A imposição unilateral de uma tarifa de 50% sobre todas as exportações brasileiras aos Estados Unidos a partir de 1º de agosto, anunciada por Donald Trump nessa quarta (9), gerou insatisfação de setores econômicos, lideranças políticas e do mercado brasileiro. A medida afeta, por exemplo, a venda de produtos florestais (como madeiras), café, carnes, sucos, frutas e pescados.
Segundo a Confederação Nacional da Indústria (CNI), “não existe qualquer fato econômico que justifique uma medida desse tamanho”. A entidade acrescenta que “os impactos dessas tarifas podem ser graves para o setor, que é interligado ao sistema produtivo americano. “Uma quebra nessa relação traria muitos prejuízos à nossa economia”.
A Frente Parlamentar da Agropecuária (FPA), grupo de deputados e senadores que defende os interesses do agronegócio, diz que a nova alíquota “tem impactos no câmbio, no consequente aumento do custo de insumos importados e na competitividade das exportações brasileiras”. Também defende o que chamou de “resposta firme e estratégica”. “É momento de cautela, diplomacia afiada e presença ativa do Brasil na mesa de negociações”.
Já a Associação Nacional dos Exportadores de Sucos Cítricos (Citrus BR) afirma ter sido pega de surpresa com o anúncio. “Entendemos que essa medida afeta não apenas o Brasil, mas toda a indústria de suco dos EUA que emprega milhares de pessoas e tem o Brasil como principal fornecedor externo há décadas”, alerta o diretor-executivo da Citrus BR, Ibiapaba Netto. O Brasil é o maior produtor e exportador de suco de laranja do mundo, sendo que os Estados Unidos são o destino de cerca de 40% das exportações brasileiras.
Na mesma linha, a Associação Brasileira das Indústrias Exportadoras de Carnes (Abiec), considera que “questões geopolíticas” não podem se transformar em “barreiras ao abastecimento global e à garantia da segurança alimentar”. “Qualquer aumento de tarifa é um entrave ao comércio internacional e impacta negativamente o setor da carne bovina”.
Carta
Em carta endereçada ao presidente Lula, Trump usa um pretexto político para justificar o tarifaço. No documento, cita o ex-presidente Jair Bolsonaro, que é réu no Supremo Tribunal Federal (STF) por tentativa de golpe de Estado. “A forma como o Brasil tem tratado o ex-presidente Bolsonaro é uma vergonha internacional. Esse julgamento não deveria estar ocorrendo. É uma caça às bruxas que deve acabar imediatamente!”, pontua Trump, sem apresentar quaisquer provas.
O presidente norte-americano fala também em “ataques insidiosos do Brasil contra eleições livres e à violação fundamental da liberdade de expressão dos americanos”. Além disso, diz ter determinado a abertura de investigação para o que classificou como “ataques contínuos do Brasil às atividades comerciais digitais de empresas americanas”, em alusão às multas milionárias e suspensão de redes sociais, como o X (antigo Twitter), determinadas pelo STF.
Em outro trecho, Trump mente ao acusar o Brasil de praticar relação comercial injusta com os Estados Unidos. “Concluímos que precisamos nos afastar da longa e muito injusta relação comercial gerada pelas tarifas e barreiras tarifárias e não tarifárias do Brasil. Entenda que os 50% são muito menos do que seria necessário para termos igualdade de condições em nosso comércio com seu país. É necessário ter isso para corrigir as graves injustiças do sistema atual”.
A declaração contraria os números do fluxo comercial entre as nações. Ao considerar a balança comercial (exportações menos importações), os Estados Unidos têm superávit anual de US$ 200 milhões com o Brasil, resultado positivo que se mantém há mais de 15 anos.
Resposta à altura
Em resposta à altura, Lula deixou claro que a tributação de 50% aos produtos brasileiros exportados para os Estados Unidos será respondida com a Lei de Reciprocidade Econômica, que estabelece critérios para a suspensão de concessões comerciais, de investimentos e de obrigações relativas a direitos de propriedade intelectual em resposta a medidas unilaterais adotadas por país ou bloco econômico que impactem negativamente a competitividade internacional brasileira.
“A soberania, o respeito e a defesa intransigente dos interesses do povo brasileiro são os valores que orientam a nossa relação com o mundo”, enfatiza o presidente.
O petista reitera que o Brasil é um país soberano, com instituições independentes, e que “não aceitará ser tutelado por ninguém”. “O processo judicial contra aqueles que planejaram o golpe de Estado é de competência apenas da Justiça Brasileira e, portanto, não está sujeito a nenhum tipo de ingerência ou ameaça que fira a independência das instituições nacionais”.
FAKE NEWS — O presidente brasileiro abordou, ainda, as críticas de Trump às decisões do Supremo contra perfis em redes sociais que praticavam discurso de ódio e divulgavam fake news. “No contexto das plataformas digitais, a sociedade brasileira rejeita conteúdos de ódio, racismo, pornografia infantil, golpes, fraudes, discursos contra os direitos humanos e a liberdade democrática”.
E mandou um recado claro. “No Brasil, liberdade de expressão não se confunde com agressão ou práticas violentas. Para operar em nosso país, todas as empresas nacionais e estrangeiras estão submetidas à legislação brasileira”, crava.