O aumento do custo de vida em Brasília parece não ter limites. Pela primeira vez a cidade foi classificada entre as 50 mais caras do mundo. A capital federal abocanhou a 33ª posição, ficando à frente de Roma, na Itália; Viena, na Áustria; e Amsterdã, na Holanda. São Paulo (10ª) e Rio de Janeiro (12ª) também integram a lista. Brasília foi a terceira cidade que mais subiu no ranking, pulando 37 posições. Ficou atrás apenas das australianas Adelaide, a 46º colocada, que galgou 44 posições, e Canberra, a 34ª da lista, que saltou 40. Os dados são da Consultoria Mercer, que divulgou ontem estudo sobre o tema. A pesquisa levou em conta gastos com alimentação, transportes, vestuário, serviços domésticos, entre outros. Especialistas ouvidos pelo Correio destacam que o encarecimento dos serviços e a disparada no preço de residências e aluguéis são os principais elementos que justificam o crescimento da cidade no ranking.
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A consultora sênior da empresa, Renata Herrera, destaca que mais de 200 itens, divididos em 10 categorias, são avaliados para compor o resultado da pesquisa. Segundo ela, em Brasília os itens mais salgados, além do aluguel, são os gastos com transporte, esportes e lazer, além de álcool e tabaco. “A valorização do real frente ao dólar diminuiu o poder de compras dos estrangeiros nas cidades brasileiras”, explica.
A desvalorização da moeda norte-americana explica, no entanto, apenas parte da elevação do custo de vida na capital. Rio de Janeiro e São Paulo — as outras duas cidades brasileiras classificadas na pesquisa e que também foram influencidas pelos efeitos do fortalecimento do real — saltaram, respectivamente, 17 e 11 posições em relação ao estudo divulgado no ano passado.
A socióloga Isabel Boavista, 55 anos, moradora do Lago Sul, frequentadora assídua de restaurantes, confessa que vem diminuindo as saídas. “Gosto bastante de sair para comer, mas senti um peso grande. Os alimentos, em geral, estão bem caros também nos supermercados”, diz. O que incomoda a socióloga é o fato de gastar muito e não receber um serviço de qualidade. “Pagamos caro e não temos o retorno esperado”, sugere Isabel.
Para a também socióloga Magda Lúcio, 43 anos, moradora da Asa Norte, entre os serviços mais caros em Brasília, os gastos com alimentação estão no topo. Na lista de Magda, as despesas com moradia, transporte e educação completam a lista dos itens que mais consomem o orçamento do brasiliense. “As pessoas estão embevecidas com o acesso ao consumo e não estão refletindo sobre isso. Falta consciência crítica sobre quanto custam realmente esses serviços”, analisa.
Moradia
Na opinião do professor de Finanças do Ibmec Vinícius Brandi, a migração de mais pessoas para a classe média impulsionou o aumento do consumo e a elevação dos preços na cidade. Segundo Brandi, o tombamento da capital, que restringe a oferta de imóveis, aliado ao alto poder de endividamento dos servidores públicos, contribui para a elevação de custos com a compra de residências e aluguéis. “A grande concentração de renda é uma peculiaridade de Brasília por causa do funcionalismo. Por conta da estabilidade, os servidores são consumidores mais propensos a tomar empréstimos para comprar imóveis”, completa.
Para o administrador público José Raimundo Felix, 47 anos, morador do Sudoeste, os gastos com alimentação e habitação pesam mais no bolso de quem vive na capital federal. No orçamento da família, entretanto, os custos com as duas filhas se destacam do restante das contas. “Elas estudam em escola particular, com mensalidades custa mais do que um curso superior, fazem aulas de inglês, de música e atividades extraclasse na academia onde malho. A gente paga muito caro por tudo isso”, revela.
De acordo com o economista e professor da Universidade de Brasília Carlos Alberto Ramos, o fato de os brasilienses possuírem a maior renda percapita do país acaba se refletindo no custo de vida da população como um todo. “É possível perceber que o preço dos serviços têm uma relação direta com o poder aquisitivo das pessoas que moram Brasília. Um corte de cabelo, por exemplo, é muito mais caro aqui do que no interior de Minas Gerais. O nível de consumo no Distrito Federal tem aumentado bastante.”
Ramos avalia que nos últimos anos os moradores da cidade foram beneficiados com crescimento do número de empregos, reajuste nos salários, aumento na renda das famílias e, naturalmente, um crescimento do setor de serviços. “Além do fortalecimento da economia, o enfraquecimento do dólar frente ao real reduz o poder de compra”, explica.
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Reflexo
A dona de casa Marisa Pereira de Araújo, 37 anos, mora na Estrutural, mas sente o custo de viver próximo à capital federal. Apesar de não pagar aluguel, as despesas da casa, como água e luz, pesam no orçamento da família. Apesar disso, o gasto mais alto de Marisa é com os cinco filhos, todos em idade escolar. “A alimentação está muito cara e os meninos precisam de arroz, feijão e muitas frutas. Isso não pode faltar. Não saem de casa sem estarem bem alimentados. Só que eu também preciso vestir e calçá-los”, enumera.
Cesta básica tem queda em junho
A cesta básica ficou mais barata no Distrito Federal em junho. Segundo medição do Departamento Intersindical de Estatística e Estudos Socioeconômicos (Dieese), que monitora os preços de 13 itens considerados essenciais no consumo das famílias — alimentos e produtos de higiene —, o valor médio necessário para adquiri-los caiu 1,14% no mês passado frente a maio, atingindo R$ 246,10. Os principais responsáveis pelo recuo foram a batata, que registrou queda de 19,16%, e a carne, que recuou 2,12%. Juntos, os dois itens contribuíram para reduzir em R$ 4,92 o preço final. Para Clóvis Scherer, superintendente regional do Dieese, os números refletem estabilidade. “A cesta básica vem se mostrando estável desde janeiro. É uma tendência positiva, haja vista que tivemos forte alta no ano passado, principalmente no segundo semestre”, analisa.