Ricardo Nogueira Viana (*)
Em maio, a 6ª DP da Polícia Civil do Distrito Federal desencadeou a operação FINIS, com o intuito de prender duas associações criminosos que tinham uma única finalidade: se exterminarem. Os grupos se concentravam no Paranoá e no Itapoã, onde moram mais de 130 mil pessoas.
Nos últimos dois anos, os associados foram responsáveis por dezenas de mortos na região. Rememorando a história do DF, este tipo de reuniões de jovens formando gangues não é característica apenas daquela localidade. E também não tem a ver com poder econômico, pois investigações desta espécie já foram encampadas por esta Polícia Judiciária em outras áreas, inclusive em nichos de classe média.
Analisando as características e comportamentos dos dois grupos, verificou-se que reúnem pessoas de 15 a 35 anos, que se agruparam para defender os seus territórios e interesses. Em síntese, nenhum deles sabe dizer como a contenda começou. Mas uma coisa é certa: ceifavam vidas ou tentavam matar pessoas, por vaidade, ódio e até mesmo sobrevivência.
É fato que os indivíduos estavam associados para a prática de crimes, mas ouso fazer uma subdivisão deste ilícito penal – associação criminosa, previsto no artigo 288 do Código Penal. Quando se trata de gangues, os escroques estão juntos, têm um objetivo comum, mas há a ausência de caráter econômico.
Não havia auferição ou repartição de lucros, mas simplesmente união para matar os adversários. Como eles se mantinham? Todos tinham suas carreiras-solo. Ou seja, praticavam seus delitos de forma autônoma e intencional: traficavam, roubavam, receptavam e furtavam, mas não dividiam os produtos e os proveitos dos crimes com a corja.
Dos 22 homicídios consumados na região em 2021, 11 são atribuídos à malta. Curiosidade: dois deles aconteceram após o benefício da saída temporária, o ‘saidão’. Em um destes, o suspeito não residia na região. Ou seja, a ordem foi originada no interior do estabelecimento prisional.
Interrogando um de seus membros, o qual detinha uma tatuagem do grupo no dedo anular direito, este relatou de forma curiosa: “Entrou no meu CEP, a bala voa! O algoz se referiu ao Código de Endereçamento Postal. Ou seja, os grupos pretendiam dividir o Paranoá e o Itapoã em áreas, e quem ultrapassasse os limites impostos, era alvejado. Fosse a ação bem-sucedida ou não, haveria o revide.
Rememoro os tempos em que chefiava umas das delegacias da Ceilândia. Em 2018, uma criança de cinco anos foi morta com tiros na cabeça, após um ataque da gangue rival. Quatro indivíduos entraram de forma inopinada no outro território e efetuaram tiros em direção ao irmão da vítima. Este também foi atingido, mas não faleceu. Já a criança. Oremos!
Após intenso e exaustivo trabalho de inteligência da investigação policial, internamos os três adolescentes envolvidos e o maior amarga o cárcere, após os 36 anos de reclusão que o júri popular lhe atribuiu. Depois disso, as gangues locais foram indigitadas e os malfeitores presos. Com isso, o Setor “O” e adjacências ficaram um tempo considerável sem homicídios relacionados aos grupos rivais.
A operação FINIS cumpriu 59 mandados de prisão e 37 de buscas. Dos presos, 22 já se encontravam reclusos no sistema prisional e quatro adolescentes cumpriam internação no sistema socioeducativo.
Além da perfídia e crueldade, os associados mostraram que não conseguem viver em comunidade e merecem mudar de CEP, ou seja, serem enviados ao Sistema Prisional (CEP 71.686-670) para que, um dia, possam retornar ao convívio social de forma a não burlar valores e aprender que a paz e a vida são bens indisponíveis.
A investigação também apurou o envolvimento de vários adolescentes, os quais já se alvoroçavam para galgar postos dentro da associação, com o fim de perpetuar horrores.
Que sejam mantidos presos!
Rogamos que permaneçam harmônicas as duas regiões administrativas, sem territórios demarcados, gangues e baixos índices de criminalidade, para que o cidadão de bem, contribuinte e sujeito de direitos, possa viver em sociedade!
(*) Professor de Educação Física, delegado-chefe da 6ª DP