Nesta republiqueta chamada Brasil, vigora o comando de um insólito e amplo reinado de todos os matizes: é o Rei Fulano, o Rei Cicrano e o Rei Não-Sei-de-Quê. Nessa seara de Reis inventados e frutos de vãs vaidades, há até um Rei racista, que não reconheceu a própria filha (mesmo com a comprovação do DNA), talvez porque não pretendesse aceitar uma princesa negra em seu castelo, embora ele seja também de pele escura.
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Não obstante nunca tenha me sentido vassalo desses reis de mentirinha, e achasse ridículo alguém admitir tal título indevido de realeza, eis que me senti, de repente, um autêntico Rei neste pedacinho de dez dias de férias na Bahia, acompanhado de minha mulher Lêda, meu filho Cláudio, ambos soteropolitanos (nascidos em Salvador); e de minhas netinhas candangas Bárbara, 9, e Maria Luíza, 5.
– Vai pra onde, meu Rei?
E todo esse meu súbito e curto reinado começou com esta gentil pergunta do chofer de táxi, no aeroporto de Salvador. Meia hora depois, ao desembarcar na entrada do condomínio Villas Village, localizado no município litorâneo Lauro de Freitas, fui contemplado pelo porteiro com a segunda deferência:
– Fez boa viagem, meu Rei?
Nos dias subsequentes, onde chegasse, nas barracas de praia ou nos restaurantes, em qualquer horário, era recebido com a mesma cerimônia:
– Bom dia, meu Rei!
– Boa noite, meu Rei!
Mesmo depois de me empanturrar com minhas guloseimas locais preferidas: acarajés; lambretas (*); moquecas de camarão ou peixe; caruru e vatapá –, confesso que estava morrendo de saudades de Brasília, como sempre acontece toda vez que viajo.
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E nem bem pisei o chão do aeroporto JK, me despi de minha indumentária de realeza e abdiquei da eventual coroa. Foi aí que me veio à cabeça a letra do conhecido samba de Herivelto Martins:
“Que rei sou eu / Sem castelo e sem rainha / Afinal, que rei sou eu? / O meu reinado é pequeno e é restrito / Só mando no meu distrito / Porque o rei de lá morreu…”
Não, nem mesmo no meu distrito, que é aqui na 113 Sul, não mando coisa nenhuma. Até muito ao contrário: sou súdito voluntário de meus inúmeros amigos da quadra comercial. E que bom que voltei pro meu aconchego.
(*) Lambreta é um tipo de marisco que só existe no mar da Bahia. E só Deus pode explicar a preferência desse saboroso molusco.