por outro lado, afastado as pessoas sérias, honestas e compromissadas com os interesses da sociedade.
Entendeu agora porque, com os atuais parlamentares, é impossível se pensar em reforma política/eleitoral que retire, ou pelo menos diminua, esses benefícios e vantagens? E não tenha dúvidas: só assim teremos políticos de fato compromissados com os interesses da sociedade e não vendilhões da pátria e adoradores do “deus ouro”.
Apesar de a Constituição afirmar que “todo poder emana do povo”, são eles – os políticos – que usurpam esse poder popular. E assim, nada que retire ou diminua suas vantagens será aprovado. Para que isso ocorra, precisaríamos ter um povo consciente e disposto a lutar por uma reforma política/eleitoral que melhor atenda os interesses da Nação. Só uma Constituinte apolítica poderá fazer isso, seguida de uma revolução cultural que objetive educar e elevar a consciência política/social do povo.
(*) Advogado