Silvério Silveira* era garçom de uma empresa terceirizada e atendia ao gabinete da presidência do Banco do Brasil. Mesmo durante a pandemia, continuou trabalhando. Ele contraiu o novo coronavírus. Depois de internado por alguns dias, morreu devido às complicações da covid-19.
De acordo com informantes do Sindicato dos Bancários de Brasília, a ordem do presidente do BB, Rubens Novaes, era para não dar publicidade ao ocorrido. Mas a “rádio corredor” passou a informação para a entidade, que procurou detalhes no Sindicato dos Empregados em Empresas de Asseio, Conservação, Trabalho Temporário, Prestação e Serviços Terceirizáveis (Sindserviço-DF).
Maria Isabel Caetano dos Reis, presidente do Sindserviço, diz que a situação de Silvério Silveira* – nome fictício, a pedido da família –, contratado pela empresa Alimentares, é igual à de centenas de empregados terceirizados do DF. Levantamento da entidade dá conta de que, de março a julho, 400 trabalhadores do setor foram contaminados com a covid-19; oito deles tiveram a morte registrada no sindicato.
“Só na Saúde, 10% dos infectados são da limpeza e vigilância”, denuncia a líder sindical. Ela afirma, ainda, que a maioria das mais de três mil empresas terceirizadas que atuam em Brasília está omitindo os casos de covid-19 e proibindo os funcionários de denunciarem o número de contaminados e mortos.
“Eles proíbem os funcionários contaminados de dizerem que estão com a doença e, assim, ninguém se protege nos locais de trabalho. Não fazem testagem. Não oferecem os instrumentos de proteção, como máscara, álcool em gel e distanciamento. E não permitem a entrada do sindicato nas empresas para reunir os trabalhadores e identificar o problema”, denuncia.
Fragilidade – O Sindicato dos Bancários e o Sindserviços têm recebido denúncias de que altos executivos em distintas áreas do BB, como governo, tecnologia, secretaria executiva, vice-presidências, diretorias e até assessoria especial da presidência do banco testaram positivo para covid-19.
“Isso expõe a situação de fragilidade. Não há informação de que, nesses casos, o banco tenha cumprido o protocolo, que seria colocar em isolamento social e testar todos os colegas que compartilharam o ambiente de trabalho”, observa Kleytton Morais, presidente do Sindicato dos Bancários.
Ele lamenta que o desfecho das omissões no BB tenha chegado a público após a perda de uma vida. “A notícia do óbito do trabalhador terceirizado, garçom que atuava junto à presidência do BB, é profundamente lamentável. Manifestamos a nossa irrestrita solidariedade aos familiares, amigos e colegas”.
O Brasília Capital procurou a Diretoria de Marketing e Comunicação do BB para esclarecimentos, avisou do deadline, mas até o fechamento desta edição, às 17h30, de sexta-feira (24), não havia respondido a nosso e-mail.
Sindicatos atuam em conjunto
Kleytton Morais reiterou que o Sindicato dos Bancários vai atuar em conjunto com o Sindserviços. O objetivo é apurar as denúncias de que, mesmo sabendo que a cúpula está contaminada pela covid-19, o presidente Rubens Novaes não implantou a testagem geral, não decretou isolamento, mantendo esse direito apenas a privilegiados.
O sindicato informa que o banco dificulta a testagem dos trabalhadores que atuam na linha de frente, que se expõem ao risco de contaminação pelo novo coronavírus, mas oferece testagens periódicas a altos executivos da sede administrativa, na 201 Norte, em Brasília.
#VidasImportam – A representante dos trabalhadores na Mesa de Negociação do BB e secretária de Assuntos Jurídicos do Sindicato dos Bancários do DF, Marianna Coelho, informa que a entidade convocou a categoria, trabalhadores terceirizados e clientes a se manifestarem pela hashtag #TodasAsVidasTrabalhadorasImportam.
“O momento é, extremamente, delicado e jamais admitiremos negligências com a vida. Não há efetividade numa política de segurança quando apenas uma parcela dos funcionários é abrangida e testada periodicamente”, destaca.
Kleytton afirma que o Sindicato dos Bancários exige que a testagem da covid-19 seja assegurada a todos os bancários e terceirizados. “Em hipótese alguma pode figurar como privilégio, restrito a um grupo seleto. Se isso de fato estiver ocorrendo, é um escandaloso e completo absurdo”.
O presidente informa, ainda, que o sindicato buscou a empresa e apresentou essas denúncias nos últimos dias e requereu imediata averiguação e explicação do banco em relação à situação, o que não ocorreu até agora.