Ainda sem vacinas contra a covid-19 suficientes para toda a população e com 91% dos leitos de UTI ocupados, o Distrito Federal voltou atrás da decisão de retomar as aulas presenciais na rede pública no dia 8 de março. Agora sem previsão para o retorno dos alunos às escolas, uma nova data deve ser avaliada nas próximas duas semanas. Decisão correta, levando-se em conta o cenário de infecções e mortes pela doença tanto no DF quanto no restante do Brasil.
Nas escolas particulares, o retorno presencial já ocorreu e são recorrentes as denúncias de negligência quanto aos protocolos de segurança para conter a doença. Lembrando que o número de mortes por covid-19 se aproxima de 5 mil, e apenas na quinta-feira (25) foram registrados 14 óbitos. Os infectados somam 293.782, segundo dados da Secretaria de Saúde (SES-DF). E é exatamente esse um dos pontos mais preocupantes com o retorno dos alunos às salas de aula dos colégios públicos: uma nova explosão de casos, piorando ainda mais a situação.
O Distrito Federal tem aproximadamente 700 escolas públicas. Ao todo, são quase meio milhão de alunos e mais de 70 mil professores. Alunos e professores com famílias, vale lembrar. Filhos, irmãos, pais e avós. E como o ciclo de disseminação da covid-19 é amplamente conhecido, o que mais preocupa é o cumprimento, controle e fiscalização das medidas sanitárias. Segundo o observatório da Fiocruz, este é o pior momento da pandemia no Brasil, com média móvel de mais de mil mortes por dia.
É claro que a retomada das aulas presenciais na rede pública, mais cedo ou mais tarde, não ocorrerá só pela necessidade de que os alunos – boa parte deles sem acesso sequer à internet – saiam, ainda que minimamente, do limbo da desigualdade educacional, se comparados aos da rede privada. Há, por trás da decisão, um apelo dos próprios pais e/ou responsáveis. Eles precisam trabalhar e, em muitos casos, não têm com quem deixar as crianças. É um fato que a “retomada econômica” ignora, por exemplo, as mais de 11 milhões de mães brasileiras chefes de família que precisam trabalhar fora de casa.
A solução mais viável para o problema, e é compreensível, é que os alunos voltem às salas de aula. No entanto, como disse lá atrás, o DF errou no planejamento do combate à covid-19: fizemos isolamento social quando não era necessário e reabrimos o comércio antes do tempo. Agora, anunciamos um lockdown das 20h às 5h: medida paliativa. Não resolve o problema.
Em muitas escolas da capital do País, em especial as da área rural, o saneamento básico (água potável, coleta e tratamento de esgoto) ainda é artigo de luxo. Para que essa retomada das aulas presenciais seja feita em segurança, de maneira correta, a experiência internacional nos mostra que existem caminhos. Contudo, devem ser levados ao pé da letra, sem meias ações. O modelo híbrido (aulas remotas e presenciais), com protocolos sanitários de amplo conhecimento da comunidade, é um deles.
O ensino remoto é cheio de desafios. E o presencial traz consigo o medo de uma nova explosão de casos de covid-19 no DF. Para os pais, é uma escolha de Sofia. E para o Estado, é o caso de focar na saúde dos cidadãos. Sim. Os alunos precisam de suas escolas, com segurança sanitária, seguindo as recomendações de saúde. E, sim. A população precisa urgente de vacinação em massa.
Como médico, minha recomendação é pela segurança e a preservação da vida. Sempre! Os desdobramentos para lidar com a crise da saúde não são piores do que a morte de milhares de pessoas. As escolas públicas não podem ser quartos de despejo. É preciso planejamento e estratégia para a retomada das aulas presenciais.