O senador Aécio Neves (MG) retornou ao Senado dizendo-se vítima de “armação criminosa” feita por empresários sem escrúpulos. Presidente licenciado do PSDB, ele teve o mandato suspenso no início de setembro pelo Supremo Tribunal Federal. Mas o próprio STF deu ao Congresso Nacional o poder de decidir a respeito de situações como a do tucano, investigado como beneficiário de propina de R$ 2 milhões, paga por Joesley Batista, um dos donos do grupo J&F.
“Será no exercício do meu mandato que irei me defender das acusações absurdas, falsas, de que tenho sido alvo. Sou vítima de uma armação ardilosa, criminosa, perpetrada por empresários inescrupulosos que enriqueceram à custa do dinheiro público e não tiveram qualquer constrangimento em acusar pessoas de bem na busca dos benefícios de uma inaceitável delação, ora suspensa, em razão de parte da verdade estar vindo à tona”, afirmou ele um dia depois de o plenário restituir-lhe o mandato.
Aécio, que aparece negociando a suposta propina com Joesley, em conversa telefônica gravada, alega que o dinheiro seria um empréstimo para pagar advogados que atuam em sua defesa. Na terça (17), houve 44 votos para derrubar as medidas cautelares impostas pelo STF, que mantinham o tucano trancando em casa à noite. Dos 44, 18 são investigados pela Lava Jato ou em desdobramentos de inquéritos da operação da Polícia Federal.
De 20 senadores do PMDB, Aécio teve 18 votos. Dos 11 tucanos que podiam votar, 10 estiveram na sessão e ajudaram a livrar o mineiro. Inclusive o presidente interino do partido, Tasso Jereissati (CE), que deseja a renúncia do correligionário num embate interno. Outros nove partidos ― PP, PR, DEM, PRB, PTC, PROS, PSD, PSC e PTB ― contribuíram com 16 votos.
“Ressaca moral. É lamentável. O Senado abriu um precedente seriíssimo. Não esteve à altura de sua história como instituição da República. O plenário tomou uma deliberação das mais antagônicas ao sentimento da opinião pública”, protestou o Randolfe Rodrigues (Rede-AP). Questionado sobre a mobilização da Casa em torno da salvação do mandato de Aécio, o presidente Eunício Oliveira (PMDB-CE), argumentou que não houve paralisação. Mas ele próprio atuou para que o STF permitisse uma saída para o tucano sem o confronto entre as duas instituições.
“Primeiro, o assunto Aécio nunca dominou o Senado. A Casa tem pauta própria e nos piores momentos da crise econômica, da crise política, nunca produziu tanto quanto produziu nos últimos tempos”, afirmou Eunício. Aécio já livrou-se de um processo no Conselho de Ética, mas ainda terá de enfrentar outro. Há um pedido do PT para abertura de processo de cassação do mandato por quebra de decoro parlamentar, baseado nas gravações feitas por Joesley Batista, em que o senador pede os R$ 2 milhões. Outro pedido, apresentado pela Rede e pelo PSol, foi arquivado pelo Conselho em julho.
O presidente interino do PSDB, Tasso Jereissati, não faz rodeio: “ele não tem condições, dentro das circunstâncias em que está, de ficar como presidente do partido, e nós precisamos ter uma solução definitiva, e não provisória”. “Não trato de questões partidárias pela imprensa”, respondeu Aécio. Depois de reunião de senadores tucanos, Jereissati disse que caberá a Aécio decidir de acordo com a própria consciência.