Elena Vassina, especial para Gazeta Russa (*)
Lendo a recém-lançada coletânea “A Revolução das Mulheres”, organizada por Graziela Schneider, tomei pela primeira vez consciência sobre a quem eu, nascida e crescida na União Soviética (URSS, extinta em 1991), devo minha emancipação, situação de igualdade e todos os direitos de mulher que, desde a infância, são-me tão naturais quanto o ar que respiro.
Talvez por isso, sempre estranhei ao ver as brasileiras reclamarem do machismo, enquanto em meu país, pelo contrário, são as queixas dos homens que ecoam mais, já que esses sofrem com o poder concentrado nas mãos das mulheres no dia a dia – na vida familiar, econômica e social.
As autoras da coletânea, escolhidas a dedo e, em sua maioria, inéditas no Brasil são as russas que, ainda no início de século 20, tomaram a frente como líderes e ideólogas dos movimentos feministas que levaram a muitas conquistas sociais e, antes de mais nada, ao direito de voto – que lhes foi concedido logo após a revolução de Outubro, em 1917, bem antes de isso acontecer na França, Alemanha, Grã-Bretanha, Estados Unidos ou Brasil.
Aleksandra Kollontai, a “comunista emancipada sexualmente”, como ela própria se define, talvez seja a mais conhecida dessas figuras fora da Rússia.
Primeira mulher embaixadora da URSS, Kollontai não temia ser radical na luta pela igualdade dos direitos das mulheres. Isso chegou a tal ponto que muitas ideias de liberação feminina que ela defendera no início do século 20 ressoariam na revolução sexual das décadas de 1960 e 1970.
Certamente, para o leitor brasileiro seria interessante conhecer os escritos sobre a questão feminina de duas mulheres mais próximas de Lênin (Vladimir Ilyich Ulyanov – 1870-1924) – sua esposa Nadejda Krupskaia e sua amante, Inessa Armand – e verificar como a visão marxista da luta de classes, essencial para a ideologia leninista, refletiu-se nos ensaios de ambas.
Enfim, o livro dá a possibilidade de se conhecerem muitas abordagens das questões feministas. Alguns pontos de vista podem parecer óbvios, outros, polêmicos, mas todos os textos permitem, finalmente, que se consulte diretamente as fonte e são importantíssimos para os estudos da história do movimento feminista na Rússia.
O livro não apenas é composto exclusivamente por textos de mulheres, mas também é organizado, traduzido (diretamente do russo) e preparado apenas por mulheres – mais um ato simbólico de união internacional pela causa feminina.
(*) Elena Vassina é russa e vive em São Paulo, onde é professora de Literatura e Cultura Russa na USP.
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