Em um período de quinze dias, o cerrado perdeu cerca de mil hectares em um desmatamento ilegal próximo à nascente do Rio da Prata. Manancial de abastamento para o Sítio Histórico e Patrimônio Cultural Kalunga, o rio fica localizado no município de Cavalcante (GO).
A triste marca foi alcançada justamente na semana em que se comemora o Dia Nacional do Meio Ambiente (5 de junho). As informações são do portal De Olhos Nos Ruralistas.
Ao analisar imagens de quatro satélites para dimensionar o impacto da ação dos tratores, o Instituto Cerrados detectou 549 hectares desmatados na Fazenda Alagoas até o dia 31 de maio. E ainda há indicativo de outros 267 hectares de desmatamento. Segundo a entidade, desde a análise, outras áreas podem ter sido abertas.
O padrão do desmatamento aponta o uso de “correntão”, quando correntes são presas a tratores para facilitar o corte raso da vegetação, permitindo o plantio de soja. Para despistar os olheiros que preservam a área, as máquinas operaram a cerca de dois quilômetros da cabeceira da pista.
A denúncia foi feita pelos próprios quilombolas — cujo território é autodemarcado — e pode ser visualizada em imagens aéreas por drone que mostram a devastação realizada na Fazenda Alagoas.
Segundo moradores, a Fazenda Alagoas, desmembramento de outra fazenda maior, a São Domingos, teria sido arrendada em abril a uma fazendeira de Catalão (GO) pela proprietária Agropecuária Rio do Prata Ltda, antes chamada Unaí Agro-Pastoril.
Offshore – A empresa é uma sociedade dos irmãos Gustavo, Francisco e Cristina Figueiredo Bannwart. De origem suíço-holandesa, a família controla a área da Fazenda São Domingos desde 1970, quando o patriarca Gerard Gustav Josef Bannwart e o irmão Rudolf a adquiriram de colonos alemães pelo valor de Cr$ 1,2 milhão.
Além da Unaí Agro-Pastoril, Gerard fundou, ainda nos anos 1970, a Pequi Agro-Pastoril, proprietária da Fazenda Piqui, vizinha da Alagoas. As duas foram fruto de uma sociedade com a empresa britânica Caldernorth Overseas Limited que manteve participação nas fazendas até 2002, quando foi incorporada pela offshore Martinibeth Investment Inc e vendeu suas cotas à família Bannwart.
Com sede no Panamá, a Martinibeth era intermediária do Merlin Group e cliente do escritório Mossack Fonseca, epicentros do Panama Papers, escândalo de evasão fiscal e ocultação de patrimônio revelados pelo Consórcio Internacional de Jornalismo Investigativo (ICIJ).
A milhares de quilômetros do território Kalunga, em Avaré (SP), Gerard tornou-se conhecido por implementar projetos de agricultura biodinâmica, método de produção orgânica que incorpora ciclos lunares e conceitos de astrologia, tornando-se tradutor, no Brasil, do criador da técnica, o alemão Rudolf Steiner.