Mais de 100 estudos de desenvolvimento de vacinas contra o novo coronavírus estão em andamento no mundo, de acordo com a Organização Mundial da Saúde (OMS). Destes trabalhos, oito entraram em ensaios clínicos, que envolvem seres humanos. No Brasil, a pesquisa mais avançada vem sendo feita pela Fundação Oswaldo Cruz (Fiocruz), em parceria com o Instituto Butantã e a Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG).
“É importante testar várias estratégias porque ainda não sabemos quais vão funcionar e não podemos apostar as fichas em uma só”, diz o imunologista Ricardo Gazzinelli, coordenador do trabalho, que tenta fazer uma vacina contra o Sars-CoV-2 usando como vetor um influenza atenuado.
Segundo Cazzinelli, o estudo brasileiro está em fase adiantada. “A vantagem é que esse é o vírus hoje usado nas vacinas contra o H1N1. Já foi testado em milhões de pessoas. Então temos confiança de que é seguro. E temos fábricas no Brasil que já produzem a vacina contra a influenza em grande quantidade. Poderiam fazer isso para o coronavírus se essa estratégia der certo”.
Essa é uma preocupação em todo o mundo. Mesmo antes de ter uma vacina pronta, empresas e governos já se antecipam para ter formas de produzir bilhões de doses para atender a população.
A Moderna, por exemplo, já fez uma parceria com a Johnson & Johnson, e a farmacêutica AstraZeneca está trabalhando com os pesquisadores de Oxford.
Corrida – A produção em larga escala leva em conta que são cerca de 4 milhões de casos confirmados de infecção pelo novo coronavírus no planeta e mais de 280 mil mortos. Em geral, vacinas levam em média dez anos para serem produzidas – a mais rápida foi a da caxumba, que demandou quatro anos, na década de 1960). Mas, com as novas tecnologias, acelerou o processo, e a expectativa é que se tenha um produto no ano que vem.
Na semana passada, o otimismo cresceu com o anúncio de resultados de uma vacina em desenvolvimento na Universidade de Oxford. Ela é uma das que está em teste clínico e se estimou que pode estar pronta até o fim deste ano.
Os cientistas do Instituto Jenner, em Oxford, estão alguns passos à frente na corrida por usarem como ponto de partida uma pesquisa anterior de vacina para outro coronavírus, o causador da Mers, doença respiratória da mesma família da covid-19 que atingiu especialmente o Oriente Médio a partir de 2012.
Logo que o Sars-CoV-2 surgiu na China, no fim do ano passado, os pesquisadores de Oxford aproveitaram a plataforma que eles tinham criado para a Mers para testá-la em macacos rhesus e os resultados foram muito promissores. Com uma dose da vacina, conseguiram imunizar 18 animais. O resultado foi publicado no dia 1º na Science Advances.
Para fazer esta vacina, usou-se como vetor um adenovírus (que causa resfriado comum) inativo, no qual se introduziu uma proteína do Mers-CoV, capaz de fazer o corpo produzir anticorpos contra o vírus. Agora, cientistas usaram a mesma plataforma, mas com uma proteína do Sars-CoV-2.
Como eles já haviam provado anteriormente que ela era segura para humanos (a primeira etapa dos ensaios clínicos, foi possível saltar para a segunda etapa, de eficácia. Eles juntaram as duas fases em uma só e, agora, preveem começar testes em 6 mil pessoas até o fim do mês. É como se o vírus “imitasse” o outro para induzir o sistema imune a reagir ao vírus verdadeiro quando há contaminação.
Mensageiro – Vacinas clássicas usam uma versão atenuada do vírus que se quer combater para desencadear a resposta imunológica. Mas, na corrida para combater a covid-19, novas tecnologias estão em teste na expectativa de serem mais seguras e eficazes contra a pandemia.
Uma das estratégias é usar o RNA mensageiro (RNAm) do vírus, a molécula que “lê” as informações genéticas e comanda a produção de proteínas. Aqui vale a mesma premissa anterior – de que possa induzir o sistema imunológico a agir quando o próprio vírus resolver atacar. Duas das oito vacinas em fase clínica – da Moderna e da Pfizer – usam esse modelo.
Covid-19 veio para ficar – Como não é necessário manipular diretamente o vírus – o que demanda o uso de laboratórios de alta segurança -, o trabalho fica mais rápido e fácil. O porém é que ainda não existe nenhuma vacina já em uso no mundo com essa formulação.
Algumas estratégias que já estão na etapa clínica, porém, ainda se baseiam em versões inativas do vírus (mais seguras que as atenuadas). É o caso da proposta da chinesa Sinovac, que também se mostrou efetiva em rhesus. Foram testadas duas doses. Animais vacinados com a mais alta, que tiveram o Sars-Cov-2 introduzido em seus pulmões, tiveram a melhor resposta e não desenvolveram a doença.
“As primeiras vacinas que ficarão prontas não necessariamente serão as melhores. Serão só as primeiras. Pode ser que elas só consigam conferir 30% de proteção. O que já ajuda a aumentar um pouco de imunidade e diminuir a circulação da doença”, afirma a bióloga Natália Pasternak, do Instituto de Ciências Biomédicas da USP, que pretende entrar na corrida.
“Mas ainda será necessário continuar pesquisando para chegar a melhor vacina possível, porque essa é uma doença que veio para ficar”, diz.
(*) Com informações do jornal O Estado de S. Paulo em matéria da repórter Giovana Girardi