Há 16 anos o promotor de justiça Chico Leite, 54, está licenciado do cargo para cumprir quatro mandatos seguidos de deputado distrital. Ele já peregrinou por vários partidos – PSDB, PT, PCdoB e agora tenta uma vaga de senador pela Rede Sustentabilidade, da presidenciável Marina Silva. Autor da lei que obriga o Poder Executivo e a Câmara Legislativa a publicar todos os gastos na internet, Leite diz, nesta entrevista ao Brasília Capital, que, no Congresso, dará continuidade à luta contra a corrupção, pela transparência na aplicação dos recursos públicos e em defesa dos interesses de Brasília. “Nós precisamos cuidar da cidade”, prega o cearense de Milagres, localizada na região do Cariri, no sul do estado. E diz que a opção pela aliança que busca reeleger o governador Rodrigo Rollemberg (PSB) se baseou no critério da ficha limpa. “Brasília não pode voltar aos tempos em que era conhecida como a terra dos corruptos”, afirma.
Você está concluindo o quarto mandato na Câmara Legislativa. Quais as principais conquistas de seu trabalho para a sociedade? – São 33 anos de serviço público, 29 dos quais como promotor de justiça, sendo 16 licenciado para exercer quatro mandatos de deputado distrital. Eu priorizei três ações. A primeira foi o combate à corrupção, porque a corrupção leva R$ 200 bilhões por ano do brasileiro, e nós precisamos colocar esses valores, resultado dos impostos que pagamos, de volta à Saúde, à Educação, à Segurança, à mobilidade, à melhoria dos serviços públicos. Na Câmara, toda semana faço uma fiscalização em uma aplicação de recursos.
Você tem noção de quanto conseguiu recuperar? – As ações tiveram algo em torno de 1,135 bilhão envolvidos. Isso vai de R$ 600 milhões de contratos, reconhecimento de dívida sem saber se o serviço foi executado, onde se aplicou o dinheiro, que certamente foi para o bolso de alguém. Nós precisamos processar e punir, além de recuperar esse dinheiro das áreas prioritárias, como a Saúde. Isso vai até a contratos na área de informática, ações de shows, eventos, compras superfaturadas. Dinheiro que é fruto de impostos e tinha que chegar na população mas não chega, porque é desviado por corruptos. Então, o combate à corrupção para nós foi fundamental.
Qual a segunda ação? – A transparência. Porque assim que se recolhe o dinheiro dos impostos ele precisa estar à vista de todos, para que a população possa acompanhar e fiscalizar o que se faz com o dinheiro dos impostos que ela paga. Nossa ação foi de colocar todos os gastos públicos do Poder Executivo na internet, a partir de uma lei que aprovamos, para que a população pudesse fiscalizar. Todos os gastos da Câmara Legislativa e dos parlamentares também estão na internet, através de uma resolução aprovada em 2011. É transparência total, insistindo em que os agentes públicos colocassem seu Imposto de Renda, como eu fiz ainda em 2005, para que todos pudessem ver.
Você usa as verbas indenizatórias? – Nunca usei! Nem a cota postal. Nunca recebi um centavo de salário como parlamentar. Minha remuneração é do concurso público que fiz há 30 anos.
E qual a terceira ação? – Cuidar da cidade. O agente público precisa estar todo dia na cidade, pois quem sabe dela é quem vivencia os problemas. No ar-condicionado, nos gabinetes, nos tapetes vermelhos, você pode ter certezas aparentes, mas a verdade está na rua, nos grandes desafios da dona de casa, do trabalhador, do empresário, do estudante. Nesses anos eu procurei fazer o orçamento participativo e transparente, de forma que a própria comunidade escolhesse onde aplicar os recursos e fiscalizasse.
Para quais áreas você destina prioritariamente suas emendas? – Tivemos três preocupações: a Saúde, com medicamentos e valorização dos profissionais; a Segurança, pois hoje é um problema grave a pessoa de bem estar presa na sua casa e os bandidos soltos na rua. Precisamos mudar isso. Precisamos equipar nossa polícia, valorizar a sua atividade; e a Educação. Além da valorização do profissional, do professor, tivemos a preocupação da destinação de recursos diretamente às escolas, por meio do Programa de Descentralização Administrativa e Financeira (PDAF), da Secretaria de Educação. Começamos isso em 2015. Fomos pioneiros. Destinamos, até o final deste ano, mais de R$ 9 milhões diretamente para as escolas, para o professor e para o servidor. Sem intermediário, sem burocracia.
Mas o desafio agora é o Senado. O que você priorizaria para Brasília? – Quero fazer, numa dimensão maior, aquilo que fiz na Câmara Legislativa, num nível de competência ampliado pela Constituição. Aqui, eu coloquei em lei a exigência de ficha limpa para o exercício de cargo público. O DF foi a primeira unidade da Federação a adotar isso.
Em Brasília, seu partido e da presidenciável Marina Silva optou por uma coligação diferente da nacional, apoiando o PSB de Rodrigo Rollemberg… – Eu tenho orgulho de caminhar com Marina. Em política, o soco no nariz só quebra a mão. Temos que compreender as diversidades. No plano nacional nós temos uma aliança com o Partido Verde, do Eduardo Jorge, que já foi candidato a presidente. Aqui, nós e o PV nos alinhamos ao Rodrigo Rollemberg.
Qual foi o critério? – A ficha limpa. Nós não podemos voltar àquele tempo em que você viajava e as pessoas viam a placa do seu carro e diziam: “a terra dos corruptos”. Nós não podemos voltar a isso. Brasília precisava sair das páginas policiais para entrar nas páginas de serviços, de alegria, da construção de uma cidade maravilhosa que acolheu a todos nós. Não podíamos nos aliar a ficha suja.
Vocês chegaram a manter conversas com Jofran Frejat justamente quando ele disse que não venderia a alma ao diabo. Ele contou pra vocês quem são os demônios? – Não, porque eu não tive oportunidade de conversar com ele. Mas eu imagino que sejam esses representantes daquele tempo em que Brasília, para o Brasil, era terra de corruptos. Mas aqui é uma terra de trabalhadores, de empresários, de empreendedores que lutam contra todas as dificuldades, mesmo com a guerra fiscal que sofremos em relação aos outros estados. Temos mais de 200 mil pequenas empresas, de gente que resiste e se levanta diariamente dizendo: “eu vou servir à minha capital, cidade que escolhi para criar meus filhos”.
Em 2014, o PV e Marina apoiaram Aécio Neves no segundo turno. Depois apoiaram o impeachment. Aí vieram todos os escândalos contra o tucano. Qual foi o pecado mais grave, as pedaladas da Dilma ou o envolvimento do Aécio na Lava Jato? – Corrupção é um crime de lesa-pátria, que mata gerações. Então, não importa se esse crime é praticado por um partido ou por um representante de um partido de uma linha ideológica qualquer. Corrupção é um crime grave que deve ser punido e o dinheiro recuperado para ser aplicado onde nós que pagamos impostos queremos que ele seja destinado. Se fôssemos nos basear em erros, há erros das duas partes. Então, é a gente aprender com os erros e corrigi-los.
Você foi contra o impeachment? – Não. Eu fui favorável, porque havia um processo de afronta à responsabilidade fiscal. Nós precisamos entender que é preciso ética. É preciso responsabilidade com o dinheiro dos impostos que os cidadãos pagam. Então eu fui favorável ao impeachment.
Em certo momento deu a impressão de que o PV e Marina apoiaram o impeachment como um gesto de vingança contra o PT… – Marina jamais faria isso, pelo que conheço, de optar por esse ou aquele candidato por vingança. Ela teve aquela opção pelo Aécio, da qual discordei naquele momento, e depois ela viu os fatos praticados, que certamente ela não sabia, e pôde refazer esse pensamento, porque democracia é como concurso público, é a porta de entrada para melhoria da qualidade de vida. Marina tem responsabilidade com a coisa pública. Sua preocupação é com a população.
Tanto na campanha nacional como na distrital existem candidatos que pregam o uso da força no combate à violência. Qual é a postura da Rede, e sua pessoal, em relação à bancada da bala? – Não se resolve violência com mais violência. Nós precisamos, de fato, ter respostas mais imediatas, com punição àqueles que violem a lei. Mas precisamos pensar na sociedade como um todo, cuidando da família, com educação integral, profissionalizante, para dar oportunidades para os jovens de aprender uma profissão e realizar seu sonho pessoal de servir à sociedade. Eu prefiro uma arma: o livro. Esta sim, é uma arma de mudança. Eu prefiro a gente cuidar da família e das nossas crianças para que elas possam ter outro caminho que não o do crime, mas o caminho da escola, da profissão, da realização do sonho de servir à sociedade.
Pergunta de leitor, via Facebook: O senhor apoiou a criação do Instituto Hospital de Base? – Não. Eu votei contra porque tinha dúvida quanto à segurança jurídica. Como promotor, sempre que existe esse debate eu opto pela cautela, pela serenidade.
Mas qual sua avaliação dos resultados até agora? Boa. Eu votei contra porque não tinha certeza da segurança jurídica. Mas tenho analisado os resultados, e eles são extremamente positivos.
Mas o IHBB vai contra o corporativismo dos servidores… – O debate que eu gosto de fazer não é de diretos individuais, embora os reconheça e os valorize, nem de direitos corporativos, que também reconheço e valorizo; é da população usuária do serviço. Votei contra. Mas hoje eu reconheço, pelos números, que se fazia 11 cirurgias por dia e agora se faz 40. É um número que nos dá esperança.
O senador Cristovam Buarque disse, em entrevista ao Brasília Capital, que uma instituição pública pode ser tanto privada quanto estatal. Concorda com ele? – Sim, sem dúvida. O que importa é o conteúdo e não a forma. Eu, nesses anos todos, venho fazendo esse debate. Você tem o seu direito individual, o direito das corporações e o direito do usuário do serviço, que paga imposto e que precisa ter um serviço de qualidade. Então, nesse debate, reconhecendo os direitos individuais, que todos temos, reconhecendo os direitos corporativos, porque as categorias precisam se organizar e defender seus direitos, nós precisamos privilegiar o direito do usuário, que é quem paga imposto e que é o patrão do servidor público. Eu sou empregado dele. Eu preciso defender os interesses dele, sem deixar de reconhecer os individuais e os corporativos. A rigor, todos lutamos com a mesma finalidade, que é a melhoria da qualidade de vida para nossa cidade.
Então, nós temos o servidor público Chico Leite como promotor, como deputado distrital e poderemos ter como senador. O que esperar desse servidor nessa nova função? – Eu quero levar para o Senado a experiência de jamais ter ganhado um centavo com a política. O meu salário é do concurso público que eu fiz 30 anos atrás. Minha prioridade é ter a certeza de que é possível seguir na política com integridade e ficha limpa. Basta ter coragem para tomar atitudes.
Quais as suas prioridades para a pauta nacional? – Eu fiscalizei os gastos públicos na Câmara, para cuidar para que esse dinheiro não fosse para o bolso de corruptos, não fosse desviado. Para o plano nacional são quase R$ 200 bilhões. E eu quero que esses R$ 200 bilhões possam servir para que a gente consiga fazer milhões de tratamentos quimioterápicos. Quanta gente está na fila esperando isso? Se a gente combater os corruptos com competência, sabendo o que está fazendo, propondo leis de transparência, esse dinheiro vai chegar à população. Em terceiro lugar, é promover o desenvolvimento do Distrito Federal. Precisamos valorizar nossos servidores públicos, mas precisamos nos tornar mais independentes dos serviços públicos. Vamos incentivar a geração de trabalho e renda. No Senado a gente vai poder proteger o DF da guerra fiscal, que é perversa, que está tirando empresas nossas para São Paulo, Goiás, Minas, Bahia. Elas precisam estar aqui. Os empresários querem estar aqui. Basta que o agente público não se omita, atue para garantir a eles que eles podem trabalhar aqui, trazer recursos. Nós precisamos trazer recursos, bater de porta em porta nos ministérios e dizer: o DF, que hospeda todo o pais, que nos acolheu, precisa de recursos para promover o seu desenvolvimento e para melhorar a qualidade de vida. Eu vou estar lá para fazer essa defesa do DF. Por último, eu não vou esquecer de cuidar das pessoas da nossa cidade. Quero ser um senador que esteja toda semana em uma cidade, porque as pessoas é que sabem do seu sofrimento diário. Eu quero, no Senado, me preocupar com elas. E me colocar a serviço da população. Vamos ter vários debates importantes, como a reforma política e a da Previdência. Nós precisamos garantir direitos e combater privilégios. Então eu quero dedicar os meus 29 anos de Ministério Público, como promotor e procurador de Justiça, e os meus 16 anos como parlamentar, estudando e praticando diariamente o direito, para colocar esse aprendizado a serviço da população do DF e do Brasil no Senado.
Na sua chapa tem uma segunda candidata ao Senado, a Leila do Vôlei. Existe afinidade entre as duas campanhas? – A nossa chapa é de mãos limpas e calejadas de trabalhar pelo Brasil. Tem o governador Rollemberg, do PSB; o vice Eduardo Brandão, do PV; e dois candidatos ao Senado – a Leila, do PSB, que se Deus quiser será a primeira mulher senadora do DF, e eu, da Rede. Nós renovamos com competência.
Vocês dois têm uma relação muito próxima com o senador Reguffe, que não concorre nesta eleição. Ele está te apoiando? – Nós nos identificamos pelo trabalho, pela conduta e pela disposição de trabalhar pelo Brasil com ética e responsabilidade. É fundamental a ficha limpa para despertar a confiança nas pessoas.