J. B. Pontes (*)
É indiscutível que os parlamentos são fundamentais para a democracia, atuando no controle do poder político, na definição das diretrizes e metas a serem cumpridas; na supervisão das ações governamentais e na elaboração e aperfeiçoamento das leis. Por isso, são essenciais para garantir a concretização pelo Estado dos direitos humanos, econômicos e sociais. Mas essa nobre missão dos parlamentos está muito distante de ser realizada no Brasil. Em verdade, temos hoje o pior Congresso da nossa história. E se nada for feito, continuará a piorar a cada legislatura.
É inegável que a maioria dos atuais parlamentares não reúne as condições éticas, morais e intelectuais para o exercício de tão importante cargo. A prova disso está no nível vergonhoso dos debates que estão ocorrendo, principalmente na Câmara dos Deputados. As discussões ocorrem num clima de campanha quase obscena, com enfoque na degradação da imagem dos adversários, carregadas de palavrões chulos e quase sempre terminam em tentativas de agressões físicas. O atual parlamento virou motivo de chacotas, um verdadeiro circo de horrores.
Isso decorre do grande volume de recursos públicos disponibilizados aos partidos para financiar as campanhas, por meio dos fundos Eleitoral e Partidário (R$ 4,9 bilhões e R$ 1,2 bilhão, respectivamente, na eleição de 2022); dos elevados valores disponibilizados aos parlamentares, em especial os do Centrão, pelas emendas parlamentares, pelo orçamento secreto; e pelo assalto aos orçamentos de órgãos e entidades do Poder Executivo. Sobrou muito dinheiro para compra de apoios políticos e votos.
Apesar disso, ainda persistem indícios da ocorrência do chamado “Caixa 2 eleitoral” (financiamento privado não declarado, em troca de futuros favores políticos), o que resulta nas diversas bancadas hoje existentes no parlamento: bancada da bala, bancada do Agro (ou rural), bancada da Bíblia e tantas outras. Só falta mesmo a bancada do povo.
Neste contexto, grande parte dos parlamentares eleitos é composta de aventureiros atraídos para a política na ânsia de obter riqueza e poder da forma mais rápida e fácil possível. Poucos sabem ou querem discutir sobre políticas públicas, diretrizes e metas para resolver os grandes problemas do País. O único objetivo é controlar cada vez mais fatias dos orçamentos públicos, por meio de emendas ou de outros meios espúrios.
A cultura patrimonialista ainda é predominante, em especial por meio da indicação de correligionários e parentes para ocupar cargos nos diversos escalões do Executivo, com o objetivo de apropriação dos recursos orçamentários de órgãos e entidades públicos. Tudo isso é muito grave. Se continuarmos tratando assim a administração dos negócios públicos, seremos para sempre um país sem futuro. Nem de esperanças poderemos mais viver…
Com o intuito de contribuir para esse debate essencial e impostergável, apresentamos algumas ousadas sugestões, com vistas a obter mudanças culturais capazes de melhorar o desempenho de nossos parlamentos:
- Promover a inclusão democrática do povo, exigindo que os governos apóiem e estimulem a formação de escolas de democracia e participação social em cada município e bairros das grandes cidades, visando elevar a consciência política e social da população.
- Promover uma reforma política e administrativa, com objetivo de reduzir a composição dos parlamentos; diminuir drasticamente os atuais benefícios financeiros, prerrogativas e demais benesses oferecidas aos parlamentares, com o propósito de desestimular o ingresso ou permanência nessa área daqueles que almejam somente enriquecer, bem como atrair para a política cidadãos que verdadeiramente queiram prestar serviços à Nação.
- Reduzir drasticamente os recursos destinados aos fundos Partidário e Eleitoral, assim como os valores das emendas parlamentares de todos os tipos.
- Profissionalizar a administração pública, evitando a cultura patrimonialista de indicação pelos políticos de parentes e apoiadores para cargos técnicos nos diversos escalões do Poder Executivo.
- Alterar a atual legislação para considerar crime hediondo, com penas elevadas, a prática do “Caixa 2” ou qualquer outra que atente contra a democracia.
- Promover cursos sobre o papel do parlamento e do Estado, obrigatórios para os parlamentares nas três esferas da Federação, especialmente os de primeiro mandato.
- Definir novas formas de participação da sociedade no controle do poder político, em face das limitações de atuação dos parlamentos imposta pela globalização perversa.
São propostas ousadas, algumas de difícil concretização, por dependerem de reformas constitucionais, que obviamente não serão feitas a contento pelos atuais parlamentares e nem apoiadas pela maioria dos partidos. Por isso, aventamos mais uma vez a necessidade de convocação de uma Assembleia Extraordinária apartidária para promovê-las.
A Constituição Federal de 1988 não prevê essa possibilidade, mas afirma que todo poder emana do povo. Portanto, conscientizar e mobilizar o povo será fundamental para exigir que as mudanças sugeridas sejam concretizadas.
Neste momento sombrio que atravessamos, todos os cidadãos conscientes devem se engajar em movimentos sociais que visem fortalecer a democracia e aperfeiçoar os nossos parlamentos, nos níveis federal, estadual, distrital e municipal.
(*) Geólogo, advogado e escritor