Cerca de 200 catadores de material reciclável protestaram nessa quarta-feira (7), em frente ao prédio onde fica a sede do Serviço de Limpeza Urbana (SLU) do Distrito Federal, em Brasília, contra as condições oferecidas pelo governo nos galpões de triagem e separação dos resíduos da coleta seletiva. Eles reclamam, principalmente, do baixo volume de lixo que tem sido destinado para as unidades e da falta de espaço para acomodar todos os catadores cadastrados para trabalhar nos locais, provocando queda de renda na categoria e desemprego.
Os catadores também reclamam que o governo não entregou o maquinário prometido para as cooperativas, como é o caso do aparelho de prensagem, e não fez o repasse do auxílio compensação financeira, no valor de R$ 360,75 por catador, que seria pago durante seis meses após o fechamento do aterro do Jóquei, o lixão da Estrutural.
Desde o processo de fechamento do Lixão da Estrutural, concluído no último dia 20 de janeiro, cerca de 1.200 catadores passaram a trabalhar em cinco galpões alugados pelo GDF. Por meio de associações e cooperativas, eles assinaram contrato com o governo, que inclui serviços de recepção, triagem, prensagem, enfardamento, armazenamento e comercialização. Pelo serviço, eles recebem em torno de R$ 300 por tonelada de lixo reciclado, mais o valor de venda do material que for reaproveitado.
Renda
Segundo Raquel Oliveira, catadora da cooperativa Ambiente, que atua no galpão de triagem de Ceilândia, ao longo das últimas três semanas os catadores só conseguiram ganhar cerca R$ 58 por pessoa com a venda do material reciclado. “Antes, no lixão, um dia de trabalho rendia de R$ 150 a R$ 200. Com o desconto da passagem de ônibus pra chegar até lá [no galpão], teve gente que ficou com apenas R$ 19. Como é que um pai e uma mãe de família sobrevivem com isso?”, questionou a catadora.
Para Márcia Nayane Santana, diretora operacional de limpeza urbana do SLU, a tensão é compreensível porque os catadores passam por um momento de adaptação de modelo, mas o governo está cumprindo com a destinação de cerca de 110 toneladas diárias de lixo para reciclagem nos cinco galpões em funcionamento. Ela admitiu, no entanto, que o material que chega ainda tem um baixo valor agregado na venda para reciclagem.
“Como o número de desemprego e a quantidade de catadores avulsos que a gente tem no DF, o material de maior valor agregado não chega com tanta facilidade na coleta seletiva, então o que vai para os galpões tem menor valor. É por isso que o SLU paga aos catadores R$ 300 por tonelada reciclada, independentemente do tipo de material”, afirmou a diretora. Ela acrescentou ainda que os catadores não estão triando todo o material possível nos galpões e que chegam a descartar como rejeitos materiais recicláveis de menor valor.
Baixa qualidade
“Praticamente 70% do que chega da coleta seletiva é resto de comida, lixo orgânico, até material hospitalar, como seringa, a gente tem encontrado. A coleta seletiva do SLU não é seletiva, quase não dá para diferenciar do lixo convencional que é despejado diretamente no aterro de Samambaia sem passar por triagem”, criticou a catadora Raquel Oliveira, que se reuniu com a direção do SLU cobrando também medidas para dar regularidade na entrega de material nos galpões. “A gente nunca sabe quando um caminhão vai chegar. Não tem horário e muitas vezes eles só entregam à noite, quando já não tem mais ninguém lá [nos galopões]”, acrescentou.
De acordo com a diretora do SLU, o cronograma de viagens da coleta seletiva, que atende 23 regiões administrativas e cobre 58% da população do DF, é monitorado diariamente de acordo com a quantidade de catadores presentes nos galpões. Sobre a baixa qualidade dos resíduos entregues aos catadores, ela atribuiu à falta de conscientização no descarte do lixo. “A qualidade [dos resíduos] da coleta seletiva ainda é ruim. A população não se conscientizou o suficiente sobre o descarte correto do lixo”, reconheceu Márcia Santana.
Outra reclamação dos catadores é que os cinco galpões alugados não absorvem toda a demanda de trabalhadores no setor. “Só a cooperativa que eu represento, a Ambiente, são ao todo cerca de 2 mil famílias e só 614 catadores receberam autorização do governo para trabalhar no galpão da Ceilândia”, explicou Ronei Alves, integrante do Movimento Nacional de Catadores de Material Reciclável (MNRC). Para ele, seriam necessários pelo menos 12 galpões em todo o DF. “Tem muita família passando fome”, ressaltou.
Ronei ainda reivindicou uma indenização de RS 14,9 mil por trabalhador para compensar o trabalho em benefício do governo local realizado pelos catadores ao longo de décadas no lixão da Estrutural, que até ser fechado foi considerado o segundo maior do mundo, atrás apenas do lixão de Jacarta, na Indonésia.
Auxílio
Sobre o recebimento do valor do auxílio complementação, a Secretaria do Trabalho, Desenvolvimento Social, Mulheres, Igualdade Racial e Direitos Humanos (Sedestmidh) informou que o pagamento do programa Compensação financeira não está atrasado e a parcela referente ao mês de janeiro será creditada na próxima semana aos contemplados com o programa. “A Sedestmidh está providenciando a inclusão de catadores que não haviam se cadastrado para receber a compensação financeira de R$ 360,75”, acrescentou em nota. Ainda segundo a secretaria, o programa Agentes da Cidadania Ambiental, lançado no ano passado, previa seis parcelas aos 900 catadores que se tornaram multiplicadores das práticas da coleta seletiva. A última parcela foi paga em dezembro.
Ampliação da coleta
Ainda segundo o SLU, o governo aguarda a análise do edital de licitação pelo Tribunal de Contas do DF para retomar o processo de contratação das empresas que devem ampliar a cobertura da coleta seletiva para 100% da população. “A partir do momento que retomarmos esse processo, em três meses teremos as empresas contratadas”, garantiu Márcia. Atualmente, o Serviço de Limpeza Urbana do DF coleta 2.700 toneladas diárias de lixo. Desse total, cerca de 6% é reciclado, a maior parte disso é lixo orgânico que vira compostagem e os outros 3,5% vem de material reaproveitado.